SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após renovar o menor patamar de fechamento desde 19 de setembro na véspera, o dólar encerrou a sessão desta terça-feira (1º) com uma alta de 0,48%, a R$ 5,460, depois que o governo recorreu ao STF (Supremo Tribunal Federal) para reativar o decreto que aumenta o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). No ano, porém, a divisa dos EUA acumula uma queda de 11,63%.
A alta do dólar frente ao real interrompeu uma sequência de três quedas seguidas e destoou do restante do mundo, onde a moeda norte-americana se desvalorizou ante outros pares. Ao fim do pregão, o índice DXY, que mede a força do dólar em comparação a outras seis divisas, recuava 0,05%, a 96,73.
Na cena internacional, os investidores avaliaram as incertezas em relação aos acordos comerciais com os EUA, à medida que o prazo final das tarifas se aproxima, e a aprovação do projeto de lei de corte de gastos dos Estados Unidos, que elevará a dívida americana.
Já a Bolsa encerrou com uma valorização de 0,50%, a 139.549 pontos, com as ações da Vale e da Embraer entre as maiores altas, após pedido de aviões pela SAS (Scandinavian Airlines).
Começando pelo cenário doméstico, os agentes do mercado financeiro seguiram atentos ao impasse sobre o aumento do IOF. Na terça-feira passada (24), o Congresso derrubou os decretos que elevariam as alíquotas do imposto.
Apesar da resistência de uma ala do governo e do PT, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu brigar na Justiça pela reativação do decreto com elevações no IOF.
A AGU (Advocacia-Geral da União) protocolou uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) nesta terça-feira. A ideia é questionar a constitucionalidade da decisão do Congresso, com base na análise técnica e jurídica.
“A avaliação técnica dos nossos advogados, e que foi submetida ao senhor presidente da República, foi que a medida adotada pelo Congresso Nacional acabou por violar o princípio da separação de Poderes”, disse Jorge Messias, advogado-geral da União.
Segundo analistas, a reação negativa do mercado nacional se dá tanto pelo conteúdo do decreto do IOF, que já vinha gerando insatisfação entre os investidores, quanto pela perspectiva de embate institucional entre Executivo e Legislativo, o que gera incerteza para o cenário político do país.
“O movimento atual do governo gera preocupações entre os investidores, pois transmite uma imagem de falta de união e levanta dúvidas sobre a capacidade do governo de cumprir as metas fiscais até o fim do ano. Isso aumenta a incerteza no mercado”, disse Thiago Avallone, especialista em câmbio da Manchester Investimentos.
Na perspectiva de Bruno Botelho, especialista em câmbio da One Investimentos, a retomada da alta do dólar frente ao real após dois dias seguidos de queda, destoando de outras moedas, também reflete fatores internos.
“A decisão do governo Lula de recorrer ao STF cria ruídos institucionais e adiciona incerteza fiscal ao radar dos investidores. Esse ambiente favorece uma postura mais cautelosa com ativos locais”, afirmou Botelho.
Nesta terça, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que o cumprimento da meta fiscal de 2026 depende da efetivação da iniciativa que eleva o IOF, da medida provisória que aumentou tributos sobre aplicações financeiras e de projeto a ser apresentado para cortar R$ 15 bilhões em benefícios tributários.
Haddad disse que as medidas elaboradas pelo governo buscam corrigir distorções e fechar brechas do sistema.
Já na frente dos dados domésticos, o mercado avaliou a contração da atividade industrial do Brasil, que se aprofundou em junho, segundo dados da PMI (pesquisa Índice de Gerentes de Compras) desta terça.
O índice, compilado pela S&P Global, caiu a 48,3 em junho, contra 49,4 em maio, indo mais abaixo da marca de 50 que separa crescimento de contração e marcando a deterioração mais intensa nas condições operacionais desde julho de 2023.
Além disso, o resultado leva ao pior desempenho trimestral do setor desde o quarto trimestre de 2023.
No contexto internacional, as preocupações com as tarifas norte-americanas e seu impacto sobre o crescimento global ressurgiram, à medida que se aproxima o prazo de 9 de julho para que os países cheguem a acordos com os EUA.
O secretário do Tesouro, Scott Bessent, indicou que haverá uma série de acordos comerciais na semana final antes do prazo, mas alertou que os países ainda poderão enfrentar tarifas muito mais altas depois desta data.
“Temos países que estão negociando de boa-fé, mas eles devem estar cientes de que, se não conseguirmos chegar a um acordo porque eles estão sendo recalcitrantes, poderemos voltar aos níveis de 2 de abril. Espero que isso não aconteça”, disse.
A Casa Branca informou que Trump planeja se reunir com sua equipe comercial nesta semana para definir as tarifas para cada país caso eles não negociem com os EUA.
Os receios quanto às disputas comerciais têm provocado nos últimos meses um movimento de fuga dos ativos dos EUA, incluindo o dólar, levando a divisa a recuar tanto frente a pares fortes, como o euro e o iene, e emergentes, como o peso mexicano e o rand sul-africano.
Na frente dos dados dos EUA, o Departamento do Trabalho americano em sua pesquisa Jolts mostrou que as vagas de emprego em aberto, uma medida da demanda de mão de obra, subiram em 374 mil, para 7,769 milhões, no último dia de maio. Economistas consultados pela Reuters previam 7,30 milhões de vagas.
Na perspectiva de Ian Lopes, economista da Valor Investimentos, os dados do mercado de trabalho americano acima do esperado podem adiar o primeiro corte de juros por lá.
“Com a economia americana aquecida, há a necessidade de manter os juros elevados por mais tempo para controlar a inflação e equilibrar o consumo”, disse.
“Se esse corte demorar, a taxa de juros americana permanece mais atrativa, o que tende a fortalecer o dólar, já que investidores buscam a segurança dos títulos americanos.”
O presidente do Fed, Jerome Powell, reiterou que o banco central norte-americano planeja “esperar e saber mais” sobre o impacto das tarifas sobre a inflação antes de reduzir a taxa de juros, ignorando novamente as exigências do presidente Donald Trump de cortes imediatos e profundos nos juros.
“Enquanto a economia dos EUA estiver sólida, acreditamos que a coisa prudente a fazer é esperar, saber mais e ver quais serão esses efeitos”, disse Powell.
Além disso, o Senado dos Estados Unidos, controlado pelos republicanos, aprovou o projeto de lei do presidente Donald Trump sobre impostos e gastos nesta terça-feira. O pacote poderá consagrar muitas das principais prioridades de Trump como lei e acrescentar US$ 3,3 trilhões à dívida nacional.
O projeto de lei agora volta para a Câmara dos Deputados para aprovação final. Trump tem pressionado os parlamentares para que o projeto chegue à sua mesa e seja sancionado como lei até o feriado de 4 de julho, Dia da Independência.