BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Apesar do discurso de que a segurança pública deve ser tratada como prioridade ecoar frequentemente no Congresso –e da expectativa de que o tema domine as próximas eleições–, quinze bancadas estaduais ignoraram a área na destinação de emendas parlamentares em 2025.

Entre essas bancadas, estão sete dos dez estados mais violentos do país, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com dados de 2023. São eles: Alagoas, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe.

Assim como ocorre com as bancadas, nem todos os deputados e senadores destinam recursos de emendas individuais para a área –inclusive entre os membros dos colegiados dedicados ao tema.

Entre os 97 integrantes das Comissões de Segurança Pública da Câmara e do Senado, quase metade (48,5%) não enviaram recursos.

O Congresso indicou R$ 1,06 bilhão em verbas individuais, de bancadas estaduais e das comissões ao Ministério da Justiça e Segurança Pública em 2025, deixando a pasta na 9º posição entre os órgãos federais que mais receberam emendas –o valor ainda pode ser modificado durante o ano.

Em geral, a verba que chega ao ministério é repassada para convênios com estados ou usado em compras do governo federal de equipamentos para as forças locais de segurança, como as polícias federal e militar.

A soma da verba indicada pelos parlamentares à pasta, porém, têm subido. Em 2023, foram empenhados cerca de R$ 500 milhões, valor que chegou a R$ 834 milhões no ano seguinte.

As bancadas estaduais foram responsáveis por indicar R$ 793,8 milhões das emendas ao ministério em 2025, o que corresponde a 74,7% do valor destinado à segurança pública. Dados que incluem Câmara e Senado.

A bancada de São Paulo foi a que mais alocou recursos para a área, destinando R$ 254,4 milhões, valor equivalente a 48,11% de sua cota de emendas. Na sequência, aparecem Minas Gerais com R$ 105,8 milhões; Paraná, com 93,2 milhões e Espírito Santo, com R$ 83,3 milhões.

O Orçamento de 2025 reserva R$ 50,3 bilhões para emendas parlamentares. A área da saúde concentra o maior volume, com R$ 26,3 bilhões –os parlamentares são obrigados a aplicar metade das emendas individuais e de comissão na pasta da Saúde, que repassa os recursos para os estados.

As emendas são uma forma pela qual deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para suas bases eleitorais e, com isso, ampliar seu capital político. A prioridade do Congresso tem sido atender seus redutos eleitorais, e não as localidades de maior demanda no país.

Segundo coordenadores de bancadas ouvidos pela Folha, cada estado adota uma estratégia própria para a destinação dos recursos. Em alguns casos, os valores são divididos individualmente entre os parlamentares e, em outros, a decisão é tomada de forma consensual. Há também situações em que a negociação envolve diretamente os governos estaduais

A reportagem procurou as sete bancadas dos estados com alta criminalidade que não alocaram recursos para segurança pública.

O coordenador de Alagoas, deputado Paulão (PT), disse que as emendas são decididas coletivamente e tradicionalmente priorizam saúde, educação e assistência social. “Alagoas é pequeno, mas com grande contradição social”.

A deputada Coronel Fernanda (PL-MT), coordenadora de Mato Grosso, afirmou que houve negociação com o governo do estado para que as emendas fossem para a saúde, liberando recursos próprios estaduais para segurança. “Quando destino à saúde, também ajudo a segurança”, disse.

O deputado Augusto Coutinho (Republicanos-PE), da bancada de Pernambuco, afirmou que seguem prioridades do governo estadual. “Para que a gente apresente uma emenda, é natural que sejamos cobrados e demandados”, afirmou.

O coordenador da bancada de Sergipe, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), afirmou que, em 2025, a segurança não foi o foco porque, nos anos anteriores, já houve destinação de recursos. “Há projetos na área da segurança ainda em execução. Mas eu mesmo já destinei cerca de R$ 30 milhões, declarou.

Já o deputado Robinson Faria (PL-RN), coordenador da bancada do Rio Grande do Norte, disse que nenhuma delas foi direcionada para a área de segurança pública, pois o estado enfrenta outras prioridades. “A arrecadação não é suficiente nem para cobrir as despesas com a saúde. Sem as emendas, faltam recursos para cirurgias”, afirmou.

Os coordenadores de Amazonas e Pará não responderam.

O ministério comandado por Ricardo Lewandowski também recebeu R$ 268,5 milhões em emendas individuais apresentadas por 241 deputados e senadores. Os partidos dos parlamentares que mais mandaram emenda são PL, Republicanos, PSD, PP e PT.

Entre os 97 parlamentares titulares e suplentes da Comissão de Segurança Pública da Câmara e do Senado, 50 encaminharam recursos por meio de emendas individuais.

O presidente da Comissão temática da Câmara, deputado Paulo Bilynskyj (PL-SP), afirmou que, apesar de ser uma comissão numerosa, são poucos os parlamentares realmente assíduos.

“O que a gente percebe é que a destinação de recursos não segue, necessariamente, uma lógica alinhada aos princípios que o deputado defende. Essa é mais uma das incoerências do parlamento”, apontando que a segurança pública é uma prioridade que traz benefícios diretos para toda a população.

Já o senador Sergio Moro (União -PR), vice-presidente da Comissão de Segurança Pública do Senado, afirmou que não conhece em detalhes a atuação dos demais parlamentares, mas ressaltou que destina recursos para a área.

O secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Marivaldo Pereira, afirmou que as emendas parlamentares são hoje uma das principais fontes de financiamento de políticas públicas. Ele destacou que o ministro Lewandowski tem ressaltado a importância desses recursos diante dos cortes no Fundo Nacional de Segurança Pública e no Fundo Penitenciário.

“É fundamental que os parlamentares transformem essa preocupação em medidas concretas para fortalecer a segurança pública”, disse.

A maior parte dos recursos indicados por emendas é direcionada o fortalecimento de suas forças de segurança, principalmente com a aquisição de viaturas e armamentos.

Felippe Angeli, coordenador de Advocacy do Justa, criticou a forma como os recursos têm sido aplicados na área, apontando que, embora os estados cheguem a gastar até 10% do orçamento próprio com as polícias, nem sempre esse investimento se traduz em resultados efetivos.

“A impressão que temos é que a maior parte dos investimentos repete o mesmo padrão: ostensividade, armamento e viaturas. Crimes de alta complexidade demandam outros tipos de investimentos, que ainda não estão acontecendo”.