BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ex-comandante do Exército general Júlio Cesar de Arruda negou nesta quinta-feira (22) ao STF (Supremo Tribunal Federal) que tenha impedido a Polícia Militar do Distrito Federal de entrar no Setor Militar Urbano, em Brasília, para prender os golpistas na noite de 8 de janeiro de 2023.
Na ocasião, no entanto, o general deu ordens para que o Exército mobilizasse militares para impedir a entrada dos PMs no local. Três blindados Guarani foram usados pela Força para reforçar o bloqueio.
“Eu não neguei [o acesso da PM]. Quando começou a acontecer aquilo tudo lá, eu fui pro QG do Exército. Fui coordenar as ações que deveriam ser feitas pelo QG. Chamei o general [Gustavo] Dutra, comandante militar do Planalto, e [o ministro José] Mucio ficou do meu lado o tempo inteiro”, disse.
Arruda afirmou que recebeu informações de que a Polícia Militar pretendia entrar no Setor Militar Urbano para prender todos os manifestantes muitos dos quais estavam na Praça dos Três Poderes na invasão e depredação dos prédios.
“Quando parte dos manifestantes estava voltando para a Praça dos Cristais [em frente ao quartel], o general Dutra me ligou: ‘A PM está vindo atrás e tenho informação que eles vão prender todo mundo’. Eu falei: ‘Não, isso tem que ser coordenado’. Foi essa a ação inicial”, disse.
O general diz que em um primeiro momento conversou com o interventor da segurança pública do DF, Ricardo Cappelli, e o comandante da Polícia Militar, Fábio Augusto Vieira, sobre a prisão dos bolsonaristas.
Logo depois, os ministros Flávio Dino (à época da Justiça), José Mucio Monteiro (Defesa) e Rui Costa (Casa Civil) chegaram ao QG do Exército e definiram que a ação para prender os golpistas seria realizada na manhã do dia 9 de janeiro.
A decisão de Arruda de impedir o acesso da PM no acampamento bolsonarista montado em frente ao QG do Exército está descrita em uma investigação sobre a ação dos militares nos atos de 8 de janeiro. Arruda e o general Dutra depuseram à Polícia Federal em 2023 sobre a noite do dia das invasões.
O discurso no Exército é que a barreira feita pelos blindados não visava impedir a prisão dos golpistas. O objetivo era somente evitar que uma operação policial desajustada terminasse em tragédia.
Como a Folha de S.Paulo mostrou, o presidente Lula deu aval ao Exército para que a prisão fosse efetuada no dia posterior aos ataques aos Poderes. A justificativa dos militares era que uma operação desorganizada poderia resultar em mortes.
O general Júlio Cesar de Arruda foi escolhido pelo ministro da Defesa, José Mucio, para assumir o comando do Exército ainda na transição de governo, em dezembro de 2022. O militar era o membro do Alto Comando mais antigo à época e Mucio preferiu prestigiar a antiguidade do que a afinidade na escolha dos chefes das Forças Armadas.
Arruda não durou muito tempo no cargo. Nomeado em 28 de dezembro de 2022, o general enfrentou os ataques de 8 de janeiro sob a suspeição da cúpula do governo Lula(PT) e acabou demitido em 21 de janeiro de 2023, em crise de confiança.
Nesta quinta-feira, o ministro Alexandre de Moraes aproveitou a participação de Arruda no depoimento ao Supremo para questioná-lo sobre as prisões do 8 de Janeiro. Disse ao general que foi ele próprio quem decidiu sobre a detenção imediata dos golpistas.
“Em depoimento, o coronel Fábio Augusto Vieira, então comandante da PM, disse que ao chegar lá, o senhor proibiu a retirada [dos golpistas] e, com dedo em riste, teria dito: O senhor sabe que a minha tropa é um pouco maior que a sua, né?. O senhor confirma?”, perguntou Moraes.
Arruda disse não se lembrar desse detalhe da conversa. “Ali estava um clima de nervosismo, o senhor sabe disso, e minha função era acalmar. Isso tinha que ser feito de forma coordenada […]. Graças a Deus não houve nenhuma morte”, concluiu.
O ex-chefe do Exército também confirmou que recebeu o general da reserva Mario Fernandes em seu gabinete no Departamento de Engenharia e Construção do Exército em 28 de dezembro de 2022.
Reportagem do jornal O Estado de S. Paulo mostrou que Mario o autor do plano de assassinato de Moraes, Lula, Geraldo Alckmin (PSB) e José Dirceu procurou Arruda para pedir apoio às conspirações para evitar a posse do presidente petista. O ex-comandante teria expulsado Mario da sala.
Arruda confirmou que foi procurado por Mario, de quem é amigo desde 1988, naquele dia. Negou, porém, que tenha expulsado o general do gabinete. “Conversamos sobre diversos assuntos, mas não o expulsei da minha sala. Eu disse que daria continuidade ao que Freire Gomes estava fazendo”, disse.
O general prestou depoimento ao Supremo como testemunha da defesa do tenente-coronel Mauro Cid. Os dois trabalharam juntos de 2004 a 2006 no Comando de Operações Especiais do Exército, em Goiânia (GO).
Arruda disse que Cid sempre foi disciplinado e negou que, no período em que serviram juntos, o tenente-coronel tenha se mostrado politizado. O depoimento vai na linha da defesa do delator o advogado Cezar Bitencourt tenta livrar o militar do processo alegando que, como ajudante de ordens, só cumpria o que era demandado.
Nesta manhã, sete testemunhas foram ouvidas e uma não compareceu. Todos fizeram relatos semelhantes, defendendo o rigor da conduta militar de Mauro Cid, o histórico de trabalho dele e o respeito à hierarquia.
Afirmaram, ainda, que o militar não conversava sobre os atos do 8 de Janeiro e nem sequer sobre o processo que responde.
Para convencer as testemunhas a depor, o pai do colaborador, general Mauro Lourena Cid, fez contato com os militares para pedir apoio ao filho. Só o general Flávio Alvarenga Filho não compareceu.