SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Criticado por aliados da Europa que exigem um cessar-fogo urgente na Faixa de Gaza e, ao mesmo tempo, pressionado por parceiros de coalizão que ainda pedem a intensificação dos ataques, o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, tem equilibrado as tensões com o argumento de que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, apoia as ações atuais das forças israelenses no território palestino.

Netanyahu e Trump conversaram por telefone logo depois do assassinato de dois funcionários da embaixada de Israel em Washington, na noite de quarta-feira (21). Em comunicado divulgado nesta quinta, o gabinete de Bibi, como o premiê israelense é conhecido, divulgou que os dois discutiram a manutenção do conflito em Gaza e que o americano reiterou apoio aos objetivos de Tel Aviv, inclusive ao controverso plano que prevê a transferência da população palestina para países árabes —o que pode configurar deslocamento forçado e limpeza étnica.

Rechaçada pela ONU e por várias outras organizações que falam em violação dos princípios básicos do direito internacional, a proposta para retirar os cerca de 2,3 milhões de habitantes de Gaza foi apresentada pelo próprio Trump, em janeiro, quando ele falou em fazer de Gaza a “Riviera do Oriente Médio”. Nesta semana, tornou-se uma das bandeiras de Netanyahu, que condicionou pela primeira vez o fim do conflito à implementação do plano.

Nesse sentido, Netanyahu opta por acenar e se aproximar mais dos políticos extremistas que sustentam a coalizão da qual ele faz parte, a mais à direita da história de Israel, a despeito da pressão internacional e da catástrofe humanitária em Gaza —a fome teria provocado a morte de 29 crianças e idosos nos últimos dias, e milhares continuam em risco, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas.

O premiê também subiu o tom contra aliados que têm manifestado preocupação com a crise em Gaza. Em especial, França, Reino Unido e Canadá foram alvo de críticas diretas. Segundo Netanyahu, o posicionamento dos três países encorajam o Hamas “a continuar lutando eternamente”. “Eles querem que Israel se renda e aceite que o exército de assassinos em massa do Hamas sobreviva, reorganize-se e repita o massacre de 7 de outubro [de 2023]”, disse Netanyahu em vídeo no qual falou em inglês.

Os três países ameaçaram nesta semana adotar medidas concretas se Israel continuasse com “ações escandalosas” em Gaza. Em seguida, o Reino Unido suspendeu as negociações com Israel sobre um acordo de livre comércio, e a União Europeia afirmou que revisará um pacto sobre relações políticas e econômicas devido ao conflito.

Pressionado, Netanyahu autorizou entregas limitadas de ajuda a Gaza pela passagem de Kerem Shalom, no sul. Farinha e outros suprimentos começaram a chegar nesta quinta a algumas das áreas mais vulneráveis de Gaza, depois que Israel liberou a passagem de caminhões, embora em número insuficiente para compensar a escassez causada pelo bloqueio de 11 semanas, segundo autoridades palestinas.

Muitos outros caminhões ainda estavam na fronteira, e as pessoas aguardavam para receber alimentos com medo de que multidões desesperadas tentassem saquear os veículos quando chegassem, de acordo com o Crescente Vermelho Palestino, braço da Cruz Vermelha na região.

Saques a caminhões foram relatados pela ONU. “Não foi um ato criminoso envolvendo homens armados. [Essas ações] refletiram o alto nível de ansiedade entre os moradores de Gaza que não sabem quando ocorrerá a próxima entrega de ajuda humanitária”, disse Stéphane Dujarric, porta-voz da organização.

Israel impôs o bloqueio a todos os suprimentos, em março, sob a justificativa de que o Hamas estava apreendendo as entregas para seus combatentes —acusação que o grupo terrorista nega. No início deste mês, um monitor global de fome disse que meio milhão de pessoas em Gaza enfrentam inanição.

A alimentação não é a única parte afetada pelo bloqueio. O ministro da Saúde, Majed Abu Ramadan, disse que apenas sete ou oito hospitais dos 36 de Gaza estavam funcionando, e apenas parcialmente, e que mais de 90% dos estoques médicos agora estavam zerados devido ao bloqueio. Já a frota de ambulância em operação foi reduzida para um terço do total devido à escassez de combustível.

Israel afirma que os relatos de grupos humanitários sobre condições semelhantes à fome são exagerados. Também exige que as forças de Tel Aviv sejam as responsáveis pela distribuição da ajuda em Gaza.