BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A guerra aérea entre Israel e o Irã prosseguiu com violência neste sábado (14), com nova troca de ataque entre os rivais. “O que eles sentiram até aqui não é nada comparado com o que eles receberão nos próximos dias”, disse o premiê do Estado judeu, Binyamin Netanyahu.
Antes, a retórica já estava inflamada. “Teerã vai queimar”, ameaçou o ministro da Defesa do Estado judeu, Israel Katz, após uma ação na capital adversária ter matado 60 pessoas segundo o governo local.
Houve forte bombardeio à capital iraniana mirando suas defesas aéreas, e um complexo habitacional foi atingido. Explosões atingiram bases militares em todo o país e dois relatos que podem adicionar uma nova dimensão ao conflito: um incêndio em uma refinaria em Tabriz (norte) e explosões num centro de extração de gás natural em Bushehr (sul).
Israel também afirmou ter finalizado a destruição dos sistemas de defesa entre o oeste do Irã e Teerã, abrindo um corredor seguro para suas aeronaves atacarem toda a região.
Do lado iraniano, a retaliação contra a ação iniciada por Israel durou a noite toda. Ao todos, já foram ao menos cinco barragens de mísseis balísticos -as duas primeiras e maiores envolveram cerca de cem armamentos, enquanto as restantes empregaram talvez mais 150, embora o número não esteja claro. Também foram lançados dezenas de drones.
Houve três mortes e ao menos 80 feridos. “Passei a noite no abrigo do prédio, as sirenes não paravam”, disse por mensagem Rafi Kummer, um analista de TI de Tel Aviv que na véspera parecia descrente de uma reação tão forte. “Pensei que tínhamos anulado eles no primeiro ataque, mas guerra é isso.”
“Se [o líder supremo iraniano, Ali] Khamenei continuar a disparar mísseis na frente doméstica em Israel, Teerã vai queimar”, disse em nota o ministro Katz, que faz parte da linha-dura do governo Netayahu.
Na mão inversa, o governo iraniano prometeu atacar quaisquer potências externas que impeçam sua retaliação, nominalmente os Estados Unidos, o Reino Unido e a França, que por ora apoiam Tel Aviv sem entrar na briga. Há relatos de que americanos auxiliaram a derrubar drones iranianos no mar Vermelho, sem confirmação oficial.
Dois membros da Guarda Revolucionária, principal unidade militar do país, morreram no bombardeio contra uma base no centro do país, de acordo com a agência de notícias Tasnim.
A crise começou na madrugada da sexta (13), quando Tel Aviv lançou um mega-ataque aéreo a 150 alvos no Irã, visando desabilitar o programa nuclear do país, para evitar que os aiatolás desenvolvam a bomba atômica.
Segundo as Forças de Defesa de Israel, duas centrais nucleares principais, em Natanz e Isfahan, foram bastante afetadas e levarão semanas para voltar a operar. Nove cientistas do programa atômico rival foram mortos em ataques de precisão.
Os militares negaram ter agido contra a central de Fordow, como havia dito a mídia estatal iraniana, mas a essa altura a guerra de desinformação mútua já segue a todo vapor.
A noite de terror nos dois países não parece ter data para acabar. Israel modificou sua diretriz de prioridades da guerra que trava contra os rivais regionais desde que o grupo terrorista Hamas, apoiado por Teerã, atacou o país em 7 de outubro de 2023.
O Irã foi adicionado como prioridade do conflito, que tem como frentes a Faixa de Gaza (contra o Hamas e outros grupos), a Cisjordânia (grupos palestinos), o sul do Líbano (Hezbollah, principal preposto do Irã) e o Iêmen (houthis, também apoiados por Teerã).
Desde a fundação da República Islâmica, em 1979, o Irã é adversário existencial de Israel, comprometido a obliterar o Estado judeu. Nunca teve condições militares para isso, contudo, e estabeleceu uma rede de aliados regionais, como o Hamas e, principalmente, o Hezbollah.
O programa nuclear de Teerã sempre foi a carta na manga dos aiatolás para forçar negociações contra as sanções que atingem o país há décadas. Em 2015, Estados Unidos e outras potências costuraram um acordo para trocar a pretensão iraniana de ter a bomba pelo fim das penalidades econômicas.
Durou até 2018, quando Donald Trump saiu do arranjo no primeiro mandato, denunciando-o como enxugamento de gelo por não retirar a capacidade técnica de Teerã de fazer a bomba. Nisso, estava certo: desde então os iranianos aceleraram a produção de material físsil, tendo o suficiente para estimadas seis ogivas.
O país persa anunciou que está pronto para fazer a bomba, mas a volta de Trump à Casa Branca recolocou negociações na mesa, com rodadas diretas entre EUA e Irã. Como o americano mobilizou forças no Oriente Médio e exigiu o fim total do programa iraniano, Teerã disse que não conversaria nesses termos.
A gota d’água foi a declaração da Agência Internacional de Energia Atômica na quinta (12) de que Teerã estava, pela primeira vez em 20 anos, totalmente em violação de seus compromissos de transparência sobre o que faz nas suas centrais nucleares. Em outras palavras, a bomba estava à mão.
Netanyahu atropelou Trump, com seu aval público ao menos, e foi a um ataque temido há semanas por seu impacto humanitário, geopolítico e econômico -o medo de disrupção no mercado de petróleo, centrado na região, já fez o preço da commodity disparar.
Neste sábado, um deputado iraniano, Esmail Kosari, disse que o fechamento do estreito de Hormuz, que liga o golfo Pérsico ao mundo, está sendo considerado. Com apenas 39 km de largura no trecho de maior proximidade do Irã e da península Arábica, a região é um gargalo do escoamento de mais de 30% do petróleo produzido no planeta.
Impopular em casa pela condução da guerra em Gaza e casos de corrupção, o premiê viu uma janela de oportunidade também. O Irã está frágil, com economia e tecido social esgarçados, e viu suas linhas de defesa regionais serem erodidas por Israel nos conflitos do pós-7 de Outubro, particularmente o Hezbollah.
Agora, como disse um diplomata ocidental em Tel Aviv na sexta, “é tudo ou nada”. Líderes mundiais têm se mobilizado para tentar de-escalar. Parece otimismo vazio, dada a movimentação militar em curso. A rodada de conversas entre EUA e Irã sobre o programa nuclear, no domingo (15), foi cancelada.
Neste sábado, o papa Leão 14 pediu acomodação. “Em um momento tão delicado, desejo renovar com firmeza um chamado à responsabilidade e à razão”, disse no Vaticano, embora a chance de palavras do líder católico de ecoarem em dois Estados norteados por religiões diversas pareça nula.