SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – Sebastião Salgado morreu nesta sexta-feira (23) aos 81 anos. O famoso fotógrafo brasileiro foi “salvo” por Pelé quando documentava um genocídio ocorrido em Ruanda, em 1994.
O fotógrafo cobria a guerra travada entre os hutus e os tutsi. Os hutus formavam uma etnia majoritária no país africano, mas a comunidade tutsi, mesmo minoritária, dominou o país por muito tempo.
Fotógrafo contratou um intérprete para ajudá-lo a se deslocar da Tanzânia para Ruanda. Salgado viajava em um barco quando sofreu uma emboscada de um grupo formado por tutsis fugitivos, que pensavam que ele era francês. Para escapar, Salgado disse ser brasileiro ou melhor, que era “do país do Pelé”. E conseguiu sobreviver.
Sebastião Salgado lembrou detalhes em entrevista à GloboNews e à Revista Playboy. “‘O que está acontecendo?’, perguntei. ‘Eles vão matar a gente. Acham que você, querendo passar para o outro lado, é amigo dos hutus. E estão desconfiados de que você veio da França’, respondeu o intérprete. Os franceses eram aliados dos hutus no conflito.
“‘De jeito nenhum! Eu venho do Brasil e tal…’ [disse] em francês, com o cara traduzindo. Fale para eles que eu sou do país do Pelé! Aí a situação já mudou. O Pelé é realmente conhecidíssimo e de certa forma salvou a minha vida”, disse Sebastião Salgado.
O plano do fotógrafo voltar até Ruanda. “Depois de muito andar chegamos a um rio por onde os tutsis estavam fugindo para a Tanzânia. Havia uma quantidade de mortos descendo do rio. Tinha uma queda d’água acima e eu contei, em meia hora, 29 corpos caindo. O barquinho que trazia os fugitivos voltava vazio e eu fui perguntar ao pessoal se podia ir nele até Ruanda. De repente, tinha umas dez pessoas com facões em volta de mim. Olho para o meu intérprete e ele estava pálido, cinza”.
O relato de Sebastião Salgado foi lembrado pelo jornalista Chico Pinheiro nas redes sociais. Chico compartilhou vídeo após a morte de Pelé, em dezembro de 2022.
ENTENDA O CONFLITO
O ano era 1959 e os hutus conseguiram derrubar a monarquia tutsi, o que provocou uma fuga em massa dessa comunidade para países vizinhos, como a Tanzânia e a Uganda. Entretanto, um grupo rebelde tutsi formou a RPF (Frente Patriótica Ruandesa), e invadiu Ruanda em 1990. A “paz” foi restabelecida em 1993, mas a parte mais sangrenta do conflito ocorreu um ano depois.
Em 1994, o avião com o então presidente de Ruanda, Juvenal Habyarimana, de etnia hutu, foi derrubado. Extremistas hutus culparam a RPF pelo acidente e o genocídio teve início. Dados oficiais apontam que cerca de 800 mil pessoas foram mortas em apenas cem dias. O massacre é considerado um dos momentos mais terríveis da história.