HANGZHOU, CHINA (FOLHAPRESS) – Após anos de resistência da indústria automobilística chinesa, que privilegia carro elétrico, a Geely dá os primeiros passos na direção do etanol brasileiro.
A executiva Wang Ruiping, ouvida durante visita à sede da montadora em Hangzhou, afirmou que a joint venture de motores criada há dois anos com a francesa Renault, chamada Horse Powertrain, está “trabalhando com etanol no Brasil”. E prometeu, após ouvir que o jornalista era brasileiro: “Vocês vão ver”.
Dias depois, Geely e Renault aprofundaram seu vínculo estratégico, com o anúncio de um acordo acionário visando “a produção e venda de veículos de emissão zero ou baixa no Brasil”. Se aprovado pelos reguladores, a chinesa passará a montar e distribuir modelos usando a estrutura da francesa no país.
Wang é vice-presidente sênior do grupo Geely e comanda a divisão Aurobay, originalmente do grupo chinês, na Horse. Nesta, diz ela, “estamos desenvolvendo tecnologia avançada para motores híbridos de design compacto e alta eficiência”.
Apresentados ainda como conceito na feira de automóveis de Xangai, há dois meses, eles podem ser adaptados a diversas arquiteturas de veículos, ou seja, visam também outras montadoras, de outras regiões do mundo. O desenho reúne motor e transmissão elétricos com um pequeno motor a combustão.
Para esse, a Horse está trabalhando com diferentes tipos de energia, “inclusive etanol, metanol etc.”, diz Wang. A ideia é que, com o avanço dos carros elétricos, montadoras deixem de investir em motores próprios, passando a adquirir de fornecedores como a Horse, o que facilitaria a transição.
Por exemplo, a startup brasileira Lecar, formada originalmente para produzir elétricos puros, agora pretende produzir um carro híbrido –com esse motor da Horse– a partir de 2026 no Espírito Santo.
O conceito de híbrido apresentado em Xangai tem como um de seus objetivos, especificamente para a América do Sul, mas também a própria China, servir de extensor de autonomia, supostamente permitindo ir além do que iriam como carros elétricos puros.
Em declarações distribuídas durante a feira, o CEO da Horse, Matias Giannini, brasileiro com longa carreira no exterior, enfatizou que o propósito é facilitar e até acelerar a transição para os carros elétricos, não apostar contra eles.
Ele deu o etanol brasileiro como exemplo hipotético, falando à revista Fortune. “Se pegarmos um carro elétrico e instalarmos um extensor de autonomia pequeno e eficiente, movido a etanol, é o melhor dos mundos. Você reduz o tamanho da bateria e o custo do carro e ainda assim ele é quase 100% energia limpa.”
Outras alternativas são metanol, combustíveis sintéticos e também fósseis, como gás e a própria gasolina. No ano passado, a companhia de petróleo Saudi Aramco adquiriu 10% da Horse, deixando Geely e Renault com 45% cada uma.
No acordo preliminar anunciado para o Brasil, a Gelly passa a ser sócia minoritária da Renault do Brasil, permitindo a eventual produção de veículos próprios no Complexo Industrial Ayrton Senna, em São José dos Pinhais, no Paraná, além do uso de sua rede de distribuição. A Horse já tem linha de montagem no complexo.
Na cerimônia em Hangzhou, o presidente do grupo Geely, Eric Li, disse que a nova cooperação avança com base na anterior, de motores, e “faz parte do compromisso de trabalhar com parceiros globais para transformar a indústria em uma direção sustentável”.
Um dia após a visita à sede da montadora, foi possível acompanhar em Changxing, cidade próxima a Hangzhou, uma linha de montagem voltada ao Smart, resultado de outra joint venture da Geely, com a alemã Mercedes-Benz.
Com preço relativamente baixo e opções a combustão e elétrico, é um dos modelos cotados para distribuição no Brasil.
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O jornalista viajou a Hangzhou a convite do Conselho de Estado da China