BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – Uma apresentação para deputados custou o emprego da agora ex-ministra do Trabalho e Previdência Social de Cuba, Marta Elena Feitó, que renunciou após afirmar que “não há mendigos” em Cuba, mas pessoas que se disfarçam de pedintes.

O escândalo com a funcionária do regime cubano começou após, na segunda-feira (14), durante uma reunião parlamentar, ela negar que as pessoas que vasculham latas de lixo procurem comida e questionar os limpadores de vidros de carros por procurarem “um modo de vida fácil”.

“Vimos pessoas que parecem mendigos, mas quando você olha para as mãos e as roupas que essas pessoas estão vestindo, estão disfarçadas de mendigos, elas não são. Em Cuba não há mendigos”, disse ela ao apresentar os programas sociais para enfrentar a pobreza na Assembleia Nacional.

“As pessoas que estão revirando latas de lixo não estão buscando comida, estão buscando matéria-prima [para reciclagem] e não estão pagando [tributos] por isso.”

As declarações rapidamente geraram críticas nas redes sociais e aumentaram a pressão pela renúncia da agora ex-ministra.

Até mesmo o presidente, Miguel Díaz-Canel, comentou o ocorrido, afirmando que a falta de sensibilidade ao lidar com a vulnerabilidade social é inaceitável e que a revolução deve cuidar de todos.

“São muito questionáveis a falta de sensibilidade e a importância da vulnerabilidade. A revolução não pode deixar ninguém para trás, essa é a nossa obrigação, nossa responsabilidade como militantes”, escreveu no X.

A TV do país divulgou uma nota oficial com a renúncia. “Como resultado da análise realizada pela direção do partido e do governo de Cuba, com Marta Elena Feitó Cabrera, sobre sua intervenção na reunião conjunta de duas Comissões Permanentes de Trabalho da Assembleia Nacional do Poder Popular, a companheira reconheceu seus erros e apresentou sua renúncia”, diz o texto.

“Este pedido foi submetido à consideração do Bureau Político e do Conselho de Estado, onde sua renúncia foi aprovada, com base na falta de objetividade e sensibilidade com que abordou questões centrais da atual gestão política e governamental, focada em abordar fenômenos da vida real que nossa sociedade nunca desejou.”

Historicamente, mesmo com pobreza, a mendicância não era um problema visível na ilha, mas a redução dos benefícios sociais tem contribuído para essa nova realidade.

Atualmente, a pensão média dos aposentados é de cerca de 2.000 pesos cubanos por mês, o que equivale a aproximadamente US$ 5 (R$ 27), um valor muito baixo para viver. Em 2024, o PIB (Produto Interno Bruto) de Cuba caiu 1,1%, refletindo uma contração de 11% nos últimos cinco anos.

A vulnerabilidade social tem aumentado com a situação econômica atual no país. Em setembro do ano passado, reportagem da Folha viu cenas preocupantes em Havana.

Moradores relataram que já não é fácil fazer três refeições do dia. Idosos também reclamaram da falta de medicamentos. A inflação torna difícil a compra de produtos. Em “tiendas”, onde se pode comprar itens essenciais com moeda estrangeira, um pacote de café de 500 gramas custava quase US$ 8,90 (R$ 50).

A sobrevivência de parte da população depende da “libreta de abastecimiento”, uma caderneta que é um símbolo de um sistema para a compra de alimentos com preços subsidiados, mas que também apresentava sinais de colapso.

A cesta básica encolheu, em comparação a um período em que tinha carne bovina, frango, óleo, manteiga, leite condensado, papel higiênico, arroz, grãos e até doces, biscoitos, chocolates, cigarros, refrigerantes. Em julho, segundo os relatos, vinham cerca de 250 gramas de chícharo (semelhante ao grão de bico), 250 ml de óleo, um pacote de café e aproximadamente 2,5 kg de arroz.

Na ocasião, o conselheiro e vice-chefe da Embaixada de Cuba no Brasil, Melne Hernández, e o cônsul do país em São Paulo, Benigno Fernández, afirmaram que o país era prejudicado por voltar à lista dos Estados Unidos de patrocinadores do terrorismo. Ambos negaram haver fome em Cuba.