PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – Após anos de discussões arrastadas, a atualização do Plano Diretor de Porto Alegre tomou um novo passo após a apresentação do projeto preliminar no dia 8 de julho e o anúncio de uma audiência pública a ser realizada no dia 9 de agosto para debater o tema.

Dentre as alterações propostas no plano, estão a elevação de índices construtivos e altura máxima em determinadas áreas da cidade, a adaptação da cidade às mudanças climáticas e a implementação de metas para zerar a emissão de gases de efeito estufa.

“A permeabilidade do solo geral, partindo do pressuposto da ocupação que estamos trazendo no plano diretor, vai de 32% para 45%”, diz o secretário municipal do Meio Ambiente, Germano Bremm.

Ele reconhece que o debate do projeto, que vem desde 2019, incluiu aprendizados em drenagem e resistência a efeitos climáticos extremos trazidos pelas enchentes de maio de 2024, quando o sistema de proteção a cheias de Porto Alegre falhou e cerca de 30% da cidade foi atingida por alagamentos. “A gente já trazia essa necessidade, mas ainda mais se fortalece, né, por uma questão de sobrevivência.”

Atualmente, um novo sistema de proteção está em fase de elaboração. O projeto deve incluir a zona sul de Porto Alegre, que se urbanizou somente após a construção do atual sistema na década de 1960.

Um dos pontos do novo Plano Diretor que mais geraram polêmica é a ampliação de índices construtivos e alturas de prédios na cidade. Em regiões como o centro histórico, o Quarto Distrito (antiga área industrial) e a vizinhança da avenida Ipiranga, que atravessa a cidade e é dividida pelo arroio Dilúvio, poderão ter prédios de até 130 metros.

O plano atualmente em vigor determina altura máxima de 52 metros, embora a cidade tenha prédios maiores construídos antes da aprovação do projeto, em 1999, na gestão do prefeito Raul Pont (PT). O edifício mais alto de Porto Alegre é o Edifício Santa Cruz, no centro da cidade, construído em 1958 e com 107 metros.

De acordo com o Estatuto da Cidade, legislação federal para temas urbanos, a lei que institui o Plano Diretor de um município deve ser revista ao menos a cada dez anos. A última atualização foi feita em 2010 —ou seja, já são cinco anos de atraso.

Bremm defende prédios maiores e mudanças construtivas como forma de ampliar a proteção ambiental e diminuir o custo de vida na cidade.

“Se tu quer proteger ainda mais as áreas mais verdes, ter mais permeabilidade, não quer espraiar na cidade e ter um custo de moradia que caiba no bolso de todo mundo, você vai ter que revisitar os padrões construtivos e escolher algumas áreas que têm mais infraestrutura, têm mais escola, têm posto de saúde, têm água, esgoto, possível de ser atendida para tu adensar um pouco mais. E é isso que o novo plano prevê.”

Entretanto, opositores à condução do projeto afirmam que a medida não tem viés social. “É uma encomenda do setor imobiliário. Não é uma justificativa de infraestrutura, de uma cidade de qualidade, porque não encontra dados que comprovem. O discurso é incompatível com as ações”, diz a arquiteta Clarice Misoczky de Oliveira, co-presidente da setorial gaúcha do IAB (Instituto de Arquitetos do Brasil).

Segundo ela, não há estudos que comprovem adequadamente que a região central de Porto Alegre tenha a infraestrutura necessária para absorver o aumento de índices construtivos e de altura de prédios. “A justificativa [da prefeitura] é uma narrativa”, diz Clarice.

Em entrevista à Folha logo após a reeleição em 2024, Sebastião Melo (MDB) colocou a aprovação do Plano Diretor como principal meta de seu primeiro ano de mandato. Ele também defendeu o adensamento populacional onde há infraestrutura e uma nova discussão sobre mobilidade. “Foi um erro no Brasil ter expandido as cidades para áreas onde muitas vezes falta água, esgoto, transporte, escolas etc. Quando alguém se muda para esses locais, leva duas horas para chegar ao trabalho.”

As primeiras ações para revisão do Plano Diretor ocorreram em 2019, no governo do então prefeito Nelson Marchezan Júnior (PSDB), com a realização de nove oficinas temáticas nas regiões de planejamento.

As discussões continuaram com menos força em 2020 e 2021, devido a limitações causadas pela pandemia de Covid-19. Em 2020, Marchezan, que teve um mandato impopular e marcado por brigas com a base, ficou fora do segundo turno na eleição que elegeu Melo.

Ao longo do primeiro mandato, o emedebista teve uma base ampla na Câmara mas optou por não enviar o projeto à Câmara de Vereadores em 2024. Segundo ele, a proximidade com o período eleitoral poderia contaminar o debate sobre o teor do projeto. A decisão já havia sido tomada antes das enchentes.

Reeleito, Melo continua com maioria na Câmara, embora com uma oposição que cresceu e hoje representa 12 dos 35 vereadores, com maior articulação para abrir CPIs e trazer maior resistência a projetos.