SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após rumores de que poderia renunciar, o primeiro-ministro do Japão, Shigeru Ishiba, reafirmou nesta quarta-feira (23) que pretende permanecer no cargo após a coalizão governista perder a maioria na Câmara Alta do Parlamento, equivalente ao Senado no Brasil, nas eleições do último domingo (20).

A declaração ocorreu após reportagens da imprensa local afirmarem que o premiê pretendia abrir mão do poder depois do anúncio, feito na terça (22), de um acordo comercial entre os Estados Unidos e o Japão. A negociação reduziu as tarifas de Donald Trump sobre Tóquio de 24% para 15% —feito importante para um país que já vem sofrendo com a inflação.

De acordo com o jornal Mainichi, Ishiba, 68, planeja deixar o cargo até o final de agosto; já o diário Yomiuri indicou que ele anunciaria sua renúncia em julho, mas não especificou por quanto tempo permaneceria no cargo. Ambos os veículos atribuem a informação a pessoas próximas do político e relatam que ele sofre pressão até mesmo de correligionários do PLD (Partido Liberal Democrático).

Questionado sobre o assunto, o premiê disse a jornalistas na sede do partido que nunca fez declarações como as reportadas. “Os fatos relatados na mídia são completamente infundados”, afirmou.

Ao descartar a renúncia ainda no domingo, após a votação, Ishiba afirmou que estava “envolvido em negociações extremamente cruciais” com os EUA. “Não podemos jamais destruir essas negociações”, disse. O prazo final para a assinatura do acordo comercial era 1º de agosto.

Uma queda menos de um ano após assumir o cargo desencadearia uma batalha pela sucessão dentro do PLD. No poder do Japão quase ininterruptamente desde 1955, a legenda enfrenta desafios de novos partidos políticos, especialmente de direita, que estão minando seu apoio.

Entre eles está o ultradireitista Sanseito, que se tornou a quarta maior bancada da Câmara Alta entre os partidos da oposição. A agremiação atraiu eleitores com promessas de reduzir impostos, fornecer alívio financeiro às famílias impactadas pela alta dos preços e conter o que chamam de “invasão silenciosa” de imigrantes.

Lançado a partir de um canal no YouTube que disseminava teorias da conspiração sobre vacinas e reproduzia revisionismo histórico em relação à Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o partido invadiu a política tradicional com sua campanha “Japoneses Primeiro”.

O grupo conquistou 14 cadeiras, que vão se somar ao único parlamentar do partido que havia sido eleito para a câmara de 248 assentos há três anos —Sohei Kamiya, secretário-geral da sigla. O partido tem apenas três cadeiras na Câmara Baixa, na qual a coalizão governista também perdeu maioria em outubro.

A mensagem de Kamiya cativou os eleitores frustrados com a economia japonesa. Com uma moeda mais fraca, o país atraiu turistas em números recordes nos últimos anos, o que aumentou ainda mais os preços, afirmam analistas políticos.

Em rápido envelhecimento, a sociedade japonesa também viu residentes estrangeiros atingirem um recorde de cerca de 3,8 milhões no ano passado, embora isso represente apenas 3% da população total, uma fração semelhante à observada nos EUA e na Europa.

Ex-gerente de supermercado e professor de inglês, Kamiya disse à agência de notícias Reuters antes da eleição que se inspirou no “estilo político ousado” de Trump. Após a votação, ele afirmou que planeja seguir o exemplo dos partidos populistas emergentes da Europa, construindo alianças com outros partidos menores em vez de trabalhar com o governo.

Antes da campanha, Kamiya tentou suavizar algumas ideias controversas do partido, mas, mesmo assim, enfrentou críticas por rotular as políticas de igualdade de gênero como um erro que incentiva as mulheres a trabalhar e as impede de ter filhos.

De qualquer forma, o Sanseito já conseguiu pautar a migração na política japonesa. Poucos dias antes do pleito, o governo anunciou uma nova força-tarefa para combater “crimes e conduta desordeira” de estrangeiros, e o PLD prometeu uma meta de “zero estrangeiros ilegais”.