SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O forro do banheiro do apartamento de Suelen caiu, e a água que escorre danificou o espelho e a pia. Também provocou um curto-circuito no chuveiro, que obriga ela, o marido e os quatro filhos a tomarem banho frio.

A família é uma das beneficiadas do programa Aluguel Reencontro, da gestão Ricardo Nunes (MDB), gerido pela empresa Diagonal.

O condomínio, localizado no Itaim Paulista, na zona leste de São Paulo, tem três andares, com cinco apartamentos em cada um, e não tem elevador. Como Suelen, outros antigos moradores de abrigos da cidade foram levados para lá.

Eles apontam outros problemas no prédio, que foi inaugurado no ano passado, como obras que não foram concluídas e o mau cheiro em áreas comuns. E reclamam das dificuldades de resolver os problemas com a empresa ou a administradora.

Os problemas não estariam apenas na estrutura do prédio. Eles reclamam da falta de apoio para a aquisição mínima de móveis para os apartamentos. Na casa de Suelen, por exemplo, eles continuam dormindo no chão, em colchões que foram cedidos pela direção do abrigo.

A família está no apartamento há um mês, depois de morar por quatro anos nos abrigos municipais. Vizinha da família, Aline ainda dorme em um colchão no chão junto com o marido. Eles conseguiram uma cama para a filha, de três anos.

Eles chegaram a morar na rua quando Aline estava grávida da menina. “Mesmo quando ela era bebê, não foi fácil conseguir uma vaga em abrigo”, conta.

Mesmo morando no Itaim Paulista, outro vizinho, Guilherme, segue no EJA (Educação de Jovens e Adultos) no Cambuci. Ele vai de moto de manhã cedo e segue na região central, onde trabalha com entregas de moto por aplicativo. Ele chegou no prédio no início deste ano.

“A gente sofre com o preconceito aqui no prédio, às vezes de vizinhos que não foram albergados e mesmo da administradora”, diz. Segundo ele, as famílias convivem ainda com a ameaça do proprietário de rompimento do contrato, o que os levaria de volta para os abrigos e para o fim da fila de busca por novas vagas no programa.

A situação dos moradores já havia sido constatada pelo Fórum da Cidade de São Paulo em Defesa da População em Situação de Rua em uma visita no dia 20 de maio. Responsável pela visita, Alderon Costa diz ainda que moradores que eram usuários de álcool e drogas tiveram seus tratamentos interrompidos com a mudança de bairro.

A Secretaria Municipal de Saúde afirma que unidade de referência para os moradores é a Unidade Básica de Saúde (UBS) Jardim Romano Vila Itaim, “que conta com seis equipes de Estratégia Saúde da Família (ESF), equipe multiprofissional e odontologia”. E que “a gerência da unidade está à disposição para atender as necessidades das famílias”.

Em seu relatório, ele aponta também apartamentos infestados por mofo e cupins. O documento foi entregue no dia 22 para as secretarias municipais de Assistência Social e de Direitos Humanos e, segundo representantes do fórum, não houve resposta oficial.

O contrato da prefeitura com a Diagonal foi assinado no ano passado, de forma emergencial, pelo prazo de um ano. A empresa recebeu pouco mais de R$ 17 milhões. No início deste ano, o contrato foi prorrogado por mais seis meses, até junho.

Em nota, a Smads (Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social) afirma que “monitora e fiscaliza as condições dos imóveis destinados ao abrigamento de pessoas em situação de rua”. Segundo a prefeitura, a Diagonal faz “vistorias presenciais”.

Diz ainda que uma dessas inspeções, “agendada há vários dias”, foi feita no último dia 30, quando foi questionada pela Folha. “Na ocasião, o responsável pelo imóvel se comprometeu a realizar os reparos solicitados em até 14 dias”, diz.

Em nota, a Diagonal afirma que o contrato não será prorrogado e que a escolha dos imóveis se dá por “decisão do potencial beneficiário, que pode indicar um imóvel ou, se preferir, escolher entre as opções apresentadas pela Diagonal, que faz busca ativa no município”.

Segundo a empresa, sua equipe faz “a mediação e oferece suporte durante a busca, mas cabe ao beneficiário visitar e aprovar o imóvel”. Diz ainda que, durante o processo de acompanhamento e durante o processo de locação, “são realizadas visitas domiciliares, oficinas, treinamentos e parcerias com organizações com foco na inclusão social, comunitária e socioprodutiva”, para a transição da situação de rua.

A empresa diz ainda que faz “uma sensibilização junto aos responsáveis pelos imóveis sobre o projeto e o perfil do público atendido. Durante a locação, são promovidas oficinas participativas e momentos de escuta ativa com beneficiários, locadores e vizinhos (especialmente em condomínios), com o objetivo de mediar conflitos, orientar e sensibilizar sobre convivência, direitos e deveres”.