BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Anderson Torres, ministro da Justiça no governo Jair Bolsonaro, afirmou ao STF (Supremo Tribunal Federal) nesta terça-feira (10) que a minuta de teor golpista encontrada pela Polícia Federal foi parar em sua casa em decorrência de uma fatalidade.
Segundo ele, o texto era um dos papéis que recebeu na rotina no ministério, tinha conteúdo corrente na sociedade na época e deveria ir para o lixo.
“Nunca tratei isso com o presidente. A pasta foi organizada pela minha assessoria, foi parar na minha casa. Isso foi uma fatalidade que aconteceu, e era para ter sido destruído. O documento era inclusive muito mal escrito, cheio de erros de concordância, até o nome do tribunal estava escrito errado”, declarou.
Em janeiro de 2023, durante operação de busca e apreensão na casa do ex-ministro após os atos antidemocráticos que depredaram a sede dos três Poderes em Brasília, foi encontrada a minuta de um decreto para instaurar estado de defesa e reverter o resultado eleitoral.
O documento serviria a propósitos golpistas, para impedir a posse do presidente Lula (PT), que derrotou Bolsonaro nas eleições de 2022.
“Naquela época, era voz corrente na Esplanada. A gente recebia minutas, papéis, uma autoridade disse que recebeu três minutas como essa. E isso foi parar lá, eu levava pastinhas simples e foi colocado para ser descartado”, afirmou Torres.
“Não é a minuta do golpe. Brinco que é a minuta do Google, porque estava lá e está até hoje. Foi entregue no meu gabinete e eu levava duas pastas à minha residência, coisas gerais do ministério, nem me lembrava dessa minuta, vi quando foi apreendido. Foi uma surpresa”, disse.
Torres também era o secretário de Segurança Pública do governo Ibaneis Rocha (MDB) no Distrito Federal no início de 2023. Ele afirmou também que deixou um protocolo de ações integradas pronto e robusto, com fechamento da praça dos Três Poderes e uso de policiamento especial.
“Eu estava num parque da Disney. Eles [manifestantes do 8 de Janeiro] já tinham entrado no Congresso e no Palácio [do Planalto]. Eu disse ‘não deixe chegar ao Supremo’, mandei essa mensagem. Liguei ao governador, fiquei desesperado, do jeito que eu deixei as coisas em Brasília, é inimaginável que as coisas acontecessem como aconteceram. Aconteceu uma falha grave”, disse.
As declarações fazem parte da fase de interrogatórios da trama golpista.
A defesa de Torres foi a que mais elencou depoentes para a etapa anterior do processo, de oitiva de testemunhas.
A Primeira Turma do STF iniciou nesta segunda (9) a atual fase, de depoimentos dos réus. O tenente-coronel Mauro Cid falou primeiro, seguido do ex-chefe da Abin Alexandre Ramagem, de Almir Garnier (ex-chefe da Marinha), Torres e Augusto Heleno (ex-ministro do GSI). Em seguida, foram ouvidos Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e Walter Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e da Defesa).
Torres foi preso no início de 2023 por determinação de Moraes, em razão de possível omissão no 8 de Janeiro. Em 11 de maio, a prisão preventiva foi revogada.
Às vésperas daquela data, Torres viajou de férias para os Estados Unidos. Desembarcou na Flórida, para onde Bolsonaro havia viajado antes mesmo do término do mandato.
A situação do ex-secretário se complicou após uma busca autorizada por Moraes. Os investigadores encontraram na casa de Torres uma minuta de decreto para o então presidente instaurar estado de defesa na sede do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Versões da “minuta do golpe”, os documentos preparados para sacramentar a ruptura institucional e evitar a posse de Lula, foram encontradas na casa do ex-ministro, na sala em que Bolsonaro usa no PL, seu partido, e em dispositivo eletrônico de Mauro Cid, ex-chefe da ajudância de ordens de Bolsonaro e delator da trama.
O objetivo, segundo o texto, seria o de reverter o resultado da eleição. Tal medida seria inconstitucional. O documento de três páginas, feito em computador, foi encontrado em um armário.
Assim como os demais, ele é réu por tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito e de golpe de Estado, além de dano qualificado pela violência e grave ameaça contra patrimônio da União, deterioração de patrimônio tombado e participação em uma organização criminosa. Se condenados, as penas podem chegar a 43 anos de prisão.
No caso do ex-ministro, também pesam contra ele as blitze da PRF (Polícia Rodoviária Federal) nos estados do Nordeste para dificultar que eleitores conseguissem chegar aos locais de votação durante o segundo turno das últimas eleições presidenciais.
A favor da defesa, há o depoimento do ex-chefe da Aeronáutica Carlos de Almeida Baptista Júnior como testemunha do caso, em 21 de maio, que retificou as declarações prestadas à PF e disse não ter certeza da presença de Torres em reuniões com articulações golpistas.
MINUTAS APREENDIDAS
– Estado de defesa: Em janeiro de 2023 foi encontrada na residência do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, uma minuta prevendo a decretação de estado de defesa no TSE e a criação de uma Comissão de Regularidade Eleitoral para apurar a “conformidade e legalidade do processo eleitoral”
– Estado de sítio: Já em junho do mesmo ano, veio a público que a Polícia Federal também tinha encontrado um arquivo no celular de Cid que tratava da decretação de estado de sítio. Meses mais tarde, em fevereiro de 2024, documento de mesmo teor foi apreendido na sede do PL segundo Bolsonaro sua defesa tinha enviado a ele o arquivo encontrado com Cid para ele ficar a par da investigação