SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Enquanto Jair Bolsonaro (PL), inelegível, mantém incerto o nome de seu herdeiro nas urnas do ano que vem, Tarcísio de Freitas (Republicanos) reforça sua fidelidade ao padrinho político, intensifica a promoção das ações de seu governo e evita os temas mais polêmicos relacionados ao bolsonarismo.
Neste domingo (29), novamente, o governador estará na avenida Paulista para uma manifestação convocada por Bolsonaro, que se hospeda no Palácio dos Bandeirantes como faz quando está em São Paulo. O protesto voltará a pedir anistia a bolsonaristas acusados de ligação com a trama golpista do fim de 2022.
Considerado por dirigentes de centro-direita como Valdemar Costa Neto (PL) e Ciro Nogueira (PP) o nome mais capaz de concorrer contra Lula (PT) no ano que vem, o governador de São Paulo ampliou nos últimos dias suas agendas no interior do estado, em movimento similar ao de antecessores que disputaram a reeleição.
O aumento das atividades ocorreu após ele avisar aliados que não queria ouvir falar sobre Presidência, o que foi interpretado por seu entorno como parte de uma estratégia para reforçar a lealdade ao ex-presidente e não fechar portas a uma eventual indicação.
Neste mês, Tarcísio visitou 16 municípios paulistas (sem contar os eventos na capital) e, até sexta-feira (27), havia publicado 61 vídeos em suas redes sociais dos quais cinco tiveram mais de 1,6 milhão de visualizações. Em junho do ano passado, foram 39 vídeos e agendas em seis cidades.
Além de mais publicações, a comunicação do governador tem investido em vídeos com recursos de edição, legendas destacadas e uso mais frequente de planos de corte e movimentos de câmera elementos que, segundo aliados, visam aumentar o alcance nas redes.
As mensagens divulgadas pela equipe enfatizam duas ideias centrais: que sua gestão é mais eficiente e, por isso, realiza mais entregas. Elas destacam marcas de seu mandato que ele planeja levar às urnas, como o Tabela SUS Paulista (que aumenta repasses à saúde), o SuperAção (de assistência social) e o Casa Paulista (de moradias populares em parceria com a iniciativa privada).
“A gente não é pautado pelo discurso, pela narrativa. A gente é pautado pela entrega. E os resultados estão aí para quem quiser ver”, disse Tarcísio, em um vídeo gravado em São José do Rio Preto, a 438 km da capital, em uma publicação da última semana.
As agendas geram, contudo, situações inesperadas. Na visita a Rio Preto, ao tirar uma selfie, um eleitor gritou de forma espontânea ao microfone: “Futuro presidente do Brasil”. Surpreso, Tarcísio retrucou de pronto: “Não, sou nada, que é isso”, enquanto o público riu.
Tarcísio e Bolsonaro estiveram juntos há duas semanas em Presidente Prudente, onde visitaram uma feira agropecuária. No ato público, o governador que costuma manter tom descontraído em eventos concordou em soltar um “ihuuu” típico de cowboys, a pedido do ex-presidente.
Nos bastidores, segundo aliados, o clima amistoso se repetiu. Bolsonaro tomou café da manhã com a bancada bolsonarista da Assembleia Legislativa e, à noite, boa parte do mesmo grupo jantou com Tarcísio, que estava acompanhado de secretários. Eles cantaram parabéns e trouxeram um bolo para o governador, que completou 50 anos no último dia 19.
De acordo com duas pessoas ouvidas pela reportagem, em nenhum dos dois encontros houve discussão sobre sucessão presidencial. O diálogo se concentrou na conjuntura do Congresso, em críticas ao governo petista e no atual cenário do grupo no STF (Supremo Tribunal Federal).
Enquanto incrementa sua presença nas redes sociais e nos palanques do interior, Tarcísio tenta evitar os temas polêmicos recentes que envolvem o bolsonarismo, uma posição que preserva a relação com a base do ex-presidente sem afastar eleitores moderados.
Há duas semanas, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) disse à reportagem que, mais do que prometer indulto a Bolsonaro, o candidato do grupo à Presidência tem que garantir que o benefício será efetivado, mesmo que seja preciso o “uso da força” contra o STF.
A reportagem tenta, desde a última semana, saber se o governador concorda com o tema. Foram enviadas perguntas por email ao Palácio dos Bandeirantes, reiterado o pedido por WhatsApp e buscado contato em dois eventos públicos um na praça da Sé, no centro, e outro em Lagoinha, no interior do estado. Em nenhuma das ocasiões houve resposta.
A reportagem também tem procurado o governador para questioná-lo sobre qual seria, na sua visão, o modelo ideal de anistia se seria restrita aos presos sob acusação de invadir as sedes dos Poderes, se incluiria também acusados de liderar a trama ou se haveria exceções. O governador, que deve abordar o tema em discurso neste domingo, já distorceu fatos ligados à tentativa de golpe.
A postura reservada sobre temas sensíveis é reforçada por decisões de Tarcísio, em algumas ocasiões, de não conceder entrevistas após seus próprios eventos.
A Comunicação do Palácio dos Bandeirantes não respondeu aos questionamentos, mas enviou uma nota para negar que Tarcísio silencie sobre pontos incômodos. “O governador Tarcísio de Freitas preza pela transparência e diálogo da sua gestão e mantém diálogo contínuo com a imprensa, sem qualquer tipo de restrição”.
A nota afirma que Tarcísio “concedeu mais de 50 entrevistas, entre coletivas e exclusivas” neste ano e que, neste mês, foram 16 coletivas.
“O Governo de São Paulo reconhece e valoriza a importância do trabalho da imprensa e reforça o seu compromisso com a transparência e o acesso à informação na gestão pública”, afirma o texto.