LENOX, EUA (FOLHAPRESS) – O espaço do Festival de Verão de Tanglewood, referência mundial para a música clássica, assemelha-se ao da fazenda onde, em 1969, foi realizado o festival de rock de Woodstock.
O local fica no estado de Massachusetts, em região vizinha às fronteiras com Nova York e Vermont. A distância entre Lenox -a cidade mais próxima do empreendimento- e Boston é semelhante à de Campos do Jordão a São Paulo.
A comparação justifica-se por razões históricas: criado na década de 1970, o Festival de Inverno de Campos do Jordão, decisivo para a formação de músicos do Brasil e da América Latina, seguiu o modelo de Tanglewood.
A conexão foi estabelecida pelo maestro cearense Eleazar de Carvalho, que havia frequentado o festival americano na década de 1940, período em que era orientado por Serge Koussevitzky, o criador do projeto. Os dois eventos ocorrem na mesma época, embora Massachusetts tenha duração de quatro semanas a mais do que São Paulo.
Neste último fim de semana, o Festival de Campos apresentou como atrações, nos locais maiores e mais concorridos, a Orquestra Sinfônica da Universidade de São Paulo, com o violinista Guido Sant’Anna, a Camerata do Festival e a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, a Osesp.
Já em Tanglewood, a Orquestra Sinfônica de Boston, a BSO, sozinha realizou três programas diferentes entre sexta-feira e domingo, sendo dois deles dirigidos pelo maestro titular, o letão Andris Nelsons.
De fato, o papel da Sinfônica de Boston, como orquestra residente do festival americano, é muito mais ativo do que o da Osesp no brasileiro -após os programas deste final de semana, eles farão a estreia de um novo concerto de John Williams e uma performance integral da ópera “Tosca”, de Puccini, além de interagirem com intérpretes como Yo-Yo Ma, Lang Lang e Joshua Bell.
Se tomarmos como parâmetro o acesso do público e o acolhimento aos estudantes bolsistas, a diferença é muito grande: as obras estruturais em Campos do Jordão -tantas vezes prometidas e anunciadas- nunca foram realizadas, e hoje o festival brasileiro divide-se entre a Sala São Paulo, na capital e os eventos na Serra da Mantiqueira.
Ao contrário dos participantes de Tanglewood, que convivem e compartilham experiências em local com ampla estrutura e muita natureza, os alunos bolsistas brasileiros atualmente ficam hospedados no centro de São Paulo, deslocando-se a Campos eventualmente para concertos.
São dois os espaços principais de apresentações no campus de Tanglewood. O mais importante deles é a Koussevistzky Music Shed, uma “cabana” coberta, aberta nas laterais e no fundo, com capacidade para cinco mil assentos, conectada com o enorme gramado para mais dez mil pessoas, onde parte do público se acomoda, muitas vezes levando cadeiras, mesas e comida para piqueniques. O outro espaço, um teatro fechado para 1.200 pessoas, é o Seiji Osawa Hall.
Os dois programas regidos por Nelsons no último final de semana atraíram numeroso público. Na sexta-feira (11) a orquestra apresentou excertos do balé “Romeu e Julieta”, de Prokofiev, com seis atores no palco, em uma fabulosa performance adaptada da peça homônima de Shakespeare.
No sábado celebrou-se o centenário do compositor Maurice Ravel: o jovem pianista coreano Seong-Jin Cho interpretou o “Concerto em Sol” e o “Concerto para Mão Esquerda”, ambos gravados recentemente por ele com a própria BSO. Antes e depois de Ravel, Debussy -o “Prelúdio à Tarde de um Fauno” e “La Mer”.
Nelsons tem 46 anos e é titular de Boston há mais de dez, além de acumular a direção da icônica Orquestra Gewandhaus de Leipzig, na Alemanha. Sua comunicação com os músicos é direta e perfeita. Faz quase tudo com a mão direita -a da batuta- e com o olhar, deixando a mão esquerda entrar em cena para clarificar ou adicionar sentidos quando necessário.
Como em Woodstock, um clima “paz e amor” reina ainda em Tanglewood. E, entre um concerto e outro, alguns dos melhores músicos do presente ajudam a formar os artistas do futuro.