SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) publicou nesta quarta-feira (16) uma instrução normativa que revoga a possibilidade de representantes legais autorizarem empréstimos consignados em nome de beneficiários.
Como revelou a reportagem, em junho deste ano, 492,1 mil benefícios em nome de menores de idade sofriam descontos decorrentes de operações de crédito.
A mudança, que altera trechos da norma anterior de 2022, foi adotada após decisão do TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região), de junho deste ano, que suspendeu novas contratações feitas por meio de representantes legais sem aval da Justiça. A medida atendeu a um pedido do MPF (Ministério Público Federal), que apontou ilegalidade na flexibilização adotada anteriormente pelo INSS, com risco de perdas patrimoniais aos beneficiários.
Segundo o MPF, o INSS extrapolou suas atribuições ao regulamentar a concessão dos empréstimos, pois o Código Civil prevê a necessidade de autorização judicial para negócios que possam causar prejuízos a pessoas consideradas incapazes.
A flexibilização ampliou o acesso ao crédito por parte de beneficiários do INSS com deficiência e menores de idade, titulares de pensões por morte e do BPC (Benefício de Prestação Continuada).
A normativa 138, de 2022, também havia ampliado o conceito de representante legal. Antes, eles compreendiam apenas o tutor e o curador, mas a autorização passou a ser concedida também para tutores natos (pai e mãe) e guardiões.
Para Rômulo Saraiva, advogado previdenciário, a mudança representa um enfraquecimento significativo dos poderes dos representantes legais. No entanto, ele avalia que as alterações não foram completamente uniformes. “A minha percepção é que as mudanças não foram totalmente coerentes e uniformes. Retiram-se poderes dos representantes legais, mas ainda há algumas brechas”, afirma.
Ele observa, por exemplo, que a nova norma ainda prevê a atuação de procuradores para solicitar bloqueios de empréstimos, mesmo com a definição formal de procurador tendo sido revogada.
Além disso, a mudança não reestabelece a necessidade de autorização judicial prévia para conceder e descontar do benefício.
Publicada nesta terça-feira, a instrução normativa 190 revoga trechos que anteriormente autorizavam expressamente o representante legal a contratar empréstimos consignados em nome do beneficiário e a manter esses contratos mesmo após a perda dos seus poderes. Também foi excluído o dispositivo que deixava a critério das instituições financeiras decidir se aceitariam ou não contratos firmados por representantes.
A nova norma ainda determina que o termo de autorização para acesso a dados do benefício deverá ser assinado exclusivamente pelo titular, eliminando a possibilidade de assinatura por tutores.
Na prática, a norma limita que novas contratações sejam feitas por representantes legais, mas não determina o cancelamento automático de contratos já firmados. Segundo Saraiva, os empréstimos ativos seguirão sendo cobrados, a menos que sejam questionados judicialmente. “Pode haver contestação individual, principalmente em casos de má gestão do benefício, como quando um familiar contrata sucessivos empréstimos em nome de um menor ou de um idoso e usa os recursos de forma indevida”, afirma.
O especialista diz que a decisão do TRF-3, que é provisória e vale apenas para novos contratos, também pode servir de base para ações que peçam a revisão de empréstimos. “Antes da decisão, ficava esquisito o próprio representante legal fazer o empréstimo e depois querer anulá-lo. Agora, com a decisão do TRF-3 fica mais confortável para contestar e pode virar um precedente de revisão, diz Saraiva.
Em casos de endividamento indevido de beneficiários, especialmente menores de idade ou pessoas incapazes, tanto o INSS quanto as instituições financeiras podem ser responsabilizados, de acordo com Saraiva.
O advogado afirma ainda que, embora o INSS alegue, em algumas situações, que sua atuação se limita ao repasse dos valores, há respaldo legal para responsabilizá-lo por ter editado uma instrução normativa que autorizava a contratação de empréstimos por representantes legais.