SÃO PAULO, SP E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Sim, o número de evangélicos cresceu menos do que o esperado. São 26,9% da população acima de dez anos, segundo a radiografia religiosa do povo brasileiro divulgada nesta sexta (6) pelo IBGE, com base no Censo 2022. Pastores reagiram a esse número ora pondo em xeque a metodologia na coleta de dados, ora relativizando a importância dele.
“Eu não fico preocupado com essa questão numérica de percentagem, se cresceu mais, se cresceu menos. Fico até rindo”, diz o pastor Silas Malafaia, um canhão midiático do segmento. “Tem um monte de coisa para ser questionada. Eu, com todo respeito, onde a esquerda mete a mão, tenho dúvida. Só para te dizer, eu não acredito em número desses caras.”
Os dados do Censo 2022 foram colhidos durante o governo Jair Bolsonaro (PL), e o resultado foi finalizado na atual gestão, de Lula (PT).
Malafaia diz na sequência não estar “preocupado com isso”, porque “a igreja está crescendo, estamos pregando o evangelho, certo?”.
Também afirma que quantidade nem sempre é qualidade. Evangélicos são, na média, bem mais engajados em sua comunidade de fé do que seus pares no cristianismo, segundo ele.
“Quando alguém diz que é evangélico, é que pelo menos uma vez por semana vai na igreja. É tão interessante isso que, se o cara estiver afastado da igreja, e tem muita gente afastada do evangelho, ele não diz que é evangélico, porque sabe que, para ser, tem que praticar, tem que estar membro de uma igreja.”
Já os católicos, diz o pastor, muitas vezes “não sabem nem os dogmas da sua religião, as leis que envolvem o cristianismo que eles dizem que creem”. São os tais católicos praticantes, que o IBGE não mede, mas que pesquisas apontam serem numerosos.
Para o apóstolo Estevam Hernandes, à frente da igreja Renascer em Cristo e da Marcha para Jesus, “o crescimento real é maior do que o levantamento feito”. Ele afirma que as projeções davam conta de uma expansão maior e, na sua impressão pessoal, sem amparo científico, essa população já é maior do que 35%. “Sentimos nas igrejas, e também há o reflexo da presença de evangélicos em todos os setores da sociedade.”
Hernandes diz suspeitar que os dados do Censo não são precisos, por terem sido coletados “no período pós-pandemia, e também pelo tempo da pesquisa”.
A metodologia nova, que excluiu da conta crianças menores de dez anos, também puxou para baixo a fatia da sua religião na estatística, afirma. “O povo evangélico tem média de idade bem abaixo dos católicos. Não atribuo a uma falha, mas acho que precisa fazer correção do método.”
Líder da igreja Fonte da Vida, César Augusto também questiona o Censo, que para ele pode ter sido manipulado. “O que a gente vê é um crescimento muito maior. Hoje, seguramente, os evangélicos são mais de 34% da população”, diz, também ele sem indicar uma fonte.
O espaço que esse bloco religioso tem na mídia, para Augusto, sinaliza seu tamanho agigantado no país. “Você vê como que estão se voltando para o público evangélico, cantores gravando músicas evangélicas, porque é um crescimento visível, e em todas as camadas da sociedade.”
Ele sugere que picuinhas ideológicas possam ter influenciado o resultado. “Querendo ou não, tem segmentos que se incomodam com nosso crescimento, especialmente o pessoal de esquerda. Cada dia tem uma igreja abrindo. Aluga-se um salão, põe 50, 100 cadeiras, um microfone, uma caixa de som, um violão. Daqui um mês está cheio. Então, como que pode ser só 26,9%?”
Ex-presidente da bancada evangélica, membro da igreja de Malafaia e líder do partido de Bolsonaro, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) diz que um número maior de crentes deve significar maior apoio ao conservadorismo na política.
“Evangélicos têm tendência a serem conservadores e de direita, na sua maioria. No segmento como um todo, 80% tendem a ser de direita, talvez uns 15% ainda se identifiquem com a pauta de esquerda, e 5% não têm preferência”, diz, sem especificar a fonte desses dados.
Sóstenes aposta que, em 2030, os evangélicos serão maioria no país. O demógrafo José Eustáquio Alves, que projetava esse cenário até 2032, já retirou o que disse após receber os dados do Censo 2022. O parlamentar, contudo, diz que católicos podem até ter vantagem numérica, mas é preciso levar em conta que muitos não praticam a fé que dizem ter.
Pastor da presbiteriana Comunidade da Vila, Victor Fontana vai por outro caminho, sem pôr sob suspeita a credibilidade do levantamento. Ele relaciona “esse arrefecimento do crescimento de evangélicos à aparente crise de credibilidade pela qual passam pastores e igrejas evangélicas”.
“Eu me refiro, por exemplo, à recente pesquisa da Atlas/Intel que mostra 73% dos participantes alegando desconfiança em relação às igrejas evangélicas. Motivos para isso? Eu diria que o número de escândalos financeiros e sexuais contribuem muito, além de uma ligação mal pensada com a política partidária.”