BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), órgão federal que já foi comandado pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, ameaça colocar a gestão paulista no Serasa e no Cadastro de Inadimplentes do governo federal (Cadin), por fazer uso irregular de dinheiro da União e não terminar uma obra de infraestrutura no estado.
O imbróglio envolve um contrato de R$ 43,1 milhões firmado em 2013, época em que o Dnit era comandado por Tarcísio de Freitas, escolhido pela então presidente Dilma Rousseff (PT). O objetivo era construir um atracadouro de embarcações numa das eclusas da hidrovia Tietê-Paraná, um caminho fluvial que abrange 2.400 km de extensão, atravessando cinco Estados.
Na ocasião, o governador paulista era Geraldo Alckmin, hoje vice-presidente da República.
A hidrovia é formada por 1.600 km no rio Paraná, administrados pelo Dnit, e outros 800 km no estado de São Paulo, administrados pelo Departamento Hidroviário do Estado de São Paulo.
O acordo entre o Dnit e o governo paulista previa que a obra seria bancada com recursos federais, mas administrada pelo estado de São Paulo. O órgão federal chegou a fazer um repasse de R$ 11,503 milhões para a construção, enquanto a gestão paulista contratou o consórcio Ster & ETC, em 2015.
A previsão de entrega do projeto era de 12 meses, mas a obra sofreu sucessivos atrasos, até que, em março de 2017, o contrato foi rescindido unilateralmente pelo estado, sob a justificativa de abandono injustificado pela empresa. Desde então, o governo paulista fez diversas prorrogações de prazo junto ao Dnit, alegando que retomaria a obra com ajustes no projeto.
O governo paulista chegou a contratar o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) para revisar o projeto executivo e propor um novo acordo, aproveitando o que chegou a ser feito pela empreiteira. O pedido, no entanto, foi negado pelo Dnit, que passou a exigir a devolução integral dos recursos. O valor atual é calculado em R$ 13,3 milhões.
O embate permanece em aberto. De um lado, o Dnit sustenta que os recursos foram mal aplicados e que o estado deve devolver o dinheiro, sob risco de ser incluído em serviços de proteção crédito.
GOVERNO PAULISTA DIZ QUE RECURSOS FORAM USADOS DE FORMA REGULAR
De outro, o governo de São Paulo afirma que os recursos foram usados de forma regular e que a obra será concluída com base no que já foi feito, o que tornaria a devolução indevida.
No mês passado, o governo paulista contestou a cobrança e a ameaça de responsabilização pelo Dnit. Segundo a gestão Tarcísio, parte da estrutura da obra chegou a ser executada, incluindo vigas pré-moldadas e peças metálicas, o que será aproveitado na retomada da obra, que voltou à fase de licitação. Um financiamento para concluir o projeto foi reativado, em contrato com o BNDES.
O governo paulista também aponta supostas falhas de procedimento do Dnit, como falta de prazo para apresentação de defesa e a rejeição de prorrogação do contrato sem justificativa técnica clara.
Ao responder ao Dnit sobre a ameaça do órgão federal, a Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística de São Paulo afirmou que o órgão federal “falta com seu dever” e que “haverá continuidade das obras com integral aproveitamento” do que já foi executado.
O governo paulista diz ao Dnit que é alvo de “atos arbitrários” e pede a desistência da cobrança. “Devem as autoridades do Dnit, portanto, repensarem sobre o desfazimento do ajuste de forma arbitrária, como realizado, evitando causar enormes prejuízos à coletividade.”
A gestão de Tarcísio chega a culpar o Dnit pelo atraso, ao afirmar que, se o órgão tivesse “reconhecido as consequências dos atos arbitrários de seus agentes”, que deixaram de acatar um pedido de prorrogação do contrato no passado, “certamente já estaríamos diante de uma obra totalmente concluída, sem o debate que estamos enfrentando”.
Procurado pela reportagem, o Dnit não se manifestou sobre o assunto. O governo de São Paulo declarou, em nota, que “o termo de compromisso e o contrato rescindido são anteriores à atual gestão, e o governo de SP tem empreendido esforços para solucionar a questão, visando a eficiência, a legalidade, o benefício público e o desenvolvimento sustentável da hidrovia”.
A gestão paulista disse que a licitação para a retomada das obras se encontra em fase avançada de instrução processual. “Na nota técnica enviada ao Dnit, o governo de São Paulo demonstra que grande parte da obra foi executada e será aproveitada, e que, portanto, a devolução não seria cabível. No momento, o Estado aguarda retorno do Dnit sobre a manifestação.”