PEQUIM, CHINA (FOLHAPRESS) – John D. Liu, 72, nascido em Nashville, Tennessee, nos Estados Unidos, se mudou em 1979 para a China, terra de seus antepassados por parte de pai. “46 anos atrás!”, soma, aparentando não acreditar.
Ajudou a montar a sucursal da rede CBS em Pequim e, em 1986, foi o câmera de uma histórica entrevista no programa 60 Minutes com o líder Deng Xiaoping, que havia subido ao poder em 1978.
Conheceu e admirou o país de Deng, pós-Revolução Cultural, com distribuição de terras e industrialização. Mas deixou tudo para trás, a começar pelo jornalismo, quando foi pautado para um documentário sobre o platô Loess, no centro da China, nos anos 1990.
É o mesmo fenômeno que impressionou a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, em visita ao país neste mês.
“É um reflorestamento numa escala inimaginável”, falou ela, sobre a China, em meio a encontros com seu colega em Pequim e outros. “Hoje eles têm 25% do território com floresta, mas já chegaram a ter apenas 8%.”
Foi o que mudou Liu, antes desesperançoso. Ele diz ter visto no platô que era possível obter resultados concretos, no caso, pela ação de toda uma população local.
“Eu vinha cobrindo política, economia, cultura como jornalista por 17 anos e fiquei obcecado por aquilo, porque pude ver que era diferente”, diz. “Acho que a maneira moderna de dizer isso é: eu caí na toca do coelho.”
Descreve, com alguma ironia, que de câmera ele se tornou acadêmico, “falei centenas de vezes ao redor do mundo, escrevi livros, fiz dúzias de filmes”.
Alguns deles podem ser encontrados nas plataformas de vídeo, inclusive aquele inspirado mais diretamente pelo platô, “Hope in a Changing Climate”, esperança em um clima em mudança, que passou na BBC –e mostra acreditar em saída não só para a China, mas para a África.
Posteriormente, numa nova versão, “Green Gold, or Regreening the Desert”, ouro verde, ou reflorestando o deserto, ele acrescentou a Jordânia, no Oriente Médio.
Liu se tornou, sobretudo, um ativista nos círculos ambientalistas de Pequim. Estava na apresentação de um documentário sobre rios ao redor do mundo, de documentaristas irlandeses, em sessão privada numa vila colada à capital.
Sobre o platô, conta que a virada teria vindo após enchentes de grande proporção, que levaram a estudos para mudar o quadro, com a recomendação final de reflorestar o país inteiro. “Era preciso restaurar a biomassa, a biodiversidade o mais próximo possível da evolução original.”
Por décadas, com a extensão da estratégia nacionalmente, “de repente você percebe: oh, estamos numa outra época no tempo civilizacional”.
O combate à desertificação na China começa, em princípio, nos anos 1950 com a criação do Ministério das Florestas e da Recuperação e com estudos e intervenções em regiões como o norte do país e a área central do rio Amarelo.
No fim dos anos 1970, é lançado o programa de reflorestamento, tendo o platô Loess como uma das primeiras regiões com intervenção em larga escala, concentrada no controle da erosão do solo e da areia. Alguns experimentos bem-sucedidos, como os terraços para agricultura e as barragens, são usados noutras partes do país.
Liu compara negativamente o Brasil com a China. “Enquanto o seu país está destruindo grandes áreas de sua verdadeira riqueza, a China está revertendo essas tendências, restaurando a função hidrológica e os solos. É uma tarefa enorme.”
Questionado se vai à COP30 em Belém do Pará, em novembro, diz ainda não ter se decidido. “Eu nunca sei se as COPs estão realmente dando resultado.”
Reconhece não ter compreensão plena de como, no platô, a ação da população deu tanto resultado. “Eles transformaram a situação de zero umidade relativa e zero vegetação, um deserto com areia e solo exposto, para um ecossistema funcional e diverso com riachos.”
Por fim, convida: “eu não tenho como explicar, você tem que olhar para aquilo. Vá em frente, vá para lá”.