BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Secretários de Segurança Pública estaduais querem aprimorar o compartilhamento de dados para fortalecer as investigações e propõem a criação de uma tipificação do crime de extorsão praticado pelo crime organizado, como nos casos da atuação de milícias em que a população é forçada a contratar serviços desses grupos.

Atualmente, o Código Penal tipifica o crime de extorsão com pena de 4 a 10 anos de reclusão, mas não prevê agravantes quando a prática é cometida por integrantes do crime organizado. A proposta, nesse caso específico, é elevar a pena para 8 a 15 anos de prisão.

A medida integra um pacote com nove projetos que tratam de normas infraconstitucionais proposto pelos secretários. Elas serão apresentadas e debatidas na Conferência de Segurança Pública iLab-Segurança 2025, que ocorre a partir desta terça-feira (1°), antes de serem encaminhadas ao Congresso. O evento é organizado pelo Conselho Nacional dos Secretários de Segurança Pública.

Estão também em discussão propostas para alterar as regras em casos de prisão em flagrante, aumentar as penas para crimes contra agentes do Estado, reformular a composição do Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social e destinar uma parcela maior da arrecadação das apostas esportivas, as chamadas bets, à área da segurança pública.

Com relação às regras da prisão em flagrante, a proposta prevê que, quando o flagrante envolver crimes com pena máxima superior a quatro anos ou praticados com violência ou grave ameaça, o juiz deverá manter a prisão por até 60 dias. Após esse prazo, caberá ao magistrado decidir se o acusado responderá ao processo em liberdade ou continuará preso.

Com isso, o juiz deixaria de ter autonomia para soltar o preso imediatamente após a audiência de custódia. Nesses casos, a audiência teria como única finalidade a análise da legalidade da prisão.

Atualmente, a audiência de custódia permite a soltura do preso mesmo diante da gravidade do crime, desde que haja justificativa legal. A decisão depende da avaliação do caso concreto, do contexto da prisão e dos argumentos apresentados pela defesa e pelo Ministério Público.

Segundo Sandro Avelar, presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Segurança Pública, as audiências de custódia foram desvirtuadas e têm favorecido criminosos.

“Isso permite que reincidentes, com múltiplos antecedentes criminais, continuem a cometer crimes de menor gravidade até que um crime gravíssimo seja cometido”, disse Avelar, que é secretário de Segurança Pública do Distrito Federal.

Ele acrescenta que as propostas visam aprimorar a segurança no Brasil e são consideradas complementares à PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Segurança, iniciativa do governo Lula (PT) atualmente em trâmite na Conselho de Constituição e Justiça da Câmara.

“A PEC estabelece diretrizes, funcionando como uma coluna vertebral para a segurança pública. Enquanto isso, as propostas infraconstitucionais são mais específicas e têm como objetivo detalhar e modificar a legislação para implementação dessas diretrizes”, disse.

A alteração na composição do Conselho Nacional de Segurança Pública é uma reivindicação importante para os secretários. Hoje, ele é formado por mais de 50 integrantes entre titulares e suplentes e tem reuniões apenas duas vezes por ano.

A proposta prevê redução para 18 vagas, com representação da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Guarda Municipal, Corpo de Bombeiros, Polícia Militar, Polícia Civil, Ministério Público, Judiciário e sociedade civil.

“O objetivo é que os profissionais da segurança pública possam, de fato, cuidar da segurança pública, permitindo a instituição de políticas duradouras e consistentes. Quando você analisa a legislação e observa a composição desse conselho, percebe que ela é péssima, absurdamente fora da realidade, é inexequível”, disse Avelar.

Algumas propostas dos secretários de segurança pública convergem em projetos semelhantes em tramitação no Congresso, como o que tipifica o crime do novo cangaço, atualmente no Senado — embora com penas diferentes.

Um dos projetos já enviados à sanção do presidente Lula classifica como homicídio qualificado e crime hediondo o assassinato de juízes, promotores, policiais e outras autoridades do sistema de Justiça. A proteção se estende a cônjuges, companheiros e parentes até o terceiro grau, inclusive por afinidade.

Os secretários, porém, defendem o aprimoramento dessa qualificadora para ampliar o rol de servidores e com aumento de penas.

A PEC da Segurança também tem como um dos objetivos que haja a integração e compartilhamento de dados para investigação. “Nossa proposta é infraconstitucional, mais específica”, disse.

Há também projeto que recomenda a conversão de prisão em flagrante em preventiva (sem prazo) — como reincidência ou uso de violência. Os secretários, por sua vez, propõem que, em casos de crimes graves, a liberação do preso seja postergada até o prazo de 60 dias.

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PRINCIPAIS PROPOSTAS DOS SECRETÁRIOS

Regulamentação do Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social

Atualmente: O conselho conta com mais de 50 membros.

Como fica: Conselho conta com 18 membros, sendo a maioria da área da segurança pública.

Compensação financeira aos Estados e Distrito Federal por atuação na repressão ao tráfico de drogas

Atualmente: A destinação dos bens e recursos confiscados com o tráfico de drogas é revertido integralmente à União, por intermédio do Funad (Fundo Nacional Antidrogas), que a seu critério pode repassar uma parte aos governos estaduais.Como fica: Bens e valores apreendidos e confiscados sejam destinados ao Funad, quando a apreensão decorrer de atuação dos órgãos federais, e aos Fundos de Segurança das unidades da federação nos casos em que o processo decorrer da atuação dos órgãos de segurança pública estaduais.

Investigação colaborativa entre agências governamentais

Atualmente: Não há regras claras entre os entes para uma investigação realizada entre os órgãos. Geralmente, uma autoridade oficia a outra, sem gestão e facilidade no compartilhamento.

Como fica: Estabelece mecanismos de investigação colaborativa entre os órgãos de fiscalização e controle, as polícias judiciárias e o Ministério Público. Entre elas, os órgãos manterão setor específico para intercâmbio de informações.

Repressão ao homicídio e lesão corporal contra agentes do estado

Atualmente: Não há qualificação para esses dois crime quando acontecem contra agentes do estado.

Como fica: A proposta é incluir qualificação para crimes contra agentes do estado, com penas de reclusão de 20 a 40 anos para homicídio e de 2 a 5 anos para lesão corporal grave.

Repressão aos crimes praticados por organizações criminosas

Atualmente: O crime de extorsão é tipificado, mas não há tipificação quando é praticado pelo crime organizado.

Como fica: Tipifica o crime de extorsão praticado por membros de organizações criminosas, como nos casos em que a organização obriga a população a adquirir serviços essenciais e exige vantagem financeira para o exercício de atividade econômica ou política.

Criação do crime de obstrução de Justiça no Código Penal

Atualmente: Código Penal prevê o crime de coação no curso do processo, exigindo, para sua configuração, a existência de violência ou grave ameaça. Diante disso, várias formas de obstrução de justiça ficam impunes diante da ausência de tipo penal específico.

Como fica: Tipifica crime para quem impedir, embaraçar ou retardar, de qualquer forma, o andamento de inquérito policial ou processo criminal. A punição é agravada mediante emprego de grave ameaça ou violência a pessoa. Pena variam de de 2 a 8 anos.

Aumento da eficácia do processo criminal em casos de prisão em flagrante de crimes graves

Atualmente: A audiência de custódia não impede a soltura mesmo em casos de crimes graves. Tudo depende da análise do caso concreto, do contexto da prisão e dos argumentos da defesa e do Ministério Público.

Como fica: No caso de prisão em flagrante por crime com pena superior a 4 anos ou praticado mediante violência ou grave ameaça, o juiz manterá a prisão do indiciado por prazo não superior a 60 dias. Após esse prazo o juiz define se o acusado responde ao processo em liberdade ou não.

Repressão ao domínio de cidades, conhecido como “novo cangaço”

Atualmente: Não há tipificação para domínio de cidades.

Como fica: Tipifica o crime de domínio de cidades, que seria entendido como ordenar, executar ou participar de ação de bloqueio total ou parcial de vias de tráfego, terrestre ou aquaviário, ou de estruturas ou equipamentos das forças de segurança pública, com emprego de arma, com finalidade de praticar crimes contra o patrimônio ou a incolumidade pública. Pena varia de 8 a 30 anos, prevê o texto.

Financiamento da Segurança Pública

Atualmente: A segurança pública fica com 13,60% da arrecadação das bets;

Como fica: Aumentar para 18% os recursos arrecadados para a área de segurança pública, redirecionando 12% aos fundos de segurança pública dos estados e do Distrito Federa e 6% aos fundos penitenciários