SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Ao som de “P.I.M.P”, do rapper 50 Cent, Cauã Reymond entra em cena como o trambiqueiro César Ribeiro de “Vale Tudo”. Quando a música toca na versão instrumental de Bacao Rhythm & Steel Band, o telespectador pressente que alguma maracutaia está por vir na novela das 21h da Globo.

O hit dos anos 2000 pode até passar despercebido por quem não conhece os acordes, mas a geração MTV, familiarizada com a letra, sabe bem que a canção está descrevendo a vida de um cafetão. “Mulher nenhuma arranca um dólar de mim”, diz um verso.

Em entrevista ao F5, Juliana Constantini, gerente de produção musical dos Estúdios Globo, conta como funciona a construção da trilha sonora de uma novela. Para o remake de “Vale Tudo”, ela diz que procurou agradar ao telespectador da versão original com faixas clássicas, intercaladas com o pop contemporâneo e o eletrônico futurista que ajudam a ambientar a trama aos dias atuais.

É a voz doce de Cazuza em “Faz Parte do Meu Show”, por exemplo, que embala o romance entre Solange (Alice Wegmann) e Afonso (Humberto Carrão). O tema é o mesmo do casal de 1988, vivido por Lídia Brondi e Cássio Gabus Mendes. Segundo Constantini, a ideia era mexer com os fãs da novela original. O tiro foi certeiro.

“Queríamos dar esse presente para o público que assistiu à primeira versão e que carrega as músicas na memória afetiva”, diz Constantini.

Cazuza também está presente, é claro, no tema de abertura da novela, “Brasil” –entoado por Gal Costa em versão atualizada– e em “Preciso Dizer que Te Amo”, na voz de Silva. A referência a Gal reaparece ainda em “Barato Total”, só que na voz de Liniker.

UM POUQUINHO DE BRASIL (E UM POUQUINHO DE FORA)

Já o amor mais maduro de Raquel (Taís Araujo) e Ivan (Renato Góes) é envolvido por “Olha”, de Roberto Carlos, na voz de Maria Bethânia. Na versão original, também era Bethânia que cantava o tema do casal interpretado por Regina Duarte e Antonio Fagundes–, mas com a canção “Tá Combinado”.

Outro presente para os fãs da novela, diz a coordenadora musical, é “Isto Aqui, O que É”, clássico de Ary Barroso cantado por Caetano Veloso, presente tanto na versão atual quanto na de 36 anos atrás. É sob a atmosfera desse “um pouquinho de Brasil” que Raquel, recém-chegada ao Rio de Janeiro, começa a refazer a vida vendendo sanduíches na praia.

Caetano também tem participação dupla na trilha, com a canção “Nossa Resenha”, lançada no ano passado ao lado do trio Os Garotin. O cancioneiro popular brasileiro é exaltado ainda com Emicida, Marília Mendonça e Tom Jobim.

Na parte internacional da trilha, a equipe buscou criar “uma forte estética pop, inspirada pelo universo da Tomorrow e dos Roitman”, diz a coordenadora. Odete (Debora Bloch), por exemplo, faz suas aparições triunfais ao som de uma faixa eletrônica francesa.

Já Maria de Fátima (Bella Campos) “tem um pop bem feminino, jovem e com ares de anos 2000”, descreve. A trilha internacional conta ainda com faixas de Billie Eilish, Iggy Pop, Balthazar, Unkle, Hozier, Shakira, Rosalía e The Weeknd.

PASSO A PASSO

O trabalho de construção da trilha sonora começa quando a equipe de produção musical recebe a sinopse com a descrição dos personagens, seus backgrounds e uma ideia do que pode acontecer no futuro de cada um deles.

“Depois, lemos os primeiros capítulos, enquanto reuniões de brainstorming sobre os perfis desses personagens vão acontecendo entre o time de produção musical, direção e autores”, explica a coordenadora. “Vamos decifrando personalidades, gostos e estilos dos personagens e ambientes.”

A partir daí, a equipe chega a sonoridades, cenários e até artistas específicos para formar o que chama de “identidade sonora” da obra. Depois de aprovado o repertório, começa o fluxo de liberação da parte autoral e do fonograma das faixas comerciais.

Logo em seguida, eles dão o pontapé no processo de produção de regravações e trilhas originais. E o trabalho não termina com a estreia da novela. Segundo a coordenadora, a equipe ainda tem liberdade para incluir novas músicas com a trama em andamento.