SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A aviação de negócios de São Paulo observou uma reorganização nas movimentações de pouso e decolagem no último ano. Sob restrições em Congonhas, o segmento ganhou força em outros aeroportos, como o Catarina, em São Roque, e o Campo de Marte, na zona norte da capital paulista.

Um levantamento feito pela Abag (Associação Brasileira de Aviação Geral) a pedido da reportagem, com dados do Decea (Departamento de Controle do Espaço Aéreo), mostra que em janeiro deste ano as movimentações de pouso e decolagem da aviação geral (segmento que inclui jatos executivos) em Congonhas tiveram uma queda brusca e, desde então, se mantêm em patamar bem abaixo do observado no ano passado.

Em abril deste ano, último dado disponível no levantamento, o aeroporto da capital paulista somou 1.917 pousos e decolagens da aviação geral -uma queda de quase 38% na comparação com o mesmo mês de 2024. Os números consideram somente aeronaves de asa fixa da aviação geral.

A partir de janeiro deste ano, Congonhas passou a limitar a quantidade de pousos e decolagens de jatos permitidos por hora no aeroporto. Os movimentos foram reduzidos pela metade, de oito para quatro, para minimizar impacto das obras no aeroporto, segundo a Aena, concessionária do terminal. Esses outros quatro slots (jargão usado pelo setor para definir a movimentação na pista) ficam como reserva para eventuais ajustes das operações, afirma a Aena.

Anteriormente, em novembro de 2023, semanas após a Aena assumir a administração do terminal, uma outra restrição já havia limitado a operação de jatinhos no aeroporto: aviões de pequeno porte ficaram proibidos de usar a pista principal, que passou a ser exclusiva para aeronaves comerciais e jatos de grande porte. A medida foi solicitada pela concessionária e teve aval da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) e do Decea.

Sob a regra, aviões com envergadura inferior a 14,5 metros passaram a ter de usar apenas a pista auxiliar. A Abag estimou no ano passado que, logo após a medida, 25% da frota de jatos que operava no aeroporto decidiu sair de Congonhas.

Em entrevista à Folha neste ano, o diretor-presidente da Aena Brasil, Santiago Yus, afirmou que as medidas de restrições da movimentação da aviação executiva impulsionarão a pontualidade e a receita do terminal.

“A aviação executiva faz um transporte de um, dois, três, oito, dez pessoas. Um avião comercial, no mínimo, são 120, 130 pessoas. É um uso mais intensivo de pessoas que podem usufruir de um aeroporto como Congonhas, que é bem demandado”, disse na ocasião.

Procurada pela Folha, a Aena disse que ajustes foram necessários para melhorar a eficiência operacional do aeródromo. “A Aena entende que há espaço tanto para a aviação comercial quanto para a aviação executiva em operação no Aeroporto de Congonhas”, disse a companhia em nota à reportagem.

“O estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental, apresentado pelo governo para a concessão do aeroporto de Congonhas, considerava a retirada completa das operações de aviação geral. No entanto, a proposta apresentada por esta concessionária foi a de uma abordagem balanceada, que considere a priorização do atendimento ao maior número de usuários, ainda mantendo a possibilidade de operação da aviação geral”, completou a Aena.

Flavio Pires, CEO da Abag, diz que Congonhas ainda tem espaço para novos entrantes, mas, segundo ele, as restrições impostas pelo aeroporto podem mudar o perfil do usuário do terminal.

“Aquele cara que precisa voar todo dia, toda hora, talvez tenha que procurar outro aeroporto. Para aquele que tem um voo a cada quinzena, uma vez por semana, duas vezes por semana, é mais fácil de acomodar a operação dele aqui” afirma Pires.

Rodrigo Pesoa, vice-presidente da Dassault para América Latina, afirma que as restrições no terminal paulistano não prejudicaram as vendas da fabricante francesa de jatos de luxo. No entanto, ele diz perceber uma movimentação na base de clientes.

“Os clientes começam a fugir de Congonhas pelas restrições de pouso e decolagem. Você vê o crescimento do Catarina, a quantidade de aviões que tem aqui hoje”, afirma.

Na semana passada, a Dassault participou pela primeira vez do Catarina Aviation Show, feira de jatinhos no aeroporto Catarina, em São Roque, no interior de São Paulo. A fabricante francesa inaugurou no ano passado um centro de manutenção no aeroporto.

Segundo Pesoa, a mudança da Labace (outra feira de jatinhos, na capital paulista) para o Campo de Marte, na zona norte de São Paulo, complicou a operação e foi um dos motivos que levou a fabricante a fazer sua estreia no Catarina Aviation Show.

Até 2024, a Labace era realizada em Congonhas, no espaço onde ficavam os hangares da Vasp, companhia aérea cuja falência foi decretada em 2008. A primeira edição no Campo de Marte acontece em agosto deste ano.

“[O Campo de Marte] é um aeroporto menor, não é tão centralizado. Congonhas tinha uma série de vantagens, era muito próximo dos escritórios de muitos dos nossos clientes. O Campo de Marte é mais afastado, e a operação é um pouco mais complicada”, afirma.

Tanto o Campo de Marte quanto o Catarina registraram alta nas movimentações no último ano.

Apesar de um crescimento interanual tímido de 2,6%, o Campo de Marte foi o segundo maior em quantidade de pousos e decolagens em abril, com 2.879 movimentações, atrás de Jundiaí e à frente de Congonhas.

Segundo Rogério Prado, CEO da Pax Aeroportos, concessionária que administra o Campo de Marte, o aeroporto tem potencial para ser um substituto natural de Congonhas dentro da capital paulista. Ele afirma, no entanto, que o terminal na zona norte ainda precisa passar por adequações.

A concessionária, que é controlada por um fundo do grupo XP, fará adaptações no aeroporto, incluindo a construção de uma nova pista paralela, para que o Campo de Marte passe da categoria visual para operação com instrumentos. Dessa forma, o terminal pode permanecer aberto mesmo em condições desfavoráveis de visibilidade.

“Isso também é um fator do porquê eu não consigo hoje assumir mais tráfico. Quando tem tempo ruim, você não consegue decolar. Hoje eu estou bastante afetado por questões meteorológicas. Isso [a adequação] dá uma confiabilidade para o aeroporto: você [o dono da aeronave] tem uma certeza de que vai chegar e vai sair”, diz Prado.

Já o Catarina foi o terminal com maior crescimento interanual em abril, um salto de 78%, chegando a 1.790 movimentos no mês. Segundo Augusto Martins, CEO da JHSF, dona do aeroporto, o principal motivo do fortalecimento do Catarina é a qualidade do serviço.

Ele afirma, porém, que as restrições para jatinhos em Congonhas podem fazer o dono da aeronave repensar o terminal escolhido para o pouso ou para a decolagem. “O fato de o cliente aqui [no Catarina] não ter tempo de espera para pousar e decolar é um grande diferencial.”

O Catarina está em processo de expansão. O número de hangares passará de 12 para 16, com entrega prevista para o segundo semestre, segundo Martins. À Folha ele afirma que posteriormente deve haver uma nova expansão, ainda a ser anunciada para 20 hangares.

Apesar do avanço de terminais como Campo de Marte e Catarina, o aeroporto de Jundiaí é o mais movimentado do segmento -foram 2.992 pousos e decolagens em abril. O número representa uma queda de 8,72% na comparação com o mesmo mês do ano passado, mas ainda está em patamar elevado.

Antes superado por Congonhas, o terminal de Jundiaí tomou a dianteira nos últimos meses e se mantém no topo desde novembro.

Marcel Moure, CEO da Rede Voa, concessionária do aeroporto de Jundiaí, diz que o terminal tem algumas vantagens: é próximo à capital paulista e opera com instrumentos. Segundo ele, o aeródromo também foi beneficiado pela migração do segmento para outros aeroportos após o começo das restrições em Congonhas.

“Hoje, por exemplo, é sexta-feira (6) à tarde e meu pátio está lotado. Eu não tenho vaga para nada neste exato momento”, diz.

Em Sorocaba, outro terminal administrado pela Rede Voa, Moure vê estabilização nos movimentos, por ora. É que o aeroporto ainda opera em condições visuais, assim como o Campo de Marte, o que impede o aumento do fluxo, segundo Moure.

De acordo com o levantamento feito pela Abag, Sorocaba teve 1.208 pousos e decolagens em abril –o menor resultado entre os cinco terminais analisados. Na comparação com o mesmo mês do ano passado, o aeroporto registrou queda de 7,43% nas movimentações.