BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O relator do GT (Grupo de Trabalho) da reforma administrativa da Câmara, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), diz à Folha que vai propor uma regra para permitir o ingresso no serviço público já em níveis mais altos das carreiras.
“Dependendo da qualificação, em vez de entrar no nível 1, entrar no nível 10. Flexibilizar a entrada. Isso permite reduzir o salário de entrada”, afirma. Para ele, há uma janela política para aprovação da reforma antes das próximas eleições. O relatório final do GT será apresentado no dia 14 de julho por determinação do presidente da Câmara, Hugo Motta.
Segundo Pedro Paulo, a ideia é apresentar com o relatório os textos legais de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição), um projeto de lei complementar e outro de lei ordinária. Ele antecipa que não vai mexer na estabilidade nem reduzir direitos. “Mas não vou tratar como vítima, porque o servidor precisa entregar resultados.”
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*Folha – Qual orientação o presidente Hugo Motta passou para a reforma e as medidas fiscais?*
*Pedro Paulo -* Acredito que essa é a reforma do momento. Assim como tivemos a reforma trabalhista, previdenciária e a tributária, essa é a mais significativa que temos nesse horizonte. Para ter tração política, é muito importante que tenha um grande patrocinador. O presidente é o padrinho da reforma e o articulador. O Hugo está muito decidido e ele trata isso com disciplina. O governo está dentro da reforma.
*Folha – Qual governo?*
*Pedro Paulo -* Todos os segmentos dele. É de interesse do governo. Seria uma infantilidade política acreditar que uma reforma, com o tamanho pretendido e a profundidade que se ambiciona, se faz só com Legislativo. Iria dar com os burros n’água. Precisamos do Executivo e do Judiciário caminhando junto. Ela precisa ser ampla, profunda, para não ser simplesmente um arranhão. Precisa também os três entes sentarem-se à mesa. É a reforma 3×3.
*Folha – O que faz o sr. acreditar que, faltando um ano e meio para as próximas eleições, o Congresso irá aprovar?*
*Pedro Paulo -* Está dada uma janela de oportunidade política. Se acreditarmos que há ganhos políticos, a reforma pode ser um jogo de ganha-ganha para todos. Tenho muita convicção de que conseguiremos construir esse consenso político. Isso pode criar a atração necessária para que, mesmo que próximos do processo eleitoral, nós possamos fazer com que a reforma seja um bônus político.
*Folha – Que janela política é essa?*
*Pedro Paulo -* Ter um presidente da Câmara que estabelece isso como prioridade e encontra no governo espaço para essa discussão. Tem um ambiente para isso. Dado o grau de maturidade de convergência política, é possível que tenha um rito mais simplificado levando para o plenário.
*Folha – A equipe do ex-ministro da Economia, Paulo Guedes, apresentou a PEC 32 da reforma prevendo uma economia de R$ 300 bilhões em dez anos…*
*Pedro Paulo -* Outro dia li um artigo defendendo a reforma, mas sob o aspecto de que produziria uma redução de bilhões de despesas, confundindo o conceito de reforma com o pacote de ajuste fiscal. São coisas diferentes. Esses pontos interditam o debate e estavam na concepção da formulação da PEC 32. Deu no que deu. Procurei imediatamente desobstruir esse debate, dizendo o seguinte: ‘Olha, servidor não é vilão, não vou mexer na estabilidade nem vou reduzir direitos de servidor’. Mas não vou tratar como vítima, porque o servidor precisa entregar resultados.
Vamos enfrentar alguns núcleos mais atrasados e que não conseguem compreender que o Estado tem que ser mais flexível, mais ágil. Essa flexibilidade é fundamental para o Estado entregar mais. Estamos avançando na discussão de como ampliar a possibilidade de vínculos de contratações de serviço público que não sejam só no formato estatutário. Criando um comando para disciplinar contratos de temporários mais longos.
Na cidade do Rio, a gente viu a força de segurança municipal permitir a contratação de agentes por um período de seis anos. Organizar essas contratações em lei, exigências, por exemplo, para ter processo seletivo simplificado, exigir treinamento durante esse período, qualificação, ter cláusulas antinepotismo e apadrinhamento dessas contratações temporárias. Temporário não significa dizer precário.
*Folha – O que pode entrar no relatório em relação às carreiras?*
*Pedro Paulo -* Vamos aumentar os níveis de progressão de carreiras. Por exemplo, hoje a gente tem em média 15 a 16 níveis de progressão. Vamos aumentar para 20 ou mais. Não só para o governo federal, mas para estados e municípios. A gente quer trazer a possibilidade de que servidor que faz concurso público não necessariamente tem que entrar no nível 1.
Ele pode, dependendo da qualificação, em vez de entrar no nível 1, entrar no nível 10. Flexibilizar a entrada. Isso permite reduzir o salário de entrada. Você tem, por exemplo, um sujeito que é do Tesouro e quer virar auditor da Receita. Ao invés de fazer um concurso para o nível 1, faz para o nível 10.
*Folha – A proposta vai tocar na avaliação de desempenho?*
*Pedro Paulo -* As avaliações de desempenho hoje são, na verdade, fake. São basicamente um grande conluio entre chefe e subordinado hoje, que amanhã o subordinado vira chefe. As avaliações de desempenho individuais não medem nada. Eu conheço bem isso, como é a pontuação. As carreiras que têm um poder de negociação maior criaram simplesmente essas avaliações só para aumentar salário. Quando você traz esse modelo dos indicadores, começa a permitir que essas avaliações não sejam só individuais, que elas sejam feitas também por órgão, secretarias, por ministérios. Faz com que essas avaliações dependam, por exemplo, do resultado de uma equipe de um órgão.
*Folha – Como o sr. pretende tratar a estabilidade do servidor público?*
*Pedro Paulo -* Não é ponto central de uma reforma. Implementei uma reforma na Prefeitura do Rio e não toquei uma vírgula na estabilidade do servidor. Eu li outro dia que teriam segmentos do Planalto, que queriam apresentar ao GT uma proposta para, de alguma forma, regulamentar o artigo 41 [que trata da estabilidade]. Criar algum tipo de regulamentação para que baixo desempenho recorrente pudesse ter algum afastamento. Se o governo quiser apresentar uma proposta, estou à disposição para receber e avaliar.
*Folha – A reforma vai tratar do excesso de penduricalhos que levam aos supersalários?*
*Pedro Paulo -* Acredito que a reforma precisa entrar na questão dos supersalários, dos penduricalhos. Menos do ponto de vista fiscal e mais do ponto de vista ético. Esse é um ponto que envergonha. O projeto em discussão no Congresso aumentou em vez de racionalizar o gasto. Ele já implodiu. A gente tem uma janela para tratar aqui.
*Folha – É possível incluir na reforma medidas fiscais?*
*Pedro Paulo -* Uma coisa é reforma administrativa e outra é ajuste fiscal. São coisas separadas. Podem estar juntas? Se o presidente Hugo Motta falar assim: ‘O governo não conseguiu avançar nessa questão da redução do gasto primário, vamos colocar algumas propostas de redução da despesa’. A reforma administrativa estamos tocando no grupo de trabalho. As medidas estruturantes nós estamos cobrando do governo. Sinceramente, acredito que a gente poderia tocar a reforma, e o governo apresentar as medidas que vão tratar do gasto primário.
*Folha – O cenário mudou desde que o sr. acenou com essa possibilidade?*
*Pedro Paulo -* Não mudou. Eu apresento, se for o caso, eu coloco. Mas acredito que, se não partir essa iniciativa do Executivo na questão [medidas para reduzir] do gasto primário, fica difícil o Congresso apresentar sozinho. Se o governo acelerar essas discussões para valer da redução da despesa, numa mesa de forma franca, incluindo todos os Poderes, se quiser nós botamos juntos aqui um capítulo.
*Folha – O que é preciso fazer?*
*Pedro Paulo -* O arcabouço só tem uma chance de dar certo. É tomar três medidas. A primeira é desvincular o salário mínimo do benefício previdenciário. Isso não significa o benefício previdenciário não ter reajuste nenhum. Bota no arcabouço. Mas ele cresce com a lógica do arcabouço. A segunda é desvincular os pisos de saúde, educação; e a terceira é reduzir gasto tributário para valer, sem exceção.
*Raio-X l Pedro Paulo, 52*
É deputado federal. Já foi secretário de Fazenda e Planejamento da Prefeitura do Rio. Economista, tem MBA pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Cursou mestrado em economia regional na Universidade Fluminense e em política aplicada à Universidad Complutense de Madri.