SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Morreu, nesta quinta-feira (15), aos 100 anos, soprano Maria Lúcia Godoy, considerada uma das principais intérpretes de Heitor Villa-Lobos, que gravou dezenas de discos, registrando desde a música erudita até modinhas imperais, serestas e outros clássicos do cancioneiro nacional —mineiro, sobretudo.

Voz eternizada numa célebre gravação das “Bachianas Brasileiras nº 5”, também encantou nomes como o ex-presidente Juscelino Kubitschek ao entoar serestas como “Elvira Escuta” e “Amo-te Muito”.

A morte foi confirmada em comunicado enviado pela família, anunciando que o velório ocorre nesta sexta-feira, a partir das 10h, no foyer do Palácio das Artes, em Belo Horizonte. O enterro está marcado para às 17h, no Cemitério do Bonfim.

Godoy recebeu epítetos e elogios de grandes nomes de vários campos da cultura —a colega e cantora lírica Bidu Sayão considerava Goody sua “única sucessora”; Carlos Drummond de Andrade disse que sua voz era como “ouro que não se destrói”, enquanto Ferreira Gullar a comparou com “um pássaro voando”.

Na mesma linha, foi inspiração para a melodia de “Sabiá”, de Tom Jobim e letra de Chico Buarque, e, em 1981, cantou no velório do cineasta Glauber Rocha —entoando, justamente, as “Bachianas nº 5”, trilha de momentos emblemáticos de “Deus e o Diabo na Terra do Sol”.

Sobre os discos em que interpreta Villa-Lobos, o crítico Luis S. Krausz escreveu, na Folha, que Godoy “preserva a simplicidade e, ao mesmo tempo, exibe o sentido de expressão, a clareza e a amplitude vocal que lhe valeram elogios da crítica lírica. Godoy ainda gravou nomes como Hekel Tavares, Edino Krieger, Carlos Gomes, Waldemar Henrique e Guerra-Peixe.

Nascida em 1924, em Mesquita, no interior de Minas Gerais, mudou-se na infância para Belo Horizonte e se formou em letras antes de enveredar pelo estudo do canto. Após vencer vários concursos, estudar no Rio de Janeiro e na Alemanha, em 1956, foi fundadora e solista principal do coro Madrigal Renascentista, com Carlos Alberto Pinto Fonseca, Carlos Eduardo Prates e com o maestro Isaac Karabtchevsky, com quem foi casada por um ano.

O grupo se apresentou na inauguração de Brasília e ajudou a exportar a música mineira, em récitas que podiam misturar o repertório operístico —como papéis de “Cosi Fan Tutte” e “La Bohème”— e canções populares, interpretando músicas como “Travessia”, de Milton Nascimento e Fernando Brant.

Além das três turnês internacionais com o Madrigal, suas apresentações pelo mundo incluíram ainda récitas com a Orquestra Sinfônica de Houston, apresentando as canções sinfônicas de “Shehérazade”, de Maurice Ravel.

Godoy não se apresentava ao público há cerca de dez anos, quando, em 2014, cantou no Palácio das Artes, acompanhada por Túlio Mourão no piano e pelo seu sobrinho Celso Godoy ao violão, e na reinauguração do Teatro Francisco Nunes.

No seu centenário, em setembro do ano passado, foi homenageada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Publicou ainda livros infantis, colunas em jornais e, em 2012, lançou seu último disco, “Acalantos”, com cantigas de sua autoria.