SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Os governos da Índia e da Coreia do Sul determinaram nesta segunda (14) a inspeção dos botões de controle de fornecimento de combustível de aeronaves da fabricante americana Boeing operadas por empresas de ambos os países.

As duas pequenas alavancas estão no centro do escrutínio em torno do acidente com um Boeing 787 da Air India que matou 260 pessoas no mês passado após a decolagem na cidade indiana de Ahmedabad. Houve um único sobrevivente.

O relatório preliminar da autoridade aeronáutica do país, divulgado no sábado (12), mostrou que ambos os seletores foram desligados logo após o avião deixar o chão, cortando imediatamente a potência dos motores.

Segundo o documento, um dos pilotos questionou o outro o motivo do corte, e a resposta foi que ele não havia feito nada. Não fica claro qual dos aviadores que fez a pergunta, se o experiente capitão com 15,6 mil horas de voo ou o copiloto, com 3.400 horas.

Em dezembro de 2018, a FAA (Administração Federal de Aviação, na sigla em inglês) dos EUA emitiu uma recomendação de inspeção nos botões após o relato feito à Boeing por alguns operadores de modelos 737 de que os botões não travavam corretamente para cortar ou liberar o combustível e ligar os motores.

A recomendação não era mandatória, já que não foi apontado um risco iminente. A Air India não havia feito o procedimento, por exemplo. Ele era sugerido a nove famílias de aviões da Boeing, inclusive três da antiga McDonnell-Douglas, rival comprada pela americana.

Entre eles estão diversas versões do popularíssimo 737 e duas do 787. O documento indica os números de séries dos botões fabricados pela também americana Honeywell, e apenas deveriam ser inspecionados aviões que tivessem esses seletores específicos.

No Brasil, a medida pode ou não afetar aviões da Gol, que opera modelos 737 antigos e novos. A reportagem questionou a empresa e a Anac, o órgão regulador brasileiro, se há alguma aeronave que se encaixa nos parâmetros da recomendação da FAA e se já houve alguma inspeção depois de 2018.

A reportagem também procurou a Boeing, mas assim como com a Anac e a Gol, ainda não recebeu resposta. Não há motivo aparente para alarme, dado que a própria FAA reafirmou que os botões podem ser considerados seguros, mas o histórico recente de problemas com aviões da empresa americana parece ter acendido os alarmes em Nova Déli e Seul.

A Boeing passou 20 meses com a sua frota do 737 Max no chão, após dois acidentes devido a erro de projeto. O mesmo modelo perdeu uma tampa de fuselagem em voo no ano passado, explicitando falhas de qualidade de produção.

Outros aviões da empresa, como o próprio 787, que nunca havia caído até junho, registraram problemas. A Boeing trocou duas vezes de liderança e, agora, parece numa rota de normalização, voltando a ver o crescimento de suas vendas.

Segundo a imprensa indiana, a Air India começou a checagem antes mesmo da ordem oficial. O relato diz que foram inspecionados metade dos seus 33 aviões 787, e até aqui não foi constatado nenhum problema. A empresa também opera modelos Boeing 777, que não têm verificação sugerida pela FAA.

Se isso se confirmar, o mistério em torno do acidente só aumenta. O motivo central da queda foi a perda de potência de ambos os motores, que foram religados pelos pilotos, mas não havia tempo hábil: o avião ainda muito próximo do solo já estava em queda.

Os dados das caixas-pretas indicaram o movimento nos seletores, o que leva a três hipóteses básicas: que algum piloto inadvertidamente mexeu nos botões, que são pequenas alavancas bastante duras para serem movidas, que houve o problema apontado na recomendação da FAA e elas se deslocaram sozinhas ou se um dos aviadores fez o movimento de propósito.

O último cenário é assustador, mas há precedentes históricos. Em 2015, por exemplo, um copiloto da alemã Germanwings matou a si e outras 149 pessoas ao se trancar na cabine de comando sozinho e jogar um Airbus A320 contra uma montanha nos Alpes.

A Air India disse que a investigação ainda é preliminar, mas mostrou que os dois pilotos haviam passado pelo bafômetro antes de entrar na aeronave, como é praxe, e que não há nada suspeito em seu histórico de trabalho.