SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Tem circulado nas redes sociais uma prática para gestantes chamadas de “protocolo super-bebê”, que promete aumentar o QI (quociente de inteligência) do bebê a partir de determinados suplementos administrados durante a gestação. Após a repercussão, entidades médicas alertaram sobre a prática, que pode trazer sérios riscos à saúde da gestante e do feto.
O protocolo foi compartilhado por uma médica em seu perfil do Instagram, mostrando o protocolo, que consiste na aplicação de vitaminas e aminoácidos por via endovenosa e intramuscular em gestantes. Segundo a divulgação, o bebê teria um maior QI e melhor sistema imunológico. A prática deveria ser feita em até 12 semanas de gestação, período crítico da formação do tubo neural do bebê.
No entanto, entidades como a Febrasgo e o Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo) e o CFM (Conselho Federal de Medicina) afirmaram que o protocolo não possui estudos clínicos nem comprovação científica.
Segundo Lilian de Paiva Rodrigues Hsu, presidente da comissão nacional especializada em assistência pré-natal da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), o período anterior às 12 semanas é a fase em que acontece a formação do bebê, chamada de embriogênese.
“Os órgãos estão sendo formados e qualquer medicação ou suplementação tem que ser administrada com muito cuidado”, afirma Hsu.
Conforme o coordenador da Câmara Técnica de Ginecologia e Obstetrícia do CFM, Ademar Augusto, não há evidências que deem sustentação sobre benefícios nem malefícios, não havendo garantias sobre as repercussões causadas no binômio materno fetal.
“Protocolos de super nutrição não são reconhecidos pelo Conselho Federal de Medicina, que não os recomenda a médicos ou pacientes, alertando também sobre riscos em potencial a que podem expor mãe e bebê”, afirma.
Angelo Vattimo, presidente do Cremesp, diz que o protocolo é um absurdo. “A gestante vai se submeter a um risco sobre uma proposta que é surreal, um protocolo que não existe”.
Vattimo alerta que a gestante corre o risco de sofrer efeitos colaterais, como náuseas, intoxicação e arritmias cardíacas, principalmente quando não se sabe exatamente o que será administrado. “Qualquer substância é reposta de acordo com a necessidade clínica do paciente”, afirma. Segundo o conselho, a aplicação de substâncias via endovenosa ou intramuscular pode trazer riscos locais como infiltração, infecção local e trombose.
O Cremesp também reforçou em nota que médicos não podem divulgar procedimentos de forma sensacionalista e que é proibido divulgar, fora do meio científico, processos de tratamento cujo valor ainda não esteja reconhecido cientificamente por algum órgão competente. Em caso de condenação, as penas variam de “advertência confidencial em aviso reservado” à “cassação do exercício profissional”.
O conselho encaminhou um ofício para o Conselho Regional de Medicina do Ceará (Cremec), onde está registrada a médica que divulgou o protocolo. Em nota, o Cremec afirmou que instaura procedimentos de apuração e que “não emite juízo de valor diante de casos concretos, visto que é de sua responsabilidade apurar os fatos, proporcionando ao médico o direito de ampla defesa e o contraditório”. Também afirmou que a apuração ocorre de forma sigilosa.
Segundo os especialistas, a melhor opção para a gestante é a programação da gestação e fazer o pré-natal com profissionais qualificados. “Fazer consulta, avaliação clínica, para verificar se há possibilidade de ser usado algum tipo de suplemento nutricional ou vitamínico para que ela esteja em uma melhor condição, mas isso tem que ser averiguado antes”, diz Hsu.
A médica ressalta que grande parte da população brasileira engravida sem planejar e destaca a importância da gestante ser avaliada do ponto de vista médico. “Hoje temos o problema de dietas de diferentes formas, não é só a questão socioeconômica que interfere, mas hábitos alimentares. A gestante deve ser avaliada nessas necessidades por um profissional de saúde e não deve fazer aleatoriamente qualquer reposição”.
Atualmente existe uma política de saúde aprovada internacionalmente, a implementação do ácido fólico (a vitamina B), que previne doenças relacionadas ao fechamento do tubo neural e má formação, e a suplementação de ferro. “Por mais que seja muito sedutora a proposta, nós temos que ter atenção do ponto de vista de segurança”.
Os médicos recomendam, em casos como esse, a busca por profissionais de saúde de confiança e orientações médicas baseadas em evidências. Além disso, as próprias páginas das associações médicas nas redes sociais trazem informações confiáveis sobre cuidados durante a gestação.