SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Autor de romances como “O Pai da Menina Morta”, Tiago Ferro se volta agora a compilar seus ensaios com o novo “Prisão Perpétua e Outros Escritos”.

A coletânea, lançada pela editora Boitempo, reúne 27 textos escritos entre 2016 e 2024 e propõe uma reflexão sobre o colapso político e simbólico do mundo contemporâneo.

A obra organiza essa análise a partir de três eixos principais: a experiência acadêmica do autor nos Estados Unidos, a crise democrática no Brasil após 2016 e uma leitura crítica da obra ficcional de Chico Buarque.

Entre os temas abordados, destacam-se o fortalecimento da extrema direita, a massificação de violência e a precarização do trabalho, além de reflexões sobre grandes nomes da cultura como Bob Dylan e Millôr Fernandes.

Grande parte dos textos foi publicada originalmente em veículos como a Folha, entre resenhas críticas e artigos de opinião.

Diferentemente de obras de analistas que buscam soluções para os impasses do presente, Ferro propõe um “diagnóstico em aberto”. Para ele, a função do escritor não é apresentar saídas, mas abrir perguntas.

“Soluções prontas soam como apontar para o futuro atrasando o relógio”, diz o autor em entrevista por telefone, ecoando uma das ideias centrais da obra.

A primeira parte do livro é marcada pela experiência de Ferro como pesquisador na Universidade Princeton, nos Estados Unidos. A passagem permitiu não somente uma imersão na cultura americana, mas também um mergulho na obra do argentino Ricardo Piglia, que foi professor de literatura na mesma universidade. Nesse espelhamento, Ferro busca repensar o papel do intelectual sul-americano como crítico da cultura e da história.

A segunda parte acompanha o desmoronamento da política institucional brasileira após o impeachment da presidente Dilma Rousseff. A ascensão de Jair Bolsonaro e o colapso social durante a pandemia são lidos por Ferro como parte de um processo mais amplo de esvaziamento democrático —que, segundo ele, não começou com Trump ou com o bolsonarismo.

O autor levanta questões sobre a pergunta “como as democracias morrem?”, que se popularizou após o best-seller homônimo da dupla Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, lançado em 2018.

Segundo Ferro, a resposta é anterior à obra de Levistky e Ziblatt: a democracia no Ocidente já vinha morrendo pelo menos desde os ataques de 11 de setembro de 2001. Donald Trump, Bolsonaro e outros líderes autoritários seriam, em sua visão, consequências e não causas.

A terceira e última parte do livro analisa os romances de Chico Buarque, que Ferro aponta como dispositivos sensíveis de registro histórico. Em vez de um comentário acadêmico convencional, o autor tenta capturar como a literatura de Chico consegue dar forma à experiência coletiva brasileira, especialmente em momentos considerados violentos.

Ao reunir os textos, Ferro também buscou uma nova forma de intervenção. Se seus romances lidavam com a história de forma mais subjetiva, nesta coletânea o gesto é outro. “Quis intervir de forma mais direta”, diz ele, refletindo sobre a escolha de abandonar a ficção —ao menos temporariamente— em nome de uma crítica mais assertiva.

Para o autor, escrever pode ser uma tentativa de escapar daquilo que chama de “prisão perpétua”, como indicado no título do livro: a repetição cíclica de erros históricos e a ilusão de que basta escolher um novo caminho para consertar o mundo. “Analisar a catástrofe contemporânea pode nos mostrar algum caminho.”

Crítico da crença em respostas fáceis, Ferro vê com ceticismo, por exemplo, o retorno do discurso desenvolvimentista. “Acreditar nessa solução, no caso do Brasil, é um equívoco histórico”, afirma.

“Prisão Perpétua e Outros Escritos” é, acima de tudo, um convite à leitura crítica —do passado, do presente e da linguagem que usamos para dar conta de tudo isso.

PRISÃO PERPÉTUA E OUTROS ESCRITOS

– Preço R$ 69,00 (208 págs.), R$ 56,52 (ebook)

– Autoria Tiago Ferro

– Editora Boitempo