BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – União Europeia e Reino Unido anunciaram nesta segunda-feira (19) em Londres o primeiro acordo pós-Brexit, um movimento estratégico que zera a conturbada relação desde que a ilha votou para se separar política e economicamente do continente em 2016. Limitado do lado britânico pelo debate interno sobre imigração, o documento ratifica um movimento de aproximação necessário para as duas partes.
Entre a Rússia de Vladimir Putin, uma ameaça considerada existencial para a maioria dos países europeus, e os EUA comandado por Donald Trump, avesso à Otan e isolacionista, europeus e britânicos deixaram de lado “a paralisante velha discussão” sobre o brexit, na definição de Keir Starmer. Ao lado de Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, o primeiro-ministro britânico declarou em Londres que construir relações e escolher parceiros são “o que nações soberanas e independentes fazem”.
O recado diplomático ao agressor da Ucrânia e ao presidente americano que iniciou seu segundo mandato disparando tarifas comerciais para boa parte do planeta dá continuidade a uma ofensiva conjunta, que já teve outro momentos significativos, como o encontro de Starmer com Emmanuel Macron, Friedrich Merz e Donald Tusk, no último dia 9, em uma Kiev alvejada horas antes por drones russos.
Na mesma manhã, Putin recebia em Moscou ditadores e autocratas para a parada militar que celebrava os 80 anos do fim da Segunda Guerra. Presente ao evento, o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, demonstrou irritação ao ser questionado sobre as críticas que recebia dos europeus, defendendo que já havia pedido para o líder russo voltar às negociações com o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski.
Parte fundamental do acordo anunciado em Londres, empresas britânicas poderão participar do pacote de 150 bilhões de euros (R$ 946 bilhões) gestado pela União Europeia para reforçar a defesa do continente. Desde a ascensão de Trump e sua assertiva de que os parceiros da Otan precisavam aprender a se virar sozinhos, a Europa trabalha no programa.
Na Alemanha, por exemplo, Merz, antes mesmo de se tornar primeiro-ministro, conseguiu aprovar um relaxamento do freio da dívida, a versão local do teto de gastos, para abrigar gastos sem precedentes no setor de defesa. Em seu primeiro discurso no Parlamento, prometeu transformar as Forças Armadas alemãs no maior Exército da Europa.
O assunto chega a níveis antes impensáveis na Europa, como debater a conveniência de comprar equipamentos bélicos americanos e estar sujeito a atualizações críticas, cujo acesso poderia flutuar junto com o humor de Trump.
“Esta é a primeira cúpula entre o Reino Unido e a União Europeia”, declarou Starmer. “Ela marca uma nova era em nossas relações, e este acordo é vantajoso para ambas as partes.”
O documento poderia ser ainda mais abrangente, caso tivesse permitido o livre trânsito de estudantes dentro do conhecido programa Erasmus, que financia o intercâmbio de alunos entre os diversos países do bloco. Pressionada, porém, pela ascensão do populista Nigel Farage, que classificou o acordo de traição, a gestão Starmer deixou o tema para uma negociação futura. Também ficou para trás a ideia de devolver os cidadãos britânicos ao sistema eletrônico das fronteiras da UE e às filas rápidas.
Farage é um dos pais do brexit e tem a política imigratória do trabalhista Starmer como alvo no atual Parlamento. Ao mesmo tempo, pesquisas mostram que a maioria dos britânicos se arrepende do plebiscito de 2016, que tirou empregos e investimentos do país. O movimento seletivo de Starmer parece ponderar as duas questões.
“Em um momento de instabilidade global e em que nosso continente enfrenta a maior ameaça das últimas gerações, nós, na Europa, permanecemos unidos”, declarou Von der Leyen, deixando claro que a ilha voltou a fazer parte do continente.