SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Erleyvaldo Bispo tinha cerca de 20 anos quando participou do Fórum Mundial da Água, em 2018. Nascido no agreste de Sergipe e cursando Engenharia Florestal na UFRRJ (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro), conhecia bem os obstáculos de acesso à água no Brasil.

Foi nesse evento que, ao compartilhar os desafios com um jovem haitiano, ele ouviu pela primeira vez a pergunta que o marcaria: “O que você está fazendo para mudar isso?”.

Hoje, aos 28 anos, é fundador e presidente do coletivo de jovens Águas Resilientes, e se prepara para discutir a conexão entre crise climática e acesso à água durante a COP30, conferência de clima da ONU (Organização das Nações Unidas) que será realizada em novembro, em Belém (PA).

Assim como ele, jovens de todo o país têm se reunido em coletivos para atuar em diferentes demandas do meio ambiente e veem a COP30 como oportunidade para reverberá-las.

Segundo o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima da ONU), crianças, adolescentes e jovens são mais vulneráveis à mudança climática, uma vez que vão viver por mais tempo com os impactos causados por ela.

Natalia Moraes, 26, indígena mapuá e diretora executiva da Cojovem (Cooperação da Juventude Amazônida para o Desenvolvimento Sustentável), ressalta que a mobilização dos coletivos de juventude ocorre junto com o processo de formação de suas identidades -especialmente quando passam a reconhecer a importância do território em que nasceram como parte de quem são.

Perceber como a Amazônia influencia na cultura que constrói sua identidade, diz, a fez reconhecer como a região precisava de ajuda. “Unimos a identidade à defesa”.

Para a COP30, a Cojovem pretende pressionar as autoridades a discutir sobre transição energética justa. A Amazônia Legal, explica Natalia, ainda tem diversas comunidades sem acesso regular à energia elétrica e é uma das principais áreas de exploração para a produção de energia do país, o que prejudica o ecossistema e os moradores.

O grupo integra a Aliança de Juventude por Governança Energética, que tem feito campanhas de conscientização contra a exploração de petróleo na foz do rio Amazonas.

Enquanto a COP30 não chega, a Cojovem forma jovens voluntários para participação na cúpula, lança um documentário sobre jovens ativistas climáticos e organiza uma cúpula de jovens líderes da amazônia, da qual resultará um documento com propostas para ser entregue a tomadores de decisão.

No evento oficial, vão acompanhar as negociações e participar de painéis da sociedade civil.

Como os jovens ainda não ocupam diretamente os espaços institucionais, os coletivos tentam sensibilizar e pressionar as autoridades responsáveis por eles.

Outra associação de jovens, a Avinc (A Vida no Cerrado) tem produzido desde o ano passado uma série de pesquisas chamada “Faça Chuva, Faça Sol, o meu Cerrado já está vulnerável”. Eles coletam dados e conversam com pessoas de diferentes territórios do cerrado para entender como a crise climática afeta suas vidas.

“A ideia é que esse grande documento final sirva para levarmos à conferência do clima”, diz Cayo Alcântara, 25, diretor-executivo da Avinc. O coletivo também organiza um encontro nacional de juventudes do cerrado, que deve acontecer em agosto com foco na atuação durante a COP30.

Durante a programação principal do evento, a Avinc pretende levar cinco jovens para a “green zone” -espaço onde acontecem eventos e atividades paralelos da sociedade civil, empresas e instituições de pesquisa. A área complementa a “blue zone”, onde ocorrem as negociações oficiais entre países.

A tentativa, diz Cayo, é fazer com que o bioma não seja negligenciado na discussão. “Por ser uma COP que está acontecendo na amazônia, os olhos do mundo estarão voltados para lá, e acaba que ecossistemas não florestais, como é o caso do cerrado, são deixados de escanteio”, diz o jovem ativista.

Para Erleyvaldo, o objetivo é fazer com que a questão da água também não fique de fora da discussão climática. No segundo semestre deste ano, o Águas Resilientes vai lançar uma campanha com o mote “Justiça pela Água é Justiça Climática”.

“A questão da seca no semiárido nordestino é reconhecida há muito tempo, de vários governos desde o Império, e precisamos de mais ações, mais investimentos e fundos específicos. A juventude vem com uma grande vontade de promover essa mudança e de fazer o que ainda não foi feito, porque ainda não se avançou na questão”, diz o jovem, que enfrentou falta de água e de saneamento básico na infância.

“Não colocando toda a responsabilidade nos jovens, porque a gente já está muito ansioso, mas, se a geração anterior não resolver, seremos nós que iremos”, diz o ativista.

Os coletivos falam sobre proteger passado, presente e futuro com suas ações. “Temos lutado de maneira coletiva pelos nossos e pelos que vieram antes, com toda a ancestralidade que temos, mas pensando em como conseguimos salvaguardar o futuro das gerações que vão vir depois”, diz Natalia.