SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Há pelo menos duas mulheres profundamente implicadas na 20ª CineOP, a Mostra de Cinema de Ouro Preto, que começou nesta quarta-feira (25). A primeira delas, mais evidente, é Marisa Orth, homenageada em nome de todas as comediantes femininas, bem entendido do audiovisual brasileiro.
Terá uma série de curtas de diretoras que viriam se tornar famosas, como Carla Camurati ou Anna Muylaert. Orth representa, segundo o festival, a mulher que rompe com estereótipos femininos embora Magda, seu personagem mais famoso, seja o clichê, por excelência, da mulher.
Da segunda, mais secreta, não existe filme para ver. São raras as imagens de Eva Nill, atriz que parecia ter tudo para ser a primeira estrela do cinema brasileiro. Revelada por Humberto Mauro nos filmes do famoso ciclo de Cataguases, tomou o partido do pai, Pedro Comello, quando ele, produtor, e Mauro, diretor, se desentenderam.
Nill ainda fez o seriado “Senhorita Agora Mesmo”, com o pai antes de retirar-se para sempre. Sua trajetória, não só no cinema, é objeto de “O Silêncio de Eva”, filme de Elza Cataldo que será exibido ao longo da mostra.
Não ficam por aí as presenças femininas. Haverá uma conversa entre diretoras como Anna Muylaert e Cris Damato, e a exibição da versão restaurada de “A Mulher de Todos”, de Rogério Sganzerla, em que Helena Ignez é bem mais do que atriz. E não se pode deixar de lado o restauro de “Alô Alô Carnaval”, musical de Adhemar Gonzaga em que a presença de estrelas da música brasileira é crucial, a começar por Carmen Miranda.
Esses restauros ilustram, no mais, a razão de ser da mostra de Ouro Preto. “Em 2000, numa das primeiras mostras de Tiradentes, previmos homenagear dois filmes: Limite, de Mário Peixoto, e Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha. Para exibir os filmes foi uma pequena odisseia. Para se ter uma ideia das dificuldades, só encontramos a cópia de Limite na França”, diz Raquel Hallak, criadora e diretora da mostra.
Nos 20 anos de existência do CineOP, houve mudanças importantes no campo da preservação. Os custosos restauros analógicos foram substituídos por tecnologia digital, o que os tornou mais rápidos e baratos.
Algumas iniciativas, como o surgimento de uma rede de arquivos e acervos ajudaram a organizar o conhecimento sobre o material existente e sua localização. A troca entre pesquisadores e técnicos de preservação tornou-se mais frequente.
Embora a preservação ainda se ressinta do baixo número de especialistas, já foi criada uma rede de laboratórios universitários de preservação, a partir do Lupa, criado pela Universidade Federal Fluminense.
Se isso promove as escolas de cinema a “lugares de memória”, como define Hallak, esses avanços não a fazem se entusiasmar demais. Para ela, ainda falta um plano geral de preservação o que envolve o governo federal e a consciência da importância da preservação pelos próprios profissionais de cinema.
Talvez por isso a CineOP não se dedique apenas à exibição de filmes, mas à promoção de seminários em que questões de preservação e restauro são debatidas. Promove também este ano, pela primeira vez, uma mostra competitiva com filmes criados com base em imagens de arquivo. Entre eles, um diz respeito a Jean-Claude Bernardet e sua parceria com Luiz Sergio Person no projeto, nunca realizado, de “A Hora dos Ruminantes”, além de um autorretrato de Jorge Bodanzky.