SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, fez um pronunciamento de TV sobre a guerra contra Israel e os Estados Unidos nesta quinta (26), e disse que os americanos “atingiram instalações nucleares” de seu país, “mas não alcançaram muita coisa”.

O dado, sem evidência alguma, coloca água no moinho de especulações acerca da operação militar dos EUA que enviou sete bombardeiros furtivos ao radar B-2 em uma missão de 37 horas para atacar duas centrais do programa nuclear da teocracia —uma terceira foi alvejada por mísseis de cruzeiro lançados por um submarino.

A extensão do dano ao programa iraniano, “casus belli” formal do ataque de Tel Aviv que disparou o conflito no dia 13 passado, é motivo de debate inflamado nos EUA.

O presidente Donald Trump e seu secretário de Defesa, Pete Hegseth, dizem que as instalações foram “obliteradas” e o programa que permitiria a Teerã construir bombas atômicas se desejasse, anulado.

Têm dúvidas o chefe do Estado-Maior Conjunto, Dan Caine, e toda a oposição democrata no Congresso, que pretende abrir uma investigação sobre o tema e a motivação da intervenção americana na guerra, no domingo passado (22).

Um relatório preliminar do Agência de Inteligência de Defesa sugere inclusive que o programa pode ter sido atrasado não em anos, mas em meses. Trump desconsiderou isso na quarta (25), mas admitiu que os dados eram inconclusivos.

Depois, amparado por “novos dados de inteligência” citados pela diretora de Segurança Nacional, Tulsi Gabbard, e pelo diretor da CIA, John Ratcliffe, o presidente voltou a dizer que o programa foi “devastado”. As informações sugerem que as centrais de Fordow, Natanz e Isfahan foram destruídas e levariam anos para ser refeitas.

Em Israel, o premiê Binyamin Netanyahu celebrou que a guerra “mandou o programa nuclear iraniano para o ralo”, mas o seu chefe de Estado-Maior, Eyal Zamir, foi mais cauteloso: o general disse que a guerra “atrasou em anos” a capacidade iraniana, mas não a anulou.

O fato é que ninguém sabe a verdade. O órgão que pode fazer tal avaliação de forma isenta, a Agência Internacional de Energia Atômica, já disse ser impossível dizer qualquer coisa sem inspeções físicas de seus técnicos.

Eles tiveram acesso e, dada a rusga com Teerã por ter decretado que o país estava descumprindo os acordos de transparência, o que foi usado por Israel para justificar seu ataque, não devem ter tão cedo.

Khamenei também não mostrou nada. O que o país já havia dito é que os 400 kg de urânio enriquecido a nível que já pode ser usado em bombas mais rudimentares, e próximo do necessário para uma explosão nuclear, estavam a salvo.

Além disso, Teerã havia dito ter removido diversos equipamentos das instalações atacadas, o que se for verdade significa que o enriquecimento pode continuar em outros lugares.

Assim como Trump e Netanyahu, o líder supremo cantou vitória no conflito com seus dois arquirrivais. Disse que os EUA só entraram na guerra porque “viram que Israel seria destruído”, um exagero militar dada a grande degradação das capacidade de Teerã.

Também afirmou que “qualquer agressão futura virá grande custo” e celebrou o ataque retaliatório que promoveu na segunda (23), quando lançou 14 mísseis contra a base americana de Al-Udeid, em Doha. Não fez referência ao fato de que o Irã avisou os EUA e o Qatar da ação, permitindo o esvaziamento do local.

A encenação mútua permitiu a todos deixar o conflito se dizendo vencedores, como de fato ocorreu. As razões mais básicas dele continuam: dúvidas sobre a capacidade de os iranianos terem a bomba e o ódio existencial do regime contra Israel.

Apesar da fala de Khamenei, parece evidente que houve danos significativos às instalações, como a própria mídia estatal do país persa já disse. O debate agora será acerca de seu escopo.

Internamente, a teocracia já demonstra sua face repressora. Desde o fim do conflito, na terça (24), 26 pessoas foram presas e 3, executadas sob acusação de espionar para Israel. A oposição local segue sob pressão, fragmentada.