BELÉM, PA (FOLHAPRESS) – O MPF (Ministério Público Federal) no Pará ingressou com uma ação na Justiça Federal, nesta terça-feira (3), em que pede a suspensão imediata e a anulação de um contrato de venda futura de créditos de carbono, firmado pelo governo paraense, no valor de R$ 1 bilhão.
Na ação civil pública, assinada por 20 procuradores, o MPF pede que o governo de Helder Barbalho (MDB) seja condenado a pagar danos morais coletivos no valor de R$ 200 milhões, por ter vendido receitas de ativos ambientais sem a devida consulta livre a comunidades tradicionais e por ter estabelecido uma cláusula contratual de ressarcimento a uma instituição intermediária do negócio.
Os alvos da ação são o estado do Pará e a Companhia de Ativos Ambientais e Participações do Pará, vinculada ao governo local.
A União também foi citada na ação civil pública, para que se abstenha de conceder carta de autorização para que o governo do Pará busque uma certificadora internacional, de forma a validar os créditos de carbono.
Segundo o MPF, o contrato se configura venda antecipada dos créditos, o que é proibido pela lei que passou a regulamentar o mercado de carbono no país, conforme os procuradores.
Enquanto não houver adequação à legislação, o estado do Pará deve ser impedido de receber pagamentos por créditos de carbono, pede a ação.
Os procuradores afirmam que o governo de Barbalho tenta aprovar esse sistema de créditos antes da COP30 (conferência das Nações Unidas sobre mudanças climáticas), “o que tem gerado considerável pressão sobre povos indígenas e comunidades tradicionais no Pará, com o intuito de uma célere aprovação do referido sistema”. Belém sediará a COP30 em novembro.
A reportagem questionou o governo do Pará sobre a ação civil pública e aguarda uma resposta.
O governo do Pará já afirmou que o contrato é um pré-acordo com condições comerciais futuras, sem transações efetivas ou obrigação de compra antes da verificação da redução de emissões. “Está dentro da legalidade. A venda só será concluída caso os créditos sejam devidamente emitidos após a verificação dos resultados”, disse.
Não há possibilidade de revenda dos créditos, e o sistema jurisdicional é elaborado com transparência, afirmou. “Em breve serão iniciadas as consultas prévias, livres e informadas junto a comunidades indígenas, quilombolas e extrativistas sobre o sistema.”
Em abril, o MPF recomendou ao governador Barbalho a imediata anulação do contrato. A gestão dele contestou a recomendação no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), que anulou os efeitos das sugestões feitas.
Essa anulação da recomendação ocorreu a partir de um gesto do procurador-geral de Justiça do Pará, Alexandre Tourinho, junto ao CNMP. Ele defendeu a derrubada da recomendação, na direção oposta do que o próprio Ministério Público estadual havia solicitado.
A Promotoria do Pará assinou a recomendação com o MPF. O procurador-geral, que é o chefe do Ministério Público estadual, apontou insegurança jurídica e defendeu a derrubada da recomendação, na contramão dos próprios promotores da instituição.
Uma tentativa de conciliação foi buscada em reunião no CNMP nesta terça, sem êxito, segundo o MPF.
O acordo dos créditos de carbono foi feito com uma entidade chamada Coalizão Leaf e anunciado pelo governador em setembro de 2024.
O anúncio do contrato foi feito pelo governo local como um ato relacionado à preparação para a COP30. O mecanismo de créditos de carbono foi discutido e aprimorado no âmbito dessas conferências.
Pelo acordo anunciado por Barbalho, o acordo com a Coalizão Leaf garante a venda antecipada de R$ 1 bilhão em créditos de carbono, gerados por um ente jurisdicional, em que o próprio estado assume a dianteira na formulação e venda desses títulos. Estados amazônicos como Pará, Amazonas e Acre têm projetos nesse sentido, inclusive com intenção de venda direta dos créditos.
O acordo envolve a venda de 12 milhões de créditos de carbono a um preço de US$ 15 por tonelada. Um crédito equivale a uma tonelada de CO2 que deixa de ser emitida para a atmosfera em razão do desmatamento da floresta que é evitado.
O Pará geraria esses créditos a partir da preservação de áreas de floresta. Comunidades tradicionais, principalmente indígenas, quilombolas e de ribeirinhos, protestam contra o acordo costurado por Barbalho.
O contrato foi assinado entre o estado do Pará -por meio da Companhia de Ativos Ambientais e Participações do Pará- e a Emergent Forest Finance Accelerator -apontada como coordenadora administrativa da Colização Leaf, como consta na recomendação do MPF.
Compõem a Leaf os governos dos Estados Unidos, Reino Unido, Noruega, Coreia do Sul e grandes empresas interacionais, como Amazon, Bayer, BCG, Capgemini, H&M Group e Walmart, segundo a recomendação expedida.
As empresas se comprometeram a comprar 5 milhões de créditos de carbono, e o restante seria vendido a outros empreendimentos, como forma de compensação das emissões de CO2 por essas empresas, segundo anunciado pelo governo do Pará em setembro.