SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Exército de Israel usou uma bomba de 230 kg para atacar um café frequentado por civis, afirmou nesta quarta-feira (2) o jornal britânico The Guardian com base em fotos dos fragmentos da munição e nos danos deixados no local.
De acordo com especialistas em armamento que viram as imagens feitas pelo veículo e o tamanho da cratera deixada pelo ataque, Tel Aviv usou a bomba MK-82 de 230 kg, um explosivo poderoso de fabricação dos Estados Unidos que pode causar destruição em um raio de 1 km² a partir do alvo, sem discriminação.
Um porta-voz do Exército de Israel afirmou que o caso está sendo apurado, mas que, “antes do ataque, medidas foram tomadas para mitigar o risco de ferir civis usando vigilância aérea”. Para especialistas em direito internacional, porém, a probabilidade de o ataque constituir um crime de guerra é alta.
Segundo testemunhas ouvidas pela imprensa internacional e por agências de notícias, o estabelecimento, chamado Al-Baqa e fundado há 40 anos, era frequentado por famílias e, no momento do ataque, recebia diversos clientes, incluindo crianças, idosos e mulheres, que foram em parte mortos pela explosão.
Médicos e outras autoridades do território, que é controlado pelo Hamas, disseram que entre 24 e 36 palestinos morreram, incluindo uma criança de quatro anos, e dezenas ficaram feridos. Na lista dos mortos estão ainda o fotojornalista palestino Ismail Abu Hatab e a artista Frans al-Salmi, que haviam feito uma exposição internacional recentemente o local costumava ser frequentado por profissionais de comunicação porque tinha internet, um recurso de difícil acesso em Gaza atualmente.
“O Exército israelense não disse exatamente quem era o alvo, mas disse que usou vigilância aérea para minimizar as baixas civis, o que significa que sabia que o café estava lotado de clientes no momento”, afirmou ao Guardian o professor de direito da London School Gerry Simpson, que também é diretor associado de Crise, Conflito e Armas da ONG Human Rights Watch.
Para Andrew Forde, professor assistente de direito na Universidade da Cidade de Dublin, o ataque foi chocante. “Quando vemos uma situação em que há uso de munições pesadas, particularmente em um espaço civil lotado, mesmo com a melhor seleção de alvos do mundo, (…) isso necessariamente criará um resultado indiscriminado que não está em conformidade com (…) as convenções de Genebra”, afirmou ele ao veículo britânico.
O pesquisador se refere ao conjunto de leis que estabelece limites a conflitos armados e tem o objetivo de proteger civis, combatentes e o meio ambiente uma vez que os combates já estão em curso. Embora a baixa de civis seja aceita em situações de guerra específicas, os ataques sempre devem seguir o princípio da proporcionalidade.
Uma operação que coloque em risco centenas de civis para matar uma soldado de baixo escalão e destruir poucas armas antigas, por exemplo, provavelmente não seria aceita como legítima. A situação oposta seria um ataque previamente avisado à população local para atingir uma arma com alto poder destrutivo em uma área já esvaziada, mas que pode ter algum civil remanescente.
“É quase impossível entender como o uso desse tipo de munição pode ser justificado. Se estamos falando de 20, 30, 40 ou mais vítimas civis, geralmente esse seria um alvo de altíssima importância”, afirmou ao Guardian Marc Schack, professor associado de direito internacional na Universidade de Copenhague. “Para as forças da coalizão no Afeganistão e no Iraque, o número aceito para um alvo de altíssima importância era de menos de 30 civis mortos, e somente em circunstâncias excepcionais.”
Tel Aviv intensificou os ataques a Gaza nas últimas semanas e manteve os bombardeios nesta quinta-feira (3). Atribuindo a informação ao Ministério da Saúde local, o veículo qatari Al Jazeera afirma que 118 palestinos foram mortos nas últimas 24 horas, número que incluiria 12 mortos nas imediações dos centros de distribuição de ajuda apoiados por EUA e Israel.
Um dos ataques foi na Escola Mustafa Hafez, instituição que abriga deslocados no oeste da Cidade de Gaza, afirmou à agência de notícias AFP o funcionário da Defesa Civil do território Mohamed al-Mughayyir.
A guerra, desencadeada em outubro de 2023 por um ataque terrorista do Hamas no sul de Israel que matou 1.200 pessoas, devastou o território palestino e forçou o deslocamento de quase todos os seus moradores. Até agora, o conflito matou mais de 56 mil palestinos, cerca de 3% da população de Gaza, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas.
Muitos buscaram refúgio em escolas, frequentemente alvos de ataques israelenses, que, segundo os militares, têm como alvo combatentes escondidos entre a população civil. Contatado pela AFP, o Exército de Israel afirmou estar analisando os relatos dos ataques desta quarta.