BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A PGR (Procuradoria-Geral da República) levantou suspeitas, nas alegações finais do principal processo da trama golpista, sobre a viagem que o ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres diz ter feito à Disney dias antes dos ataques de 8 de janeiro de 2023.
De acordo com o texto assinado por Paulo Gonet, há indício de falsidade no documento apresentado pela defesa de que ele teria viajado de férias com sua família em 6 de janeiro de 2023, poucos antes dos ataques golpistas na praça dos Três Poderes.
Depois da afirmação, o advogado de Torres juntou aos autos declaração das emissões de passagens aéreas e de aluguel de carro em Orlando, na Flórida, e afirmou que a suspeita da PGR é “absolutamente injusta e infundada” e um “verdadeiro abuso acusatório”.
Torres foi ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro (PL) e se tornou secretário do Distrito Federal após o fim do mandato do ex-presidente.
As alegações finais da PGR foram protocoladas na segunda-feira (14) no STF (Supremo Tribunal Federal) e afirmam que a defesa de Anderson Torres só tinha juntado no processo um print da passagem, “sem apresentar o comprovante da compra ou o bilhete aéreo de forma autônoma”.
“Ocorre que a Procuradoria-Geral da República identificou a possível falsidade do documento apresentado pela defesa, o que não apenas reforça a gravidade da conduta do réu Anderson Torres à época dos crimes, mas deverá justificar a adoção de providências adicionais em relação ao novo fato aparentemente ilícito”, afirmou a PGR.
A PGR procurou a companhia aérea Gol e questionou a respeito do voo, que respondeu que o localizador informado “não condiz com os dados descritos em nome de Anderson Gustavo Torres” e que não identificou o nome do ex-ministro no voo. Procurada, a Gol disse que não iria se manifestar.
“A escandalosa constatação coloca em xeque a versão do réu de que sua viagem já se encontrava agendada desde muito antes e confirma a sua estratégia deliberada de afastamento e conivência com as ações violentas que se aproximavam”, dizem as alegações que finais, que ainda acrescentam ser “insubsistente a versão de que houve comunicação prévia da viagem ao governador do Distrito Federal” e que a defesa não comprovou a afirmação nos autos.
O advogado de Torres, Eumar Novacki, juntou informações sobre a compra das passagens no dia seguinte, nos autos da ação penal.
Na petição, ele disse que há “uma tentativa inaceitável de construir um enredo incriminador contra um inocente, ignorando provas documentais robustas que atestam, de forma inequívoca, a emissão regular dos bilhetes, o efetivo pagamento por meio do sistema BSP-Iata [de transações financeiras entre agentes de viagens e companhias aéreas] e a vinculação dos dados ao nome do acusado e de seus familiares”.
“O que se vê, portanto, é uma perseguição implacável, que visa não apenas à condenação de Anderson Torres, mas à destruição de sua família, desbordando completamente dos limites da legalidade, da boa-fé, do devido processo legal e lealdade processual”, disse o advogado.
São juntados nos autos um atestado da agência Viagens Pimentur sobre a compra das passagens para Anderson e sua família, os dados do voo e da reserva de aluguel de veículo.
A defesa diz ainda que, de acordo com a agência de turismo, o localizador do voo “pode ter sido reutilizado pelo sistema da companhia aérea após determinado período”. “Essa reciclagem automática é comum no setor aéreo e pode gerar inconsistência na busca atual, sem, contudo, comprometer a autenticidade e validade da emissão original”, diz a defesa.
Apesar dessa petição, a defesa de Anderson Torres ainda poderá apresentar outras eventuais provas em suas alegações finais, que ainda serão entregues ao Supremo.
A peça da PGR foi entregue ao STF momentos antes do fim do prazo, que era às 23h59 da segunda-feira.
A expectativa no Supremo é que o processo sobre a tentativa de golpe de Estado esteja pronto para ir a julgamento no início de setembro.
Além Anderson Torres, são réus sob acusação de integrar o núcleo central da trama golpista: Jair Bolsonaro (ex-presidente), Walter Braga Netto (ex-ministro), Alexandre Ramagem (deputado federal e ex-chefe da Abin), Almir Garnier (ex-comandante da Marinha), Augusto Heleno (ex-ministro do GSI), Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro) e Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa).
Todos os réus do caso respondem por organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado. Somadas, as penas máximas podem passar de 40 anos de prisão.