THIAGO RESENDE E MATEUS VARGAS
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Alvo de cobiça do centrão, o Ministério do Desenvolvimento Social reagiu à pressão e começou a liberar dinheiro para obras e projetos em redutos eleitorais de membros influentes do Congresso e aliados do governo.
A pasta herdou R$ 1,5 bilhão das extintas emendas de relator, que eram a principal moeda de troca em negociações no governo Jair Bolsonaro (PL). Sob gestão Lula (PT), esse dinheiro também tem sido usado no câmbio político entre o Palácio do Planalto e o Congresso.
Desde o início do mês, o ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias (PT-PI), autorizou repasses de R$ 110 milhões desse tipo de verba que pode ser usada para financiar ações e obras como centros de assistência social.
Ao todo, sete ministérios receberam cota da herança de quase R$ 10 bilhões após o fim das emendas de relator. O Ministério do Desenvolvimento Social, responsável pelo Bolsa Família, foi o penúltimo a destravar esses recursos –até agora só o Ministério do Esporte não liberou.
Essas duas pastas estão na mira do centrão nas conversas para a reforma ministerial que irá abrir espaço no primeiro escalão de Lula para o PP e para o Republicanos.
Parlamentares também pressionam por mais verbas das Cidades e da Educação.
O ministério comandado por Jader Filho (MDB-PA) liberou apenas R$ 50 milhões dos R$ 2,4 bilhões que migraram ao orçamento do governo com o fim das emendas de relator. O recurso ainda foi direcionado para obra no Pará, estado comandado pela família do ministro, anunciada em evento com Lula.
Já a distribuição da verba da Educação passa pelo FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), órgão alvo de críticas do Congresso.
Wellington Dias tenta se segurar no cargo apesar de o desempenho dele ser criticado no Palácio do Planalto. O presidente tem dito a aliados que esperava que a pasta do Bolsa Família, cujo orçamento é maior do que o da Saúde e da Educação, fosse celeiro de pautas positivas para o governo –o que não tem ocorrido.
Procurado, o Ministério do Desenvolvimento Social disse que a distribuição da verba seguiu critérios técnicos, que abriu um sistema para que as prefeituras apresentassem projetos a serem financiados com o dinheiro e que esse processo de recebimento das propostas se encerrou em 5 de julho.
“Foi recepcionado pelo MDS [Ministério do Desenvolvimento Social] volume de aproximadamente R$ 10 bilhões em solicitações, que levará todo o segundo semestre de 2023 para ser avaliado e permitir a liberação dos recursos de acordo com a disponibilidade orçamentária e financeira”, escreveu a pasta em nota.
Articuladores de Lula comemoram que Wellington Dias tenha dado início ao processo de repasse do dinheiro herdado das emendas de relator, pois a verba é requisitada pelo centrão. Mas a ala política do governo ainda reclama do fluxo lento do ministério, que ainda tem R$ 1,4 bilhão para distribuir.
O ministério enviou o recurso a 268 municípios. Em média, cada um ficou com pouco mais de R$ 400 mil. Mas alguns foram privilegiados. Prefeituras da Paraíba receberam R$ 27,7 milhões. Na sequência, Alagoas foi o destino de R$ 16,6 milhões.
Patos, na Paraíba, foi a segunda cidade que mais se beneficiou dos repasses de Wellington Dias até o momento. O município, que recebeu R$ 2,3 milhões, tem pouco mais de 100 mil habitantes e é comandado por Nabor Wanderley (Republicanos). O prefeito é pai de Hugo Motta, líder do Republicanos na Câmara.
O Republicanos, apesar de adotar postura independente ao governo Lula, tem integrantes que desde a eleição do petista negociam verbas em troca de apoio ao presidente no Congresso. Motta tem contato frequente com o ministro Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais), responsável pela articulação política.
A bancada do partido na Câmara indicou o deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE) para ocupar um ministério na reforma que Lula costura com o centrão. O nome dele já foi avalizado pelo presidente, mas ainda não se sabe qual cargo irá ocupar. A sigla mira o Ministério dos Esportes, atualmente comandado por Ana Moser.
Alagoas também tem cidades no topo do ranking da verba da pasta chefiada por Wellington Dias. O estado é reduto eleitoral do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que controlava as antigas emendas de relator e continua exercendo poder sobre a destinação das novas emendas de Lula.
O PP de Lira é uma das legendas que negociam a entrada no governo. A sigla quer assumir o comando do Desenvolvimento Social para tornar a pasta um canalizador das emendas parlamentares.
Arapiraca recebeu R$ 2,3 milhões no lote liberado neste mês. O prefeito é Luciano Barbosa (MDB). O filho dele, Daniel Barbosa, foi eleito deputado federal pelo PP no ano passado.
A cidade já tinha destaque como grande receptor de emendas por ser reduto eleitoral de Lira e do grupo político dele, entre eles o senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL), que nasceu no município.
O presidente da Câmara enviou dinheiro de emendas para Arapiraca para bancar projetos e obras na área de saúde, mobilidade e habitação.
São Sebastião, município alagoano que foi beneficiado com R$ 725 mil dos recursos para assistência social, fica perto da região onde Lira tem fazendas.
Lira tem reclamado publicamente sobre critérios do governo para distribuição do recurso herdado das emendas de relator.
“Não acho justo que você ache justo que é melhor que um ministro que não teve um voto, não fez concurso público para ser ministro, mande R$ 150 milhões para sete municípios da cidade [estado] dele usando o mesmo orçamento que vocês chamavam de secreto ontem”, disse Lira no começo de agosto.
Na declaração, o presidente da Câmara fez referência ao ministro Carlos Fávaro (Agricultura e Pecuária), que direcionou recursos para Mato Grosso, seu estado.
Na liberação dos recursos do Desenvolvimento Social, Wellington Dias também atendeu a municípios do seu estado, o Piauí. Para Piriri, foi autorizado R$ 1 milhão. Esperantina ficou com R$ 633 mil.
Procurados, os parlamentares, incluindo Lira, não responderam se apadrinharam os repasses para a área de assistência social.
A principal beneficiada pelos recursos do Ministério do Desenvolvimento Social foi a Prefeitura de Manaus, que recebeu R$ 12,3 milhões. O estado tem os senadores Omar Aziz (PSD) e Eduardo Braga (MDB) entre seus principais representantes políticos.
Sobre os repasses aos municípios, a pasta afirmou que houve um corte significativo nos recursos para financiar os centros de assistência social e os Serviços de Acolhimento de Crianças, Idosos e Mulheres, durante os governos anteriores.
Em relação a recursos para investimentos, declarou que a construção de um Centro de Referência de Assistência Social para atender a 750 mil famílias custa por volta de R$ 560 mil. Para equipar esse tipo de centro, é necessário um aporte mínimo de R$ 120 mil, sem considerar a necessidade de veículos.