ESTOCOLMO, SUÉCIA (FOLHAPRESS) – Ulrika Kagstrom mostra o empreendimento como se fosse uma corretora de imóveis. Ressalta que a construção é sustentável, feita com madeiras. Fala sobre o jardim no rooftop comunitário e os tamanhos dos apartamentos, abastecidos com eletrodomésticos da marca. No final da explicação, ela se lembra de avisar:
“A Electrolux não vai virar agência imobiliária”, diz ela, chefe da Greenhouse Sthlm Development, como foi batizado o complexo.
Imagem de projeção de como deve ficar o complexo Greemhouse, construído pela Electrolux, quando pronto Reprodução A imagem mostra um edifício moderno de vários andares, com uma fachada composta por janelas grandes e varandas. O edifício é cercado por árvores e há pessoas caminhando na calçada. Na parte inferior, há lojas ou estabelecimentos comerciais visíveis. As construções financiadas pela multinacional no bairro de Stadshagen, nos arredores de Estocolmo, na Suécia, vão servir como anexo à sede, mas não apenas isso. Também oferecerão espaço a outras companhias que queiram se mudar para a região.
A empresa também finaliza prédio de sete andares para vender 114 apartamentos em um dos mercados imobiliários mais regulados e difíceis do planeta. O Greenhouse Sthlm Development tem 85 mil metros quadrados, sendo 40 mil deles previstos para residências. Será erguido até 2034 em cinco etapas.
“Não recebemos qualquer ajuda ou subsídio do governo. É iniciativa da Electrolux porque queremos atrair pessoas e outras empresas para esta região e valorizá-la”, diz Ulrika sobre a área que fica na parte oeste de Kungsholmen, uma das 30 mil pequenas ilhas que formam a capital sueca.
Os primeiros compradores devem se mudar no final deste mês, em um investimento de cerca de R$ 1,5 milhão por um apartamento. O tamanho varia entre 28 e 65 metros quadrados.
“As vendas estão caminhando. Temos 40 unidades já negociadas”, informa Ulrika Kagstrom.
O grupo que faturou cerca de R$ 70 bilhões em 2024 erguer um prédio para vender apartamentos soa pouco usual. Mas pouco é comum na economia imobiliária da Suécia.
“[Desde 2006] há uma baixa taxa de construção, altos preços e consumidores endividados. É um setor que está constantemente debaixo de uma lupa, mas ignora seus críticos, então desperta questionamentos. O setor é tão ruim assim quanto dizem ou o que existe é um efeito dominó?”, questionam os pesquisadores Lennart Welin e Louise Bildsten no estudo “O mercado imobiliário na Suécia: uma perspectiva histórica”, publicado pela Lund University.
Quem compra um apartamento na Suécia não é dono do imóvel. Ele adquire porcentagem de uma associação de moradores que administra o prédio. O empreendimento construído pela Electrolux terá sua própria entidade que vai ser responsável pelo edifício. O mesmo não vale para casas, porque quem a constrói já é o dono do terreno.
Em todo o país, a estimativa é que existam 300 associações que administram 950 mil apartamentos. Isso faz com que “o proprietário” do imóvel, se colocá-lo para alugar, na verdade o esteja relocando. Isso é permitido apenas mediante autorização por escrito da associação e por curto período.
Quem quiser alugar livremente um apartamento, sem se preocupar com autorizações, precisa ser dono do prédio.
A regulação também é estendida ao valor do aluguel. Não há liberdade de preços. A legislação protege locatários caso sejam cobrados valores considerados muito superiores a outros apartamentos da mesma região. A regra chamada “controle de aluguel” tem como premissa proteger moradores de suposta exploração de proprietários. A Justiça pode ser acionada com pedidos de redução de valor ou devolução do que foi cobrado em excesso nos dois anos anteriores.
A crise no setor pela falta de imóveis disponíveis já derrubou governos. Em 2001, o primeiro-ministro Stefan Lofven perdeu voto de confiança no parlamento e renunciou. Ele pretendia flexibilizar os valores de alugueis em prédios recém-construídos. É um tema sensível porque o direito à moradia digna está na constituição do país.
Das 290 cidades do país, 255 reportaram déficit de moradias e quem está em listas de espera de associações pode levar anos até ser chamado.
Críticos dizem que o sistema é facilmente explorado por famílias em melhores condições financeiras, que podem conseguir os melhores apartamentos, empurrando as pessoas de menor renda para fora das grandes cidades, como Estocolmo, por exemplo. A constituição considera o direito a moradia igual para todos. Não protege quem mais precisa e tem renda baixa.
O controle de preços também inibiria a disponibilidade de moradias para alugueis, segundo o estudo de Welin e Bildsten.
A resposta do governo foi o plano apresentado para reformar o sistema de hipotecas. A legislação tornaria a compra do primeiro imóvel mais fácil para jovens do país. O primeiro ministro Ulf Kristersson também conta que juros baixos podem incentivar a construção de mais casas fora dos centros das grandes cidades. Como é o Greenhouse erguido pela Electrolux, a cerca de cinco quilômetros do centro de Estocolmo.
O repórter viajou a convite da Electrolux