BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, e o primeiro-ministro da Alemanha, Friedrich Merz, anunciaram nesta quarta-feira (28), em Berlim, um acordo de investimento que permitirá à Ucrânia construir os próprios mísseis de longo alcance, armamento com capacidade de alterar profundamente a dinâmica da guerra contra a Rússia. A propalada entrega de 150 mísseis Taurus, no entanto, não foi confirmada nem negada.

Em entrevista conjunta, os dois líderes não deram detalhes de como a tecnologia será transferida. Indagado especificamente sobre a entrega do Taurus, que era um item de sua campanha eleitoral no início do ano, Merz declarou apenas que o objetivo “é permitir a produção conjunta”. “Não divulgaremos detalhes publicamente”, acrescentou.

O Kremlin reagiu ao anúncio, dizendo que era “uma atitude muito irresponsável da Alemanha”. “Nada além de mais uma provação de guerra.” Pouco depois, o ministro da Defesa alemão, Boris Pistorius, anunciava mais € 5 bilhões (R$ 35,9 bilhões) em ajudar militar à Ucrânia, devido à “maciça destruição da infraestrutura civil” promovida pela Rússia.

Serguei Lavrov, chanceler russo, também fez críticas à Alemanha. Em Moscou, afirmou que a fala de Merz sobre a liberação de armas de maior alcance sugere que a decisão já havia sido tomada há tempos. Disse também que o envolvimento da Alemanha na guerra já estava evidente e que esperava uma atitude de outros políticos do país para “interromper a loucura”.

Anunciou ainda, em comunicado, proposta de fazer o segundo encontro sobre cessar-fogo na segunda-feira (2), em Istambul. Não citou Berlim, mas escreveu que todos realmente interessados em um acordo de paz, “não apenas em palavras”, deveriam apoiar a iniciativa.

No cenário doméstico, a maior pressão contra Merz, sobretudo de integrantes da oposição, era pela liberação dos mísseis Taurus. Além do oportunismo político de constranger o premiê, há um sentimento no país, não diferente do que ocorre na Europa e nos EUA, de que Vladimir Putin não está interessado em um acordo de paz.

“Quem disser que não estamos fazendo esforço diplomático não acompanhou o que aconteceu nas últimas três semanas”, declarou Merz, que não poupou críticas ao líder russo. “O que aconteceu no fim de semana comprova que não há um discurso de paz, mas um discurso agressivo de guerra.”

Na madrugada de domingo (25), Putin promoveu o maior bombardeio registrado até aqui no conflito, com 367 drones e mísseis empregados, matando 12 pessoas. Após dizer a repórteres que “não estava feliz” e que não sabia o “que diabos aconteceu com ele”, o presidente americano Donald Trump declarou que o presidente russo estava “completamente louco”. Nesta quarta, insinuou que está sendo enrolado por ele.

Merz afirmou que negocia com os EUA novas sanções contra a Rússia. O assunto seria discutido ainda nesta quarta por seu ministro de Relações Exteriores, Johann Wadephul, que se encontraria em Washington com o secretário de Estado, Marco Rubio.

O antecessor de Merz, Olaf Scholz, sempre se recusou a entregar os Taurus, temendo justamente uma escalada porque eles dariam capacidade para os ucranianos tentarem atingir até Moscou —caso fosse entregue a versão com maior alcance do míssil, de 500 km, enquanto o modelo básico atinge alvos a 150 km.

Merz, por sua vez, abriu a semana dizendo que não há mais motivos para a Europa limitar o alcance do arsenal na mão dos ucranianos, dando a entender que o fornecimento dos mísseis era questão de tempo. Se a dúvida permanece, o premiê fez questão de reiterar que o novo armamento, a ser desenvolvido por Kiev, não terá limite de alcance. “Manteremos nosso apoio militar e o expandiremos”, disse.

Esse foi o terceiro encontro do primeiro-ministro, que ainda não completou um mês no cargo, com Zelenski em um espaço de poucos dias. Merz, de acordo com suas próprias palavras, quer devolver a Alemanha ao papel de protagonista na política europeia e internacional. A estratégia se explica também pelo espaço criado nas negociações provocado pela atuação vacilante de Trump em relação a Putin.

As honras militares dedicadas ao presidente ucraniano em Berlim contrastam com o episódio de animosidade no salão oval da Casa Branca, em fevereiro, e com as postagens de Trump em sua rede social.

Tanto cuidado com a presença de Zelenski provocou transtornos para a população de Berlim, já que o visitante mereceu o nível mais elevado dos protocolos de segurança do país. Várias vias do centro da capital alemã foram interditadas, assim como estações de metrô e trem. Ao menos 2.400 agentes foram mobilizados na operação, meticulosa a ponto de bloquear até bueiros de rua.

Além de Merz, Zelenski se encontrou com o presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, e líderes de grandes empresas do país, como Siemens, Bayer e Henkel, para conversas sobre a reconstrução do país. Ele também voltou a fazer um alerta contra a nova ofensiva de Putin no nordeste da Ucrânia. Segundo ele, a Rússia concentrou mais de 50 mil soldados na região de Kursk, o que incluiria “as mais fortes” unidades militares de Moscou.