SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A maior troca de prisioneiros de guerra entre Rússia e Ucrânia, em conflito desde que Moscou invadiu o vizinho há mais de três anos, começou nesta sexta (23).
Ela foi anunciada em redes sociais pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que vem tentando mediar uma trégua e negociações de paz entre os rivais. Logo depois, militares de ambos os lados confirmaram que o processo estava em curso, mas sem dar detalhes.
Nos últimos dias, ambos os lados submeteram aos adversários listas com mil nomes de detidos. Até aqui, as trocas usuais eram na casa das dezenas, às vezes centenas de presos, sempre intermediadas por partes como a Turquia ou os Emirados Árabes Unidos.
A negociação direta decorre dos contatos pressionados por Trump, que mudou a política americana de apoio total a Kiev em favor de uma tensa aproximação com Valdimir Putin. De forma titubeante, russos e ucranianos voltaram a se encontrar pela primeira vez desde 2022 na semana passada em Istambul.
Há outras frentes diplomáticas em curso. O chanceler da Rússia, Serguei Lavrov, disse nesta sexta (23) que considera deselegante que a segunda rodada de negociações entre Moscou e Kiev ocorra no Vaticano.
“Seria um pouco deselegante para países ortodoxos discutir em solo católico questões relacionadas à eliminação das causas do conflito”, disse o decano da alta diplomacia mundial, no cargo desde 2004, em um evento em Moscou.
A sugestão do uso da Santa Sé como sede de negociações foi feita por Trump após conversa com Putin na segunda (19). O papa Leão 14, que desde a posse tem pedido o fim das hostilidades, não chegou a se pronunciar, mas a sua disposição foi confirmada pela premiê italiana, Giorgia Meloni.
Tanto russos como ucranianos são majoritariamente cristãos ortodoxos, o ramo oriental da fé com ritos e doutrina diferentes das dos católicos, separados desde o chamado Grande Cisma de 1054. Nos últimos anos, a igreja na Ucrânia rompeu com a da Rússia por motivos políticos, e Kiev baniu a denominação russa devido ao alinhamento do Patriarcado de Moscou ao Kremlin.
O encontro da semana passada foi na Turquia, sede ao lado de Belarus das conversas fracassadas há três anos. Embora sem resultados, manteve o canal aberto. Trump, com seu voluntarismo usual, anunciou que as conversas “começariam imediatamente” após o telefonema com Putin.
Não foi bem assim, mas Lavrov confirmou que, “do lado russo, as negociações estão avançadas” para a elaboração de um memorando tratando daquilo que seu chefe chama de causas da guerra: entre outras coisas, a ameaça da Ucrânia de integrar a Otan, aliança militar do Ocidente, e o status das populações russófonas do leste ucraniano.
O chanceler inclusive voltou a dizer, nesta sexta, que qualquer acordo ou eventual cessar-fogo passa por um acordo em que sejam derrubadas leis que ele considera prejudiciais às populações russas étnicas na Ucrânia.
Por óbvio, ele não se refere àqueles já sob o poder de Moscou no leste e sul, que Putin quer ver absorvidos de forma reconhecida pela comunidade internacional, assim como os habitantes da Crimeia, que anexou em 2014 após a derrubada do governo pró-Moscou em Kiev.
Enquanto a diplomacia trabalha, numa fase conhecida como de engenharia de acordos, nos quais a realidade do fim do conflito se impõe mas ambos os lados precisam construir saídas para parecer vencedores, a guerra em si segue.
A Ucrânia realizou mais uma noite de ataques com drones contra os russos, com 112 aparelhos derrubados pelas forças de Putin, que não divulgam números totais lançados, como os rivais. Foi a semana mais intensa nessa frente na guerra até aqui, com 1.458 aviões-robôs ucranianos sendo abatidos, segundo o Ministério da Defesa em Moscou.
Com poucas vítimas, os estragos foram mais limitados às dores de cabeça: aeroportos no país, inclusive na capital, foram fechados diversas vezes, causando atrasos em cascata e voos cancelados, por exemplo.
Na mão contrária, a Rússia lançou 12 ataques com mísseis e drones ao longo da semana, e conquistaram vilas nas regiões de Sumi e Kharkiv, no norte do país, nominalmente fora dos objetivos de guerra declarados por Putin. Além disso, segue um avanço em Donetsk, no leste, que pode colocar as últimas posições ucranianas na área em perigo.