SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O dólar abriu em leve alta nas primeiras negociações desta quinta-feira (22), à medida que os investidores reagiam à aprovação pela Câmara dos Deputados dos EUA da legislação tributária do presidente Donald Trump, enquanto no Brasil aguardam o Relatório de Receitas e Despesas.

Às 9h03, o dólar subia 0,19%, a R$ 5,6518. Na madrugada desta quinta, a Câmara americana aprovou o projeto de lei que permitirá a Trump implementar sua agenda doméstica. A legislação, que segue para o Senado, pretende reduzir impostos, direcionar mais dinheiro para as forças armadas e segurança de fronteira, e cortar verbas de programas sociais e de energia limpa.

Na última quarta (21), a moeda americana recuou 0,47%, a R$ 5,640, e a Bolsa brasileira fechou com forte recuo de 1,59%, aos 137.881 pontos, revertendo os ganhos registrados no início da semana. O movimento foi gerado pela cautela global diante de incertezas sobre a situação fiscal dos Estados Unidos.

Nos EUA, o preço de títulos de longo prazo do governo americano e ações também caíram, após um leilão fraco do Tesouro destacar as crescentes preocupações entre investidores enquanto o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tenta aprovar cortes de impostos no Congresso.

O rendimento do título do Tesouro de 30 anos subiu 0,11 pontos percentuais para 5,096% nas negociações desta tarde, o nível mais alto desde o final de 2023, enquanto o preço dos títulos caiu. O movimento desta quarta somou-se a uma alta de vários dias nos títulos do Tesouro de prazos mais longos. O índice de ações S&P 500 caiu 1,6%.

O recuo ocorreu enquanto líderes republicanos no Congresso negociam o avanço da legislação fiscal de Trump. Analistas preveem que a proposta, um “grande e belo projeto” segundo o presidente, deve aumentar em US$ 3 trilhões a dívida pública dos EUA na próxima década.

A deterioração das perspectivas fiscais tem causado preocupações crescentes entre investidores e, na semana passada, levou a Moody’s a retirar dos EUA sua última classificação de crédito máxima de uma grande agência de crédito.

As inquietações dos investidores aumentaram nesta quarta depois que os EUA registraram fraca demanda em um leilão de US$ 16 bilhões em títulos do Tesouro de 20 anos.

Os primary dealers —bancos que são obrigados a absorver quaisquer títulos não adquiridos por outros investidores— compraram 16,9% da oferta, em comparação com uma média de 15,1%, segundo o BMO Capital Markets.

“Tivemos um leilão fraco de 20 anos e, quando combinado com o foco no déficit orçamentário, o mercado tem uma tendência para rendimentos mais altos”, disse Ian Lyngen, chefe de estratégia de taxas dos EUA no BMO Capital Markets.

Um gestor de fundo que pediu para não ser identificado descreveu o leilão do Tesouro desta quarta como desagradável.

Nos mercados de ações, mais de nove em cada dez das empresas membros do S&P 500 estavam negativas. Os setores financeiro, imobiliário e de saúde foram os piores desempenhos do índice de referência.

No Brasil, a Bolsa foi pressionada pela alta nos rendimentos dos títulos americanos e por um movimento de realização de lucros, ou seja, quando investidores vendem papéis que tiveram forte valorização para efetivar os ganhos.

A alta dos rendimentos americanos, considerados os mais seguros do mundo, costuma provocar elevação nas taxas de juros globais, já que eles são são referência mundial para o custo do dinheiro e risco soberano.

Esse movimento influencia diretamente a curva de juros futuros no Brasil, uma vez que os investidores ajustam suas expectativas de retorno e risco, elevando as taxas locais. Por sua vez, a alta nas taxas de juros locais e globais tende a pressionar negativamente o Ibovespa, pois encarece o custo do capital para as empresas e reduz o apetite por ativos de risco, como ações.

“As bolsas internacionais recuaram bastante com a volta da alta dos juros, e aqui no Brasil, que vinha numa trajetória positiva, acabamos acompanhando esse movimento, não só pelos dados externos, mas também por uma realização de lucros e pelos recentes comentários do governo”, afirmou Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos.

Do lado positivo, a Gol fechou o dia com uma disparada de 35,29%, a R$ 1,38, ao fim do pregão regular, impulsionada pela aprovação do plano de recuperação judicial da companhia aérea nos Estados Unidos.

De acordo com analistas do BTG Pactual, a aprovação do tribunal reduz significativamente a incerteza quanto à reestruturação financeira da Gol e aumenta a flexibilidade estratégica da empresa no futuro.

Na véspera, a companhia informou que o juiz da recuperação judicial da companhia nos EUA aprovou plano de reestruturação da empresa e que deixará o processo de recuperação com cerca de US$ 900 milhões em liquidez e alavancagem financeira de 5,4 vezes, que deve se reduzir a 2,9 vezes ao final de 2027.

Segundo Ian Lopes, economista da Valor Investimentos, as dúvidas sobre a situação fiscal dos Estados Unidos continuaram pesando.

“Tivemos recentemente um rebaixamento na nota de crédito dos EUA e há no radar um pacote que pode aumentar bastante o déficit americano. Essas incertezas, junto com a retirada de recursos dos investidores institucionais, explicam o movimento de hoje”, disse.

Ao diminuir de Aaa (máxima) para Aa1, a Moody’s afirmou que espera que os déficits federais aumentem para quase 9% do PIB (Produto Interno Bruto) até 2035, em comparação com 6,4% no ano passado, devido ao aumento dos pagamentos de juros sobre a dívida, gastos com direitos adquiridos e uma “geração de receita relativamente baixa”.

Esse rebaixamento acirrou preocupações com o cenário fiscal da maior economia do mundo, levando agentes financeiros a se desfazerem de algumas posições compradas no dólar e nos títulos.

Por outro lado, há uma legislação tributária proposta por Trump que, caso aprovada, pode acrescentar trilhões de dólares à dívida do governo, contribuindo para o mal humor dos mercados lá fora.

Analistas independentes dizem que a medida pode acrescentar de US$ 3 trilhões a US$ 5 trilhões (R$ 17 a R$ 28 trilhões) à dívida de US$ 36,2 trilhões (R$ 205 trilhões) do governo federal.

Trump foi ao Capitólio nesta terça em busca de um consenso quanto ao projeto orçamentário, que não é unanimidade entre os republicanos. Várias alas do partido na Câmara dos Deputados têm expressado insatisfação com a legislação e ainda podem bloquear sua aprovação na Casa.

O presidente americano reconheceu as preocupações, mas previu que o projeto acabará sendo aprovado. “Não é uma questão de resistência. Temos um partido tremendamente unido”, disse Trump a repórteres ao chegar no Capitólio.

O projeto de lei prevê uma extensão nos cortes de impostos implementados por Trump em 2017, que foram sua principal conquista legislativa no primeiro mandato, e também acrescentaria isenções fiscais sobre a renda proveniente de gorjetas e de horas extras, que fizeram parte de suas promessas de campanha.