SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Poucos nomes são tão relacionados a uma sonoridade quanto o da banda Air, especialmente em seu disco “Moon Safari”, de 1998. A obra, cujo aniversário de 25 anos motiva a atual turnê da dupla francesa, tem sons que parecem planar no ar, levando o ouvinte a um ambiente etéreo, como se os baixos e teclados passassem por um processo de sublimação até se fundirem à atmosfera.

“Entramos no estúdio querendo fazer uma obra carismática, grandiosa e elegante. No fim das contas, acabamos fazendo algo bastante onírico”, diz Jean-Benoît Dunckel, metade do Air, que se apresenta no festival C6, em São Paulo, neste fim de semana.

Essa característica mais abstrata de “Moon Safari” sempre dificultou o processo de levar o disco ao palco. Há alguns anos, um grupo de artistas e designers franceses pensaram numa nova estrutura para o show, em que a dupla —no palco, um trio, com adição de um baterista— toca dentro de uma caixa que emite luzes e também pode ser um telão.

“Dá a sensação de que o espectador está no estúdio conosco”, diz Dunckel. “Somos meio paradões tocando. Tocamos guitarra, baixo, teclado e bateria, mas não tem um cantor doidão do tipo Mick Jagger no palco. Com a tecnologia atual, a gente consegue oferecer som e luzes incríveis à plateia.”

De certa forma, o show atual de “Moon Safari” recria de maneira psicodélica as sessões de estúdio que geraram o álbum, feito por Dunckel e Nicolas Godin depois de tentativas frustradas de terem uma banda de pop mais convencional. Os dois se conheceram na escola e se reencontraram na faculdade, no fim dos anos 1980, quando decidiram tocar juntos.

Mas o projeto não deu certo e eles congelaram a banda por cinco anos para estudar arquitetura. Quando se reuniram novamente, em 1996, diz Dunckel, a bagagem que eles tinham já era outra.

“Primeiro, Nicolas estava ouvindo muito música negra, como Stevie Wonder, e um pouco de jazz de Miles Davis. Eu estava curtindo mais new wave, como The Cure, e essa música mais sombria, tipo Joy Division. Além disso, era muito fã de Kraftwerk, já gostava do pop de Beatles, Rolling Stones e David Bowie. Isso se misturou com as trilhas sonoras de Ennio Morricone e programas de TV que a gente via na infância. Para mim, que estudei no conservatório, ainda tinha muita música clássica que eu gostava, como Debussy e Ravel.”

Há um pouco disso tudo em “Moon Safari”, mas o disco não soava como nada feito anteriormente. A sonoridade retrô-futurista veio de uma abordagem da música eletrônica para instrumentos analógicos, atingindo um lugar estético em que as noções de temporalidade acabam embaralhadas.

O Air é frequentemente classificado como uma banda de música eletrônica, ainda que a sonoridade de “Moon Safari” não tenha nenhuma relação com computadores. A dupla se autossampleava —ou seja, gravava faixas rítmicas e tocava os outros instrumentos por cima delas, adicionando depois camadas com sonoridades diversas criadas nos sintetizadores.

“Era eletrônico no sentido de que usamos muito os sintetizadores. Estávamos apaixonados por todos aqueles teclados e eles não eram nada complicados”, diz Dunckel. “Simplesmente amávamos aqueles sons. Tínhamos uns poucos teclados, e isso de certa forma moldou nossas possibilidades artísticas. Eles deram um sabor e um estilo musical, porque éramos bem pobres musicalmente.”

Os sintetizadores são a maior presença sonora em “Moon Safari”, mas há destaque para as linhas de baixo criadas por Godin e as vozes todas modificadas com “vocoder” e outros pedais, ainda sem AutoTune. As músicas do disco não soam como canções pop tradicionais, e também não têm a ver com improviso e espontaneidade —foram construídas tijolo a tijolo como edifícios complexos por uma dupla com conhecimento de arquitetura.

“Acho que esse álbum era tipo um campo de pesquisa”, afirma Dunckel. “Estávamos tentando expandir as possibilidades de cada faixa, e ficamos obcecados pelo fato de que elas não estavam fluindo. Então, no começo, tentamos construí-las como canções pop, mas não funcionava porque a força da música pedia uma nova estrutura, algo diferente.”

Se fosse um prédio, “Moon Safari” seria uma construção elegante, em que as estruturas de concreto desafiam a gravidade e parecem flutuar, como se tivessem saído de um sonho. “Acho que cada música é um exemplo do que aquela música poderia ser”, diz o músico francês. “Então, para mim, não há regras ou estratégias. Tem a ver com sonhar e atingir a emoção correta.”.

AIR NO C6 FEST

– Quando 24 de maio, às 20h45

– Onde Parque Ibirapuera – av. Pedro Álvares Cabral, s/n, Vila Mariana, região sul

– Preço Ingressos esgotados

– Link: https://c6fest.com.br/