BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Um julgamento previsto para agosto no STF (Supremo Tribunal Federal) deve definir se os descontos concedidos a empreiteiras que assinaram acordos de leniência no âmbito da Operação Lava Jato também vão valer para outras empresas sob investigação.

Uma das companhias apontadas como possíveis beneficiárias é a J&F, dos irmãos Wesley e Joesley Batista. A empresa fechou com o Ministério Público Federal um acordo que previa um pagamento de uma multa no valor de R$ 10 bilhões.

Somente empresas que firmaram leniência com a AGU (Advocacia-Geral da União) e com a CGU (Controladoria-Geral da União), órgãos do governo federal, conseguiram acesso a um desconto no pagamento. Esse não é o caso da J&F, mas o julgamento do STF pode favorecer a companhia.

Originalmente, o processo previsto para agosto poderia validar a renegociação de acordos de leniência da Lava Jato propostos no ano passado pelas empreiteiras UTC, Braskem, OAS, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Nova Participações e Odebrecht.

Segundo dados técnicos do TCU (Tribunal de Contas da União), essa renegociação deu um desconto de R$ 5,7 milhões ao que as empresas originalmente pagariam.

O julgamento, no entanto, também deve tratar de outras questões que foram lançadas nos autos, como a ampliação da validade dos termos a empresas que firmaram acordos de leniência apenas com o Ministério Público.

O relator do processo, ministro André Mendonça, pautou o julgamento para começar no dia 8 de agosto no plenário virtual (plataforma na qual os ministros depositam os seus votos, sem debate). A sessão se encerra no dia 18.

A ideia de Mendonça é resolver a possível validação das renegociações feitas entre a AGU, a CGU e as empresas, e também analisar o mérito (julgamento definitivo) da ação. Após essa definição, há a possibilidade de que a decisão alcance outros casos.

Um acordo de leniência é uma espécie de delação premiada de uma empresa, na qual ela aponta irregularidades que foram cometidas e aceita pagar uma multa em troca de benefícios na Justiça.

A ação que trata de leniências no Supremo é uma ADPF (ação por descumprimento de preceito fundamental, processo que tem o objetivo de proteger a Constituição) apresentada em 2023 pelos partidos PSOL, PC do B e Solidariedade.

Nela, os partidos pediam que houvesse a suspensão do pagamento de multas “em todos os acordos de leniência celebrados entre o Estado e empresas investigadas durante a Operação Lava Jato” até agosto de 2020.

Na ocasião, foi firmada uma cooperação técnica entre setores de combate à corrupção do governo e o Ministério Público, definindo diretrizes para essas tratativas.

Ainda de acordo com os partidos, as punições aplicadas nos acordos de leniências foram prejudiciais às empresas. A ação pedia que eles fossem revistos e que houvesse uma interpretação do Supremo que afastasse “de uma vez por todas, a hermenêutica punitivista e inconstitucional do lavajatismo” nos acordos.

Mendonça criou uma mesa de conciliação no início de 2024. Apenas parte das empresas que haviam firmado acordo com a AGU e a CGU acabaram fechando os termos de renegociação.

Empresas como a J&F, que fizeram acordo apenas com o Ministério Público Federal, ficaram de fora dessa repactuação.

Entre outros benefícios, a renegociação substitui a Selic pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) como indexador de saldo devedores de empresas. Ela também muda o cronograma de pagamentos e possibilita a utilização de créditos de prejuízo fiscal para pagar até 50% do saldo devedor.

Com a previsão de julgamento da ação, em agosto, os partidos fizeram uma petição ao STF afirmando que “os critérios e parâmetros fixados pelo TCU, CGU e AGU devem ser aplicados a todas as empresas que firmaram acordos de leniência no âmbito da União (AGU/CGU) e Ministério Público e que se habilitaram no bojo da presente ADPF”.

Eles pedem ainda que os mesmos parâmetros sejam válidos para acordos de leniência feitos no futuro.

Não foram só os partidos que fizeram essa solicitação. Empresas paranaenses que não conseguiram participar da renegociação pediram que “sejam aplicados aos acordos de leniência celebrados pelas demais empresas habilitadas nestes autos, inclusive aqueles firmados somente perante os Ministérios Públicos federal e estadual”.

É essa possibilidade que vai ser analisada e pode beneficiar outras empresas.

Segundo Rafael Valim, do escritório Warde Advogados, que representa os partidos, a ADPF é uma ação ampla que deve produzir efeitos em todos os que foram afetados pelo formato de acordos de leniência durante o período da Lava Jato. Ou seja, ela não deve se restringir às empresas que fizeram a renegociação com a União.

Ele diz não saber que outras empresas seriam beneficiadas caso sua solicitação seja atendida.

A CGU afirmou que a renegociação de acordos na ação “se restringiu às empresas que já possuíam acordos de leniência celebrados com a CGU e a AGU”. “Informamos que a CGU e a AGU não celebraram acordo de leniência com a empresa J&F Investimentos”, diz.

O procurador-geral da República, em manifestação nos autos, disse que a conciliação já estará atendida se o STF validar apenas os casos das empreiteiras que firmaram acordo com a União. Procurada, a J&F não se manifestou.