LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) – A vitória de Karol Nawrocki nas eleições presidenciais polonesas terá consequências na qualidade da democracia no país e em seu papel na geopolítica europeia. Esta é a avaliação do cientista político polonês Piotr Zagorski, pesquisador do Centro de Estudos Políticos e Constitucionais de Madri e especialista em direita radical europeia.
“O papel de Nawrocki será de obstrução de iniciativas para recuperar o Estado de Direito no país”, diz Zagorski. A Polônia vive uma situação política complexa. Entre 2015 e 2023 o país foi governado pelo partido de ultradireita Lei e Justiça (PiS), que investiu pesadamente contra o sistema jurídico e a liberdade de imprensa. “O co-fundador do Lei e Justiça, Jaroslaw Kaczinski, nunca escondeu que sua ideia era que Varsóvia se parecesse com a Budapeste de Viktor Orbán”, afirma Zagorski, referindo-se ao premiê que dilapidou a democracia húngara.
Em 2023 essa situação se alterou com a eleição de Donald Tusk, moderado e europeísta, ao cargo de premiê, apoiado por uma coligação de partidos liberais à direita e à esquerda. Tusk, no entanto, teve que conviver com o presidente Andrzej Duda, do Lei e Justiça, que usava seu poder de veto para manter as leis autoritárias do governo anterior. No semipresidencialismo polonês é o primeiro-ministro quem governa — mas o presidente, além do poder de veto, tem atribuições nas áreas militar e de política externa.
Tusk fez campanha para que um aliado, Rafal Trzaskowski, substituísse Duda na cadeira presidencial. Acabou derrotado por Nawrocki, um candidato independente apoiado pelo Lei e Justiça. “Nawrocki foi bastante eficiente em seduzir um eleitor ainda mais à direita do que os apoiadores do Lei e Justiça”, diz Zagorski.
Segundo o cientista político, 30% dos votos do novo presidente vieram dessa ultra-ultradireita. Durante a campanha, Nawrocki posicionou-se contra a entrada da Ucrânia na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), além de propor limites ao acolhimento de refugiados ucranianos. Zagorski considera que a atitude se deu por pragmatismo eleitoral e não um apoio à Rússia de Vladimir Putin, inimiga histórica da Polônia.
Às vésperas da eleição, Nawrocki recebeu dois endossos importantes. O premiê húngaro Viktor Orbán, maior aliado de Putin no leste europeu, apoiou sua candidatura. E Kristi Noem, secretária de Segurança Interna do governo Donald Trump, fez um discurso em seu favor durante uma reunião da Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC) em Jasionka, na Polônia.
Para Zagorski, é possível que Nawronski, um crítico veemente da União Europeia, busque uma aproximação com Trump. “Pode tentar fazer um acordo econômico que certamente será bom para os Estados Unidos, mas não necessariamente para os poloneses”, diz o cientista político.
Nos últimos anos a Polônia tem tido um surto de crescimento econômico, em parte turbinado pelos esforços de Tusk para melhorar a segurança jurídica no país. Fundos europeus irrigam a área de infraestrutura, e várias multinacionais transferiram para a Polônia operações relacionadas com tecnologia digital, motivadas pela abundância de profissionais qualificados com salários competitivos. Enfraquecer os laços com a União Europeia pode quebrar esse círculo virtuoso.