SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Dezenas de milhares de pessoas foram às ruas em Budapeste, capital da Hungria, para participar da parada LGBTQIA+ no Dia do Orgulho –desafiando uma lei recente que proíbe essas manifestações e transformando o ato em um dos maiores protestos contra o governo de ultradireita de Viktor Orbán em anos, que tenta cercear direitos da comunidade LGBT+.

A multidão marchou pelas ruas de Budapeste com bandeiras do arco-íris e cartazes contra Órban, primeiro-ministro da Hungria há mais de 15 anos. Falando à agência de notícias Reuters, um dos participantes da parada disse que “isso é sobre muito mais do que homossexualidade, esse é o último momento para defendermos nossos direitos”.

Os organizadores da marcha dizem que cerca de 100 mil pessoas compareceram –um número que, se confirmado, tornaria o evento um dos maiores protestos da história da Hungria após a queda do comunismo.

O governo de Órban é visto por especialistas em democracia como cada vez mais autoritário, controlando em larga medida a imprensa do país, restringindo a oposição e gradualmente eliminando os direitos de pessoas LGBT+.

Na Hungria, o casamento entre pessoas do mesmo sexo é ilegal, pessoas LGBT em união estável não podem adotar crianças, e recentemente o governo alterou a Constituição para estabelecer que só existem os gêneros masculino e feminino –eliminando, desta forma, o reconhecimento de pessoas trans.

Além disso, em março deste ano, o parlamento húngaro também passou uma lei proibindo marchas do orgulho em nome de proteger crianças do que membros do Fidesz, o partido de Orbán, chamam de depravação moral. Na ocasião, o primeiro-ministro disse que, com Donald Trump de volta ao poder nos Estados Unidos, “os ventos sopram” a favor dos conservadores contra o que chamou de “loucura da ideologia de gênero”.

O prefeito de Budapeste, Gergely Karacsony, um opositor de Orbán, tentou uma manobra para driblar a proibição da parada ao registrar a marcha como um evento municipal, e não político –entretanto, a polícia manteve a proibição, citando a nova lei de proteção às crianças. A associação homofóbica entre pessoas LGBT+ e pedofilia é antiga e um dos ataques mais comuns à comunidade.

Orbán evitou uma repressão violenta da parada, tentando não produzir imagens claras de repressão que circulassem na imprensa mundial. Ao mesmo tempo, disse na sexta-feira (27) que pessoas que participassem do evento sofreriam as consequências legais –incluindo multas de até EUR 500 (R$ 3.200) para quem comparecer e um ano na cadeia para os organizadores.

A polícia disse que usaria reconhecimento facial para aplicar as punições. Karacsony, que compareceu ao evento, disse à imprensa não ter medo de prisão. “Isso só me deixaria mais famoso, mas não posso levar [a ameaça] a sério”.

Ao longo do sábado, grupos de extrema direita húngaros organizaram atos contrários à parada em Budapeste –estes, de cunho religioso, foram autorizados pela polícia. Alguns tentaram impedir a marcha à força, mas foram contidos por agentes de segurança, e não houve violência generalizada. Uma das pessoas que protestou contra a marcha disse à agência de notícias AFP que o evento era “repugnante”.

Os organizadores da parada LGBT+ de Budapeste disseram que pessoas de 30 países participaram do evento, incluindo 70 membros do Parlamento Europeu. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, saiu em defesa da manifestação, pedindo que as autoridades húngaras não impedissem a marcha.

O Ministério das Relações Exteriores da Hungria emitiu um comunicado dizendo que mesmo diplomatas estariam sujeitos às penas da nova lei se participassem da parada. Entre as autoridades estrangeiras presentes estava a comissária da União Europeia para a Igualdade, a política belga Hadja Lahbib.

Setenta entidades da sociedade civil da Hungria divulgaram uma carta conjunta apoiando a parada, dizendo que a lei “tem o propósito de intimidar toda a sociedade civil” e faz parte de uma investida ampla do governo Orbán contra as liberdades individuais e de expressão.

Segundo especialistas, a escalada da repressão do governo Orbán contra pessoas LGBT+ faz parte de uma estratégia eleitoral para mobilizar sua base e conquistar apoio para as próximas eleições gerais, marcadas para abril de 2026.