SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Wilco priorizou sua fase mais clássica na escolha do repertório e fez um show hipnotizante que lavou a alma dos fãs no C6 Fest. A banda foi uma das atrações do domingo (25), último dia do festival, que começou na quinta-feira (22) no parque Ibirapuera, em São Paulo.
Era notável a concentração de admiradores do grupo americano de Chicago na tenda Metlife, o palco secundário do evento, à espera do show. O Wilco começou a tocar por volta de 18h30, celebrado aos berros pelos milhares de presentes no espaço.
Em sua terceira passagem pelo Brasil, a banda não toca no país para multidões, mas seu grupo de fãs se mostrou apaixonado como poucos. Lembrou o que aconteceu no ano passado com o Pavement, outro grupo americano de rock que despontou nos anos 1990 e causou comoção parecida no mesmo palco do C6 Fest.
Com uma sonoridade que oscila entre o rock alternativo e experimental e o folk e country de violões, o Wilco mostrou que continua uma banda cheia de dinâmicas afiadas no palco. Os seis integrantes do grupo construíram uma massa sonora ao mesmo tempo robusta e delicada, alternando a intensidade com que tocaram às vezes em uma mesma música.
Isso ficou mais claro em “Via Chicago”, em que uma canção sentimental sustentada ao violão é sobreposta por uma cacofonia de sons produzidos pelo resto da banda, sem que isso interrompa a melodia principal.
Até para quem não é conhecedor do vasto repertório do Wilco são 13 discos de estúdio desde que a banda surgiu, em 1994 o show teve apelo aos ouvidos. Mais do que no talento individual dos músicos, o poder hipnotizante do grupo ao vivo pôde ser notado dos detalhes, quando cada músico contribuiu com um ingrediente no caldo grosso e encorpado que é o Wilco em cima do palco.
Se destacou o guitarrista Nels Cline, que usou sua técnica habitual mais para costurar emoções do que para se exibir com o instrumento em mãos. Como já tinha sido nos últimos shows do Wilco em São Paulo, em 2016, a plateia vibrou e cantou junto com a guitarra no solo de “Impossible Germany”, um dos momentos mais intensos da apresentação.
Também chamou atenção o magnetismo de Jeff Tweedy, vocalista econômico, mas que transmitiu as doses de angústia e introspecção que marcam suas letras e fazem dele um dos mais habilidosos compositores do rock nas últimas décadas. Ainda arrancou aplausos e gritos do nome da banda depois de uma troca de solos entre ele em Cline em “At Least That’s You Said”.
Do último show no país até hoje, o Wilco lançou três álbuns, mas limitou a produção mais recente a apenas três músicas ”Bird Without a Tail / Base of My Skull”, com uma jam no estilo Greatful Dead, “Evicted”, que evoca o Wilco mais clássico, e “Anihilation”, a mais recente delas, do EP “Hot Sun Cold Shroud”, do ano passado.
O Wilco tocou a faixa mais nova logo depois de “Box Full of Letters”, do primeiro álbum, “A.M.”, de 1995, e uma das mais queridas pelos fãs. “É para mostrar como crescemos”, disse Tweedy. “É brincadeira, não crescemos nada.”
O grosso do repertório foi dedicado à sua fase mais conhecida, do fim dos anos 1990 até a primeira década deste século. Soaram especialmente catárticos sucessos como “Jesus, Etc.”, “I Am Trying to Break Your Heart” e “Heavy Metal Drummer”, estas do disco “Yankee Hotel Foxtrot”, de 2004, o mais famoso da banda.
Mas a plateia também cantou e vibrou junto em diversas performances, como “Handshake Drugs”, “Either Way”, “I’m the Man Who Loves You” e “Hummingbird”. Os fãs fizeram coro nos solos e riffs de todas essas músicas, assim como na derradeira, “Spider (Kidsmoke)”.
Depois de notar a participação da plateia em “Hummingbird”, Tweedy disse que não sabe por que o Wilco não fica de vez no Brasil. “É uma pergunta que me faço. Por que não ficamos aqui? Por que vamos embora?”, brincou.
Ao fim da apresentação, por volta de 20h, ficou de que a banda fez um dos melhores shows da programação do C6 Fest, não só pelo desempenho no palco, mas pela capacidade de se conectar profundamente com as emoções dos fãs presentes muitos identificaram momentos de suas próprias vidas nas letras de Tweedy e nas melodias do grupo.
Num festival como o C6 Fest, que traz bons shows na mesma medida que reúne plateias dispersivas e desatentas, o Wilco conseguiu ser mais do que a experiência ordinária de ter a música ao vivo como trilha sonora para uma cerveja com amigos. Bom para os fãs, que só têm a lamentar que uma ou outra música tenha ficado de fora do setlist.