PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – Reflexões acerca da solidão e sobre como a nossa existência é determinada pelo olhar do outro nortearam a conversa de uma das mesas do Festival Fronteiras neste sábado pela manhã, que contou com os psicanalistas Christian Dunker e Ana Suy.

No evento em Porto Alegre, Dunker e Suy —mediados pelo também psicanalista Felipe Pimentel—, conversaram a partir da pergunta que dá título ao livro que a dupla acaba de lançar, “Eu Só Existo no Olhar do Outro?”, pela editora Planeta.

Pimentel citou um experimento em que um bebê recém-nascido teria sido deixado numa espécie de clausura na qual seria suprido de alimento e proteção contra o frio, porém ninguém falaria com ele. Como resultado, a criança teria morrido.

O ponto era destacar o desamparo primordial do ser humano, e que nós só existimos a partir do momento em que o outro reconhece, simbolicamente, a nossa existência.

“É preciso que alguém se sinta convocado psiquicamente a afastar esse bebê da morte. O contato com o recém nascido é muito angustiante, justamente porque você está muito próximo da vida e da morte ao mesmo tempo”, afirmou Suy, em resposta à provocação do mediador. “Nomear [um bebê] é incluir simbolicamente, é fazer existir no olhar.”

Dunker acrescentou que “a gente se apreende no olhar do outro, se localiza”. “O olhar convoca a gente para uma estrutura de conversas e diálogos. A solidão sentida como privação do olhar do outro é a morte.”

A conversa, no Simões Lopes Neto, teatro situado dentro de um complexo de palcos no centro da capital gaúcha, engajou a plateia, que ficou atenta e aplaudiu algumas vezes o diálogo recheado de referências a conceitos de Freud, Lacan e Winnicott.

Outra questão proposta pelo mediador foi a solidão no mundo contemporâneo, o quanto as pessoas estão se conectando agora. Suy disse que há uma epidemia de solidão e fez referência aos ministérios da solidão sendo criados —como no Japão e no Reino Unido— , “o que demonstra o quão fake é esta ideia de conectado que a gente tem a partir das redes”.

Neste contexto, Suy falou também de como estamos “dialogando mal” uns com os outros, “fechados em nossas bolhas algorítmicas”, justamente num momento da história em que a gente tem muitas possibilidades de conversas e de diálogos.

Para Dunker, o antídoto para o nosso momento é o de estabelecer diálogos que não rompam, mas que criem relações. “O diálogo é um desafio, é raro que a gente tenha diálogos que sejam verdadeiros debates, que envolvem dentro da polidez e da amizade que a gente nutre a diferença produtiva. Se você deixar as pessoas ao léu falando entre si vai dar Facebook e Instagram, vai dar ruim.”