ANDRÉ BORGES
BRASÍLIA
O valor inclui indenização pelos 3.000 km de trilhos abandonados pela empresa, além de R$ 40 bilhões em novos investimentos
(FOLHAPRESS) Em 14/05/2025 06h00
O governo colocou na mesa de negociação a sua proposta para renovar, por mais 30 anos, a concessão da FCA (Ferrovia Centro-Atlântica), hoje controlada pela VLI, empresa formada pela Vale, Brookfield, Mitsui e BNDESPar, além de fundos de investimentos.
A proposta está em discussão entre a cúpula do governo e executivos da VLI para definir o destino de 7.857 km de ferrovias, a maior concessão do país. O plano prevê a devolução de pouco mais de 3.000 km abandonados, trechos que o governo retomará e que poderá oferecer a outras empresas, por meio de autorizações, em vez de novas concessões, o que agiliza o processo.
Como indenização financeira por este abandono, a proposta prevê que a VLI pague cerca de R$ 5 bilhões à União, dinheiro que poderá ser aplicado pelo governo em novos projetos ferroviários.
Trechos abandonados de malha da FCA chega a mais de 3 mil km de ferrovia, trajetos que terão de ser indenizados pela empresa VLI Pedro Ladeira 12.mai.2017 Folhapress A imagem mostra uma perspectiva baixa de trilhos de trem, com pedras escuras ao redor e tábuas de madeira entre os trilhos. Há teias de aranha visíveis nas tábuas de madeira, e a vegetação ao fundo é verde e densa. O céu está claro, indicando um dia ensolarado. **** O acordo inclui, ainda, o repasse de aproximadamente R$ 3 bilhões para o governo. Uma parte diz respeito à outorga, que é o valor que a concessionária paga ao poder público pelo direito de continuar a explorar economicamente a ferrovia. O restante é o adicional de vantajosidade, ou seja, um valor extra que o governo exige para justificar essa renovação antecipada, mostrando que ela traz mais benefícios do que fazer uma nova licitação.
A VLI teria de assumir, ainda, o compromisso de investir cerca de R$ 40 bilhões nos trechos de concessão que manteria sob seu comando, ao longo de mais três décadas. Uma última condição colocada pelo governo diz respeito ao trecho da malha.
O traçado que ficaria com a VLI teria, necessariamente, de incluir a modernização e operação de mais de 1.100 km da malha localizada entre Minas Gerais e Bahia, um trecho que, até então, tinha previsão de ser devolvido pela empresa. A preocupação do governo é evitar o isolamento logístico da Bahia, comprometendo o transporte ferroviário de cargas no estado.
O Ministério dos Transportes não comenta o assunto. Havendo acordo, a proposta será encaminhada para a Secretaria de Consenso do TCU (Tribunal de Contas da União), que atua na mediação de contratos entre a União e o setor privado, como forma de evitar litígios e analisar possíveis acordos.
A atual concessão, que tem prazo de 30 anos, foi assinada em agosto de 1996 e acaba em agosto do ano que vem. Antes disso, o governo precisa tomar uma decisão final, sobre renovar o contrato atual ou deixar que vença, para realizar novas licitações.
“A autorização para que novas empresas assumam os trechos abandonados pode ser uma boa saída. Os interesses econômicos mudam e as regiões, também. Há outros interessados em explorar essas áreas, com o crescimento econômico em diversas regiões do país”, diz Paulo Henrique Dantas, especialista em infraestrutura, sócio do escritório Castro Barros Advogados. “O que não podemos é seguir com o privilégio de não fazer, mantendo o trajeto nas mãos de uma empresa que não utiliza mais o trecho.”
Como revelou a Folha, a área técnica do Ministério dos Transportes estudou o assunto e concluiu que a melhor opção para o governo e a população seria deixar com que a concessão atual acabasse e partisse para oferta de trechos diferentes, desmembrando em ao menos dois lotes o traçado total da malha.
O governo avalia, porém, que, se a empresa concordar com as suas condições, já teria nas mãos o resultado financeiro e estratégico que teria de buscar em novos leilões, o que também demandaria mais tempo e incluiria imprevisibilidades.
Por meio de nota, a VLI declarou que as negociações sobre a renovação antecipada da concessão seguem regularmente, com “diálogo entre governo e companhia” e que, neste processo, já adaptou suas propostas para cumprimento integral da nova portaria de diretrizes do Ministério dos Transportes, para obter a prorrogação.
“Ao longo do tempo, por meio de um processo aberto e transparente, a VLI apresentou um conjunto de propostas equilibradas nos aspectos operacional e econômico, de amplo espectro e com volume expressivo de investimentos (dezenas de bilhões de reais), que podem gerar desenvolvimento e renda para milhões de brasileiros”, afirmou a empresa.
Essas propostas, segundo a companhia, “abrangem muitos pontos de confluência entre o interesse público e privado”, sinalizando que o acordo tende a ser a melhor opção.
Arte HTML5/Folhagráfico/AFP https://www1.folha.uol.com.br/webstories/turismo/2022/01/trens-turisticos-em-sp/ *** “A renovação antecipada representa os interesses de seus clientes, fornecedores e sociedade, além de reduzir riscos de atrasos em investimentos críticos para a transformação da logística brasileira”, declarou a VLI.
Os 7.857 km de linhas da FCA interligam Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Goiás, Bahia, Sergipe e Distrito Federal, conectando-se às demais concessões que operam no país.
Uma auditoria concluída no fim do ano passado pelo TCU mostrou que, dos 7.857 km de extensão da FCA, cerca de 3.000 km estão inutilizados. Em outros 2.700 km, o tráfego foi classificado como “baixíssimo”, com menos de um par de trens passando pela malha diariamente. O uso mais regular, portanto, limita-se a apenas 2.157 km de toda a concessão, ou seja, apenas 27% da rede é explorada com regularidade.