SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As negociações nucleares entre os Estados Unidos e o Irã chegaram a um ponto crítico nesta sexta (23), quando as delegações dos países participaram em Roma da quinta rodada de conversas desde o mês passado, sem conseguir avançar.

Segundo o chanceler do Sultanato do Omã, Badr al-Busaidi, que faz a mediação dos encontros, não houve “progresso conclusivo” no encontro na embaixada do país na capital italiana. Ele disse esperar “esclarecer as questões remanescentes nos próximos dias” e chega a “um acordo honrado e sustentável”.

Pouco antes, o porta-voz da chancelaria iraniana, Esmaeil Baqaei, havia dito à TV estatal do seu país que o chefe da delegação americana, Steve Witkoff, havia deixado as negociações “devido à sua agenda de voo”, insinuando uma crise.

Já o chefe do lado iraniano, o chanceler Abbas Araqchi, foi mais ameno. “As conversas são complicadas”, disse, ressalvando que “há potencial de progresso com as propostas colocadas pelo Omã”. Elas não foram detalhadas.

Minúcias das conversas, que duraram cerca de três horas, ainda devem emergir. Mas o nó principal à mesa ainda não foi desatado: a questão do enriquecimento de urânio do país persa.

Desde que Donald Trump deixou o acordo nuclear que monitorava esse processamento pelos iranianos e trocava a possibilidade de construção de uma bomba atômica pelo relaxamento das sanções a Teerã, em 2018, os aiatolás têm investido na produção de material físsil.

Segundo a Agência Internacional de Energia Atômica, cujo trabalho de inspeção foi restringido, o Irã já cruzou as linhas vermelhas rumo à arma nuclear. Sua chancelaria já disse mais de uma vez que pode fazer a bomba quando quiser, e analistas estimam que haja matéria-prima para até seis ogivas.

Nesta sexta, Araqchi havia postado no X um ultimato aos EUA. “Zero armas nucleares = temos um acordo. Zero enriquecimento = nós NÃO temos um acordo. Hora de decidir”, escreveu.

O enriquecimento é um processo no qual o urânio tem seus isótopos separados, após processos químicos, em ultracentrífugas. Se for até 20%, pode servir a fins médicos e uso em reatores de uso civil ou para propulsão nuclear. A partir de 80% ou 90%, serve para bombas.

O acordo de 2015 permitia o enriquecimento até 3,67%, em quantidades controladas.

O impasse ocorre em um momento crítico. Após a saída dos EUA do acordo, que datava de 2015, não houve avanço em negociações. Com a volta de Trump, os americanos passaram a pressionar Teerã: aumentaram a campanha militar contra os houthis do Iêmen, aliados dos iranianos, e posicionaram forças ofensivas na região.

Deu certo, e apesar das queixas do líder supremo, Ali Khamenei, as conversas começaram em abril no Omã, migrando depois para a Itália. Após a mais recente rodada, o aiatolá dizia que as condições americanas de fim total do progama nuclear do seu país eram “ultrajantes”.

A escalada retórica aumentou a expectativa em torno do encontro desta sexta. Há o temor de que Israel, principal aliado de Washington no Oriente Médio e em ritmo de guerra aberta desde o ataque terrorista do Hamas em 7 de outubro de 2023, resolva atacar as instalações nucleares iranianas.

Isso já foi colocado na mesa nas duas ocasiões em que os países trocaram inédito fogo direto, no ano passado, mas os ânimos se acalmaram.

Nesta semana, contudo, informações vazadas pelo setor de inteligência do governo americano a veículos do país sugeriram que o Estado judeu está com um ataque pronto para ser lançado se as negociações colapsarem. Segundo a versão, Israel acha que o eventual fracasso levará o Irã a fazer sua bomba.

Tel Aviv é a única potência nuclear do Oriente Médio, com estimadas 90 ogivas. Teerã tem como política de Estado a destruição de Israel, e o governo do premiê Binyamin Netanyahu já disse que a construção de um artefato atômico pelos rivais é inaceitável.

Agaqchi respondeu a isso em uma carta à ONU na quinta (22), na qual disse que “o Irã adverte fortemente contra qualquer aventura do regime sionista de Israel, e irá responder decisivamente a qualquer ameaça ou ato ilegal”. Segundo ele, se houver ataque, os EUA serão vistos como participantes dele.

Para o regime dos aiatolás, a existência do programa nuclear e sua eventual capacidade de entregar a bomba é uma peça central de barganha em qualquer negociação. Isso explica sua resistência em abandonar a tecnologia, uma condição que Trump colocou na mesa nas novas negociações.