BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente Lula (PT) fez acenos ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), diante do impasse sobre mudanças no IOF, criticou o governo Donald Trump em meio ao embate dos EUA com o ministro do STF Alexandre de Moraes e defendeu a eleição de senadores da esquerda em 2026 para combater o que chamou de “muvuca” da extrema direita.

O petista participou neste domingo (1º) da convenção que oficializou o prefeito do Recife, João Campos, na presidência nacional do PSB, e também disse que, se estiver “bonitão do jeito que estou, a extrema direita não volta a governar esse país”.

Os acenos a Motta, que também esteve no evento, ocorreram frente às negociações do governo com a Câmara devido às novas regras do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras).

“Eu considero você uma novidade na política brasileira. Independente do partido que você pertence, teu comportamento e tua eleição como presidente da Câmara é demonstração que, dentre tantas coisas ruins que vivemos, começam a acontecer coisas boas”, disse Lula a Motta.

O presidente afirmou que o governo “tem de aprender que, quando quiser ter uma decisão que seja unânime entre todos os partidos, o correto não é a gente tomar uma decisão e depois comunicar”. Ele acrescentou que as lideranças partidárias no Congresso podem ajudar a corrigir as medidas que o Executivo quer aprovar.

O presidente também saiu em defesa de Moraes, que pode ser alvo de sanções do governo Trump. “Os EUA querem processar o Alexandre de Moraes porque ele quer prender um cara brasileiro que está lá nos EUA fazendo coisa contra o Brasil o dia inteiro”, afirmou.

“Que história é essa de criticar a Justiça brasileira? Eu nunca critiquei a Justiça deles e eles fazem um monte de barbaridade”, completou.

Por meio do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, a administração Trump afirmou ao ministro do Supremo Tribunal Federal que quatro ordens proferidas pelo magistrado contra a rede Rumble não têm efeito em solo americano. Para que elas pudessem valer, disse o órgão, o magistrado precisaria ter ingressado com uma ação em um tribunal dos EUA ou ter recorrido a canais legais.

A informação consta de documento encaminhado a Moraes na semana passada, com cópia ao Ministério da Justiça do governo Lula, ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso. A notícia sobre a carta foi revelada pelo jornal The New York Times.

A revelação aconteceu após a decisão do governo Trump de suspender vistos a quem a gestão considerar que censurou empresas e cidadãos americanos. Bolsonaristas e até alvos de determinações de Moraes dizem acreditar que ele seria afetado pela iniciativa.

MAIORIA NO SENADO

Lula também falou sobre as eleições de 2026. De acordo com ele, os partidos de esquerda precisam eleger mais senadores “porque se esses caras [de extrema direita] elegerem maioria de senadores, eles vão fazer uma muvuca nesse país”.

“Precisamos ganhar maioria no Senado, senão esses caras vão avacalhar a Suprema Corte. Não é porque a Suprema Corte é uma maçã doce. Não. É porque precisamos preservar as instituições que garantem o exercício da democracia nesse país. Se a gente for destruir o que a gente não gosta, não vai sobrar nada”, afirmou.

“Podem ter certeza de uma coisa: se eu estiver bonitão do jeito que estou, apaixonado do jeito que estou e motivado do jeito que estou, a extrema direita não volta a governar esse país”, disse ele.

O presidente destacou ainda sua relação com o PSB: “Nós sempre governamos juntos. Nunca tive problema com o PSB em lugar nenhum, mesmo quando divergia. Quando acabava a eleição a gente encontrava jeito”, declarou.

Lula citou sua relação com o pai de João Campos, o ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos, que morreu em um acidente de avião em 2014 quando era candidato à Presidência.

Eduardo Campos foi ministro de Ciência e Tecnologia no primeiro mandato de Lula. “Muito ministro petista tinha ciúmes da nossa relação”, disse.

Sobre as eleições do próximo ano, João Campos defendeu manter a dobradinha de Lula e o vice, Geraldo Alckmin (PSB).

O novo presidente do PSB também afirmou que pretende definir eventuais federações até outubro deste ano, para que haja tempo suficiente para organizar o próximo pleito.

Em entrevista à Folha de S.Paulo, Campos defendeu que o ideal para a esquerda na eleição em 2026 é trazer o centro para perto, e não jogá-lo para a direita.

Alckmin também discursou no evento: “Se perdendo a eleição, [a gestão anterior] tentou um golpe, imagina se tivessem ganhado”, declarou.

O presidente da Câmara, Hugo Motta, por sua vez, destacou a gestão de Campos à frente da Prefeitura do Recife. “A brilhante gestão que você realiza na prefeitura demonstra o quanto o PSB pode, deve e vai contribuir não só com a política em Pernambuco, mas nacional.”

Como mostrou a Folha de S.Paulo, a formalização da troca de comando PSB ocorre em um cenário de dificuldade de renovação na esquerda.

Campos integra família que atua na política há mais de 70 anos, desde a década de 1940. É filho do ex-governador e ex-presidenciável Eduardo Campos, morto em 2014 em um acidente aéreo, e bisneto do ex-governador Miguel Arraes, um das figuras históricas da esquerda, morto em 2005.

A dificuldade da ascensão de novos quadros e a questão do “familismo” na política perpassa todos os campos políticos, mas os números no Congresso e a lista de cotados para herdar os capitais políticos de Lula e de Jair Bolsonaro (PL) indicam haver, neste momento, uma dificuldade maior na esquerda.