SÃO PAULO, SP E NETIV HASHAYARA, ISRAEL (FOLHAPRESS) – Israel atacou os arredores do palácio presidencial em Damasco nesta quarta-feira (16), no terceiro dia consecutivo de ataques do Exército de Tel Aviv à Síria, em ofensiva que aumenta a tensão no país, palco de combates entre drusos e beduínos que já mataram mais de 350 pessoas desde o último domingo (13).
“Os golpes dolorosos começaram”, afirmou o ministro de Defesa do Estado judeu, Israel Katz, ao compartilhar o vídeo de uma apresentadora saindo ao vivo do estúdio de um canal sírio no momento em que um bombardeio atinge o prédio atrás dela.
Além da sede da Presidência síria, o Exército israelense atacou o Ministério da Defesa do país, também na capital -em ação que deixou ao menos cinco membros das forças de segurança mortos, segundo a equipe médica-, e tanques e outros veículos militares na região de Sweida, onde os combates sectários começaram. De acordo com Tel Aviv, mais de 160 alvos foram atingidos na Síria desde segunda.
O Exército disse que continuaria “monitorando os desenvolvimentos e as ações que estão sendo tomadas contra civis drusos no sul da Síria” -o Estado judeu justifica os bombardeios com o objetivo declarado de proteger a minoria das forças governamentais.
“Não queremos nos envolver em uma questão interna da Síria, mas temos nossos irmãos drusos lá”, disse à repotagem Sarit Zehavi, ex-tenente coronel das Forças Armadas de Israel e fundadora do think tank Alma. Segundo ela, os ataques configuram um novo front, de duração indeterminada, e uma retaliação do Exército sírio não pode ser descartada.
Um militar israelense afirmou à agência de notícias AFP que parte das tropas de Tel Aviv na Faixa de Gaza serão transferidas para regiões próximas da Síria.
Funcionários do Ministério da Defesa sírio, por sua vez, disseram à agência de notícias Reuters que pelo menos dois ataques de drones atingiram o edifício, e que os servidores estavam se abrigando no porão. Segundo a emissora estatal Elekhbariya, o bombardeio feriu dois civis.
Um vídeo compartilhado nas redes sociais mostra o prédio do Ministério da Defesa sírio sumindo em uma nuvem de fumaça após ser bombardeado em diversos pontos.
Os drusos, cuja religião deriva do islamismo xiita, são uma importante minoria do Oriente Médio -eles estão presentes no Líbano, no sul da Síria e nas Colinas de Golã, território sírio controlado por Israel desde a Guerra dos Seis Dias, em 1967, e de onde centenas de moradores saíram rumo ao país vizinho.
Nesta quarta, aliás, o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, pediu aos drusos na região que não atravessem a fronteira. “Vocês estão arriscando suas vidas; podem ser assassinados, sequestrados e estão prejudicando os esforços do Exército israelense. Portanto, peço a vocês: voltem para suas casas”, afirmou.
O grupo é um dos vários que formam a etnicamente diversa população da Síria, atualmente governada por Ahmed al-Sharaa, ex-membro de um grupo ligado ao Estado Islâmico e à Al Qaeda que assumiu o poder após a queda do ditador Bashar al-Assad, em dezembro. Desde então, ele vem tentando minimizar seu passado jihadista e convencer a comunidade internacional de que vai garantir a boa convivência entre as minorias do país.
A promessa, no entanto, é colocada em xeque por episódios violentos, como o ocorrido em março, quando uma onda de violência na Síria matou 1.600 civis -a maioria alauítas, em uma aparente retaliação por um ataque anterior realizado por partidários de Assad, que fazia parte desse grupo étnico-, e na semana passada, que opôs drusos e beduínos.
A mídia estatal síria e testemunhas disseram que ataques israelenses ao longo desta quarta também atingiram a cidade predominantemente drusa de Sweida, onde um quarto dia de combates derrubou o frágil cessar-fogo anunciado na noite anterior. Em comunicado, o Ministério da Defesa da Síria acusou grupos fora da lei de violar a trégua na região.
Após os ataques desta quarta, o xeque Hikmat al-Hajri, líder da minoria drusa, rejeitou um novo acordo de cessar-fogo anunciado por seu rival, o xeque Yousef Jarbou, e chancelado pelo Ministério do Interior da Síria.
Jarbou, que se autodenomina líder e tem apoio do governo sírio, havia anunciado um acordo amplo em relação a Sweida. Pouco depois, no entanto, Hajri -que é amplamente reconhecido como o líder supremo da etnia, principalmente pela maioria drusa- rejeitou o cessar-fogo e afirmou que os combates devem continuar até que o território seja “totalmente liberado”.
A ofensiva israelense fez a União Europeia pedir “a todos os atores externos” respeito à soberania da Síria. Em comunicado, o bloco também afirmou estar alarmado diante dos confrontos, exigindo a proteção da população civil e o fim “do discurso de ódio e da retórica sectária”.
Questionado sobre o assunto, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, afirmou que os Estados Unidos estão preocupados. “Vamos trabalhar nessa questão neste momento. Acabei de desligar o telefone com as partes envolvidas”, afirmou.
Segundo Rubio, a situação “é uma ameaça direta aos esforços para ajudar a construir uma Síria pacífica e estável”. O secretário afirmou que o governo de Donald Trump mantém conversas com os governos israelense e sírio sobre o conflito.
Já o Ministério de Relações Exteriores da Turquia afirmou que os ataques israelenses visam sabotar os esforços para estabelecer a paz e a segurança na Síria. Segundo a pasta, o país teve uma oportunidade histórica de se integrar ao mundo após a deposição de Assad.
Em paralelo, o Ministério de Relações Exteriores dos Emirados Árabes Unidos condenou os ataques e afirmou rejeitar totalmente qualquer violação da soberania da Síria.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, por sua vez, condenou “a escalada dos bombardeios israelenses”, assim como “os relatos de que as forças israelenses foram realocadas para as Colinas de Golã”, disse seu porta-voz, Stephane Dujarric, em comunicado.
Na segunda (14), o governo sírio já haviam enviado tropas à região de Sweida para conter os combates entre drusos e beduínos, que começaram no domingo após o sequestro de um comerciante de verduras do primeiro grupo, segundo a versão do OSDH (Observatório Sírio de Direitos Humanos), uma ONG sediada no Reino Unido.
As forças sírias, no entanto, acabaram entrando em confronto com as milícias drusas. O observatório, testemunhas e drusos acusam os militares do país de uma intervenção conjunta com beduínos.
Segundo o OSDH, mais de 350 pessoas morreram na província síria de Sweida até agora, incluindo mulheres e crianças.