Quando olhamos para a diferença entre essas duas paisagens, podemos comprovar que os povos indígenas são os grandes defensores do território onde vivem. A foto de Manoela Meyer, do Instituto Socioambiental (ISA), traz uma Terra Indígena na região amazônica e uma área ocupada pelo agronegócio. Nesse caso, o abismo da relação com a terra nos dois casos fica claro.

terras indígenas
Divisa entre o Território Indígena do Xingu e o entorno mostra o contraste entre a floresta e a plantação. Foto: Manoela Meyer | ISA

Mas, uma outra comparação reforça ainda mais a posição dos povos originários como os grandes guardiões do meio ambiente. No Panamá, a taxa de cobertura florestal em terras indígenas permaneceu estável em quase o dobro da taxa de áreas protegidas, incluindo parques governamentais. Essa diferença vem, em grande parte, dos valores culturais e a conexão com a terra profundamente arraigados entre as populações indígenas.

As descobertas estão em um estudo liderado por pesquisadores da Universidade McGill. Os dados dados desafiam uma antiga suposição sobre conservação de que para proteger a biodiversidade, as pessoas devem ser mantidas fora dos territórios.

Em sua exploração de fatores culturais e padrões ecológicos, a equipe de pesquisa combinou uma análise de 20 anos de dados de satélite com sessões de mapeamento colaborativo com oito membros das comunidades Emberá do leste do Panamá.

proteção de terras indígenas
Foto: Camilo Alejo

“Imprimimos imagens de satélite e pedimos a homens e mulheres que apontassem as áreas que usam e valorizam”, disse o principal autor do estudo, Camilo Alejo , doutor em Biologia pela McGill, em um comunicado à imprensa. “Isso incluía locais onde cultivam, caçam ou se reúnem, e onde realizam cerimônias ou evitam por motivos espirituais”.

O mapeamento participativo mostrou que quando as áreas florestais eram consideradas cultural e espiritualmente significativas, elas tendiam a permanecer intactas. Além disso, o estudo  derruba a ideia de que a presença humana é incompatível com a preservação ambiental, mostrando que é possível estabelecer com a natureza uma relação de respeito e equilíbrio.

“Muitas comunidades indígenas integram agricultura, espiritualidade e conservação na forma como usam a terra”, explicou Alejo. “Nossas descobertas mostram que esse conjunto diversificado de valores se alinha com áreas onde as florestas permaneceram estáveis, sugerindo uma forte conexão entre práticas culturais e a gestão florestal de longo prazo.”

Locais sagrados, áreas com plantas medicinais e áreas tradicionais de coleta e caça foram espalhados pela floresta, apoiando o uso sustentável.

terras indígenas protegidas


“Nossos mapas sugerem que as florestas permanecem intactas não apenas por serem remotas, mas também pela forma como as pessoas as valorizam”, enfatizou Alejo. “Estas não são apenas florestas intocadas; mas sim constantemente cuidadas.”

O estudo chamou a atenção para uma questão política crucial: algumas comunidades indígenas, especialmente em áreas remotas como Darién Gap, não têm a posse formal de suas terras, embora sua administração tenha claramente preservado as florestas.

“Paradoxalmente, em muitos marcos legais, é preciso explorar a terra para reivindicar o título”, disse Alejo. “Isso incentiva o desmatamento, que prejudica exatamente os tipos de práticas que mantêm esses ecossistemas intactos.”

marco temporal
Foto: Reprodução | Apib

Com estes dados em mãos, os pesquisadores pedem reformas nas políticas de titularidade de terras em toda a América Latina para que a administração indígena seja reconhecida como uma forma legítima e comprovada de uso da terra.

Eles esperam que as descobertas levem a novas estruturas que combinem conservação, patrimônio cultural e segurança alimentar. “Este estudo mostra o quanto podemos aprender com as cosmovisões indígenas: visões de mundo holísticas que conectam natureza, cultura e bem-estar”, disse Alejo. “Há um potencial real para repensar a forma como administramos a terra, não apenas no Panamá, mas globalmente.”

“Ao entrelaçar escalas e perspectivas, nossos resultados ilustram que valores diversos em relação à natureza, moldados por visões de mundo indígenas, podem gerar estabilidade na cobertura florestal, contribuindo para a qualidade de vida dos povos indígenas, a mitigação das mudanças climáticas e a conservação da biodiversidade”, escreveram os autores das descobertas.

“Para alinhar essas contribuições às metas globais de clima e biodiversidade, é crucial desarticular a propriedade da terra do desmatamento, conceder títulos formais às terras indígenas e promover incentivos equitativos aos povos indígenas”, completam os pesquisadores.

O estudo “Diversos valores em relação à natureza estão relacionados a florestas estáveis: o caso das terras indígenas no Panamá” foi publicado na revista Ecology and Society. Para acessar o conteúdo completo, clique AQUI.

Com informações de EcoWatch e Universidade de McGill

Fonte: Ciclo Vivo