SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Não é só dentro dos catálogos de streaming que as novelas têm feito barulho. Nos corredores de Brasília, o drama que é o processo de regulação das plataformas de streaming, que já se arrasta por várias temporadas, está ganhando ainda mais capítulos.
A Strima, a associação que reúne Disney+, Netflix, Max, Prime Video e Globoplay, tenta convencer o Ministério da Cultura a apoiar a diminuição do valor a ser pago pelas plataformas na Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional, a Condecine.
É um valor a ser revertido para a produção nacional, com intuito de fortalecer e estabilizar o mercado interno, que passa por uma crise. Ao contrário de salas de cinema e canais de televisão, o streaming, que está no Brasil há quase 15 anos, não paga Condecine.
A entidade que representa os gigantes do streaming se reuniu com o MinC recentemente para apresentar uma lista de propostas que diminuem o ônus sobre as plataformas. A reportagem teve acesso ao documento apresentado. Segundo interlocutores, houve uma acolhida favorável por partes do ministério.
Entre os pontos mais controversos defendidos pela entidade está a autorização de destinação de recursos da Condecine a produções sem propriedade intelectual majoritariamente pertencente a brasileiros.
Em paralelo, de acordo com interlocutores, o projeto de lei 2.331/22, de regulamentação do streaming, será apensado a outro projeto, mais antigo. Com isso, a expectativa é que a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) deixe de ser a relatora. Isso é visto, nos bastidores, como uma manobra costurada para retirá-la dessa posição.
“Eu só espero que a relatoria fique por aqui. Pode ser o André [Figueiredo], para mim não tem nenhum problema, mas a decisão de quem será o relator é do presidente da Câmara [Hugo Motta]”, diz Feghali.
Atualmente há dois projetos tramitando no Congresso sobre o tema. O de Feghali havia ganhado mais tração nas últimas semanas.
No documento enviado pela Strima ao MinC, as plataformas de streaming pedem que a alíquota da Condecine caia para 3%. No texto de Feghali, o valor era 6%, também oficialmente defendido pela pasta. Entidades do setor audiovisual defendem que a alíquota seja de 12%, por meio do movimento VoD12. A Strima pede que o cálculo seja feito com desconto de tributos indiretos.
Parte do valor arrecadado pelo Condecine-VoD poderia ser investido diretamente em produções nacionais, por meio de dedução. No documento, a Strima propõe aumentar de 60% para 70% o investimento direto na dedução.
Pedem ainda o fim da janela cinematográfica, que exigiria que filmes tenham um período em que sejam exibidos exclusivamente em salas de cinema antes de irem para o streaming. Procurada, a Strima não quis se manifestar.
O MinC diz, em nota, que não se opõe à medida de apensar o PL relatado por Feghali ao projeto 8.889, de 2017, que até então teve a relatoria de André Figueiredo (PDT-CE).
Sobre as sugestões feitas pela Strima, o ministério diz que “as contribuições são sempre recebidas e consideradas com seriedade, buscando equilíbrio entre os diversos interesses e uma regulação justa para o setor e para o país”.
Os projetos de lei que tentam regulamentar a taxação do VoD correm no Congresso e não são de autoria do MinC, mas o ministério tem poder de pressão e articulação com entidades e políticos.
Feghali havia apresentado o seu texto substitutivo, que, na semana passada, chegou a ser previsto na pauta da Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados, mas a votação foi obstruída pela oposição.
A última versão do relatório colocava a alíquota de contribuição pelos streaming de até 6% do faturamento bruto. O movimento foi visto por alguns nomes do audiovisual como uma derrota, uma vez que a deputada carioca é considerada sensível a pressões vindas dos representantes do setor audiovisual.
Outros representantes do setor audiovisual veem com bons olhos. O PL de 2017 já teve a urgência aprovada na Câmara para ir ao plenário, o que facilitaria a tramitação. Além disso, a figura de Feghali pode ser entendida como antagônica às big techs, o que dificultaria a articulação com setores do mercado e do Congresso.
Já por parte da oposição, há um entendimento de que pontos incluídos pela deputada no relatório não seriam “palatáveis”. O substitutivo apresentado por ela teria ficado muito diferente do antigo relator, o senador Eduardo Gomes, do PL do Tocantins, vice-presidente do Senado.